V - Despertar

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Não precisou de mais do que o primeiro movimento para ela saber que não estava no mesmo lugar onde havia deitado. Estava voltada para a direita, os braços cruzados como se sentisse frio, assim como se lembrava de estar no sofá. Mas o lugar onde estava não era o sofá.

Mexeu-se mais um pouco e se deu conta de um travesseiro sob a cabeça. Também notou que algo a cobria, mas estava certa de não ter encontrado nenhum lençol quando chegou ao aposento. A estranheza das circunstâncias, contudo, não a impedia de perceber que sua situação agora era mais confortável.

Estava deitada. E em um lugar onde havia espaço suficiente para isso. Quem sabe até mais; sentiu que poderia mover-se o quanto quisesse sem se preocupar em cair.

É como se eu estivesse em...

Instintivamente soube onde estava.

Abriu os olhos aos poucos. A vista foi-se ajustando, e ela foi capaz de identificar o que havia sido usado para cobri-la.

Um sobretudo.

Dele.

Segurou as bordas da peça. A gola estava próxima o suficiente do rosto para que ela sentisse o tecido roçar sua bochecha; mexeu-se um pouco, e a gola tocou seu nariz.

A moça ia afastá-la com a mão quando uma ideia – estranha, mas não de todo impraticável – surgiu: segurando o sobretudo com cuidado, aproximou-o das narinas. Reconheceu a fragrância que já sentira em outras ocasiões, mais intensa, mais pura por estar em seu local de origem.

Estranho.

Se tivesse disposição, Millicent teria sorrido consigo mesma. Em todos os dias de serviço, havia momentos em que ficava bem próxima de seu superior, mas não se lembrava de ter notado o perfume em todas as vezes. No entanto, de algum modo o perfume estava lá, como uma parte invisível dele que a mantinha atenta enquanto a envolvia. Estivesse ela cansada, apreensiva ou com medo, tudo era esquecido quando o sentia.

E ali, deitada, o caso era o mesmo.

Millicent encontrou disposição para sorrir consigo mesma. Algum tempo depois, afastou o sobretudo para olhar em volta e confirmou a própria localização.

Com algum esforço, conseguiu sentar-se na cama. As dores de cabeça e pelo corpo ainda estavam ali, mas não eram sua maior provação agora; o sono lhe fizera bem. Coberta com o sobretudo da cintura para baixo, dobrou as pernas sob ele e abraçou os joelhos como se ainda sentisse tanto frio quanto antes; pressionou as solas dos pés sobre o colchão ao fazer isso, e foi só então que percebeu que estava sem as botas.

E sem o casaco.

E com os cabelos soltos.

Sentiu o rosto esquentar, sabendo que não era em razão da febre. Olhou em volta. Estava sozinha, ou assim parecia. A única coisa que ouvia era o ruído dos lençóis a cada vez que se movia. Os bipes do droide haviam cessado, e ela não o viu em lugar nenhum. Ele devia ter retornado ao dono enquanto ela dormia, ou se autodesativado.

Ou então...

Um cheiro forte de caf chegou às suas narinas, e ela soube que não estava realmente sozinha.

Começou a passar as mãos pelo rosto para espantar os resquícios de sono e a ajeitar o cabelo da melhor maneira que podia sem o auxílio de escovas ou grampos.

Foi enquanto olhava em volta à procura da parte primária da farda que notou a chegada dele. Chegou a ver o casaco dobrado ao pé da cama e ia esticar-se para alcançá-lo, mas desistiu.

Ele trazia o caf em um copo grande na mão direita, do qual subia vapor. Estava parado no que devia ser o caminho para uma copa, de onde parecia vir luz natural.

Millicent - Uma História de Star WarsOnde histórias criam vida. Descubra agora