2.

18 4 1
                                        

Chuck's POV
Não consigo ignorar a sensação de impotência quando penso nela. Sempre tive uma queda por causas perdidas e pela sua reabilitação. No entanto, Katherine parece mesmo uma ida sem retorno. Por mais que tente, não consigo alcançá-la. Ergueu uma quantidade incontável de muralhas à sua volta e eu nunca fui bom em escalada.
Estou deitado perpendicularmente à cama, com os pés a balançar lá em baixo enquanto o sangue flui em direção à cabeça, não me tornando o ato de pensar algo mais simples de executar. Devia ter o foco apontado a mil e um outros assuntos, mas a mente vagueia por recantos que eu não consigo evitar. Há certas coisas que não devemos saber mas que, quanto mais sabemos, mais conhecimento sobre elas ambicionamos.
Katie era filha de pais humildes. Um jardineiro e uma vendedora de arranjos florais. Compraram uma loja no centro da vila e vendiam o que produziam em casa. Desde sempre conhecera os Len. A barba comprida de Hector era inconfundível, bem como os olhos cinza e os cabelos claros de Cecille. Quem a conheceu jovem diz que eram iguaizinhas. Eram uma família feliz até Cecille adoecer. A loja acabou por fechar, Hector não tinha tempo para estar em casa, alternando o seu tempo entre trabalho, o hospital e a adega e Katherine acabou por ir morar com os avós paternos, visto que os maternos haviam falecido era ela ainda demasiado nova para se recordar sequer das suas feições.
Cecille morreu. Katherine tinha agora 13. Voltara a viver com o pai e fazia o que podia para manter a casa e os estudos em ordem. Mal se viam. Hector passava o dia todo a beber, chegava a casa ao cair da noite, bêbado que nem um cacho, batia na miúda e ia dormir. Lembro-me de passar por casa deles um dia e de ouvir os gritos, mas não nos devemos enfiar em casa alheia, não é verdade?
Ninguém sabe ao certo quando é que Hector decidiu que estava na altura de parar mas, no seu funeral, encontravam-se vários participantes dos alcoólicos anónimos, agora não tão anónimos quanto isso, que decidiram simplesmente fazer-lhe uma homenagem pelo esforço. Era de esperar que existissem palavras mais bonitas para se dizerem a um homem que nunca mais as iria ouvir, mas era tudo o que se podia dizer de Hector nos últimos anos. O homem sorridente e prestável de quem toda a gente gostava morrera aquando da morte da esposa. Não restava nada dele.
Hoje em dia, com 17 anos, Katherine mora sozinha, à exceção das noites em que deixa entrar um ou outro no covil. É só mais uma que o diabo desviou. Só mais uma que ficou à margem porque é demasiado horrível para que a sociedade possa sequer pensar nela.
Então, por que é que eu não paro?

Sinceramente teu, ChuckOnde histórias criam vida. Descubra agora