Capítulo 13, Ruídos no escuro

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Vista do alto da torre, a floresta parecia um imenso tapete verde que ondulava irregularmente pela paisagem até onde os olhos podiam ver. As copas das árvores, iluminadas pelo sol da manhã, refletiam diversos tons de verde, claros e escuros. Willem deu mais baforada no cachimbo, que desapareceu formando redemoinhos pelo vento, enquanto assistia o sol recém-nascido ascender lentamente aos céus para banhar a terra com seus raios quentes.

Era a oitava manhã no vilarejo abandonado, e provavelmente uma das últimas. A carne estava quase seca e pronta para levar. O ferimento de Mazzo tinha sido tratado e, embora não tivesse completamente sarado, já permitia com que ele andasse sem muitas dores. O braço de Willem já estava curado, mas ainda doía quando ele executava algum esforço grande. Ele fitou as duas cicatrizes arqueadas do antebraço. Mais trinta pontos. Era a enésima vez que os contava. Devo estar chegando a cem. Talvez seja uma marca de sorte. Deu mais uma baforada no cachimbo. O sol já estava mais alto no horizonte, e os pássaros cantavam uma melodia agitada que Willem gostava de ouvir.

“Podia ter me chamado pra fumar.” Disse Vazs, chegando sorrateiramente.

“Pelo jeito eu não sou o único que sabe se aproximar sem ser ouvido.” Willem respondeu. “Mas achei que você não gostaria de ser acordado.”

“Normalmente, não gosto mesmo. Mas normalmente ninguém me acorda para fumar, o que eu sempre estou disposto a fazer uma exceção.”

Os dois riram por um instante, e Willem passou o cachimbo para Vazs, que deu uma longa baforada na erva-de-fumo.

“Por que está acordado tão cedo?” Disse ele, soltando a fumaça.

“Perdi o sono.” Willem respondeu.

“Anda tendo sonhos estranhos de novo?”

Willem franziu o cenho.

“Por quê a pergunta?”

“Eu não estava no acampamento na hora, mas Gunther contou-me que você teve um sonho estranho com uma mulher e acordou frio como gelo.”

“Tive sim…” Willem não gostava de pensar naquilo.

“Você poderia me contar como foi, ao menos o que você se lembra?”

Willem estranhou o interesse do amigo, mas contou aquilo que se lembrava sobre o sonho com a mulher gelada, e sobre como acordou com tanto frio como jamais sentiu.

“Você ainda não me disse porque está interessado nisso tudo.”

“Porquê isso me lembrou de uma história… uma lenda, digamos assim, que eu ouvi quando estava lutando nos Pampas.”

“Que lenda?”

“É uma lenda Guanche.” Disse Vazs. “Muitos dos guanches que atravessam a floresta dizem que uma mulher linda visita-os nos sonhos, alguns dizem que são uma bruxa, outros dizem que é a encarnação de uma deusa. Chamam-na de ‘A Dama da Floresta’, mas ninguém sabe quem ela é, e ninguém jamais consegue entender o quê ela fala. Foram muitos os homens que ficaram loucos e desapareceram pela floresta à sua procura, mas ninguém jamais retornou da busca. Outros simplesmente ficavam loucos, ouviam coisas que ninguém ouvia, viam coisas que não existiam, falavam línguas que ninguém entendia.”

“Era pra isso me tranquilizar?”

“É só uma velha história, e talvez nem seja a mesma. Jamais ouvi nada sobre alguém acordar gelado, nem sobre alguém que ouvia as palavras dela. Mas eu quero lhe perguntar uma coisa.”

“O que é?”

“Quando estávamos prestes a entrar na trilha você disse ‘Sai da minha cabeça’ e depois tentou disfarçar. Você ainda a ouve? Ainda sonha com ela?”

Na Escuridão da FlorestaOnde histórias criam vida. Descubra agora