IX - Perspectiva

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Os Stormtroopers, sob a orientação de Phasma, foram rápidos em cumprir a tarefa para a qual haviam sido convocados. Não levaram mais do que alguns instantes para deixar a sala com o que restava do Capitão K'Ora. A higienização do local não era de sua competência: os droides que limpavam a poeira e a lama das botas dos milhares de indivíduos que cruzavam os corredores certamente estariam aptos a remover uma casual mancha de sangue da porta de uma sala.

Hux a deixou livre quando eles se foram e, com a promessa de que ela poderia decidir se conversariam ou permaneceriam em silêncio quando se reencontrassem, Millicent retornou sozinha ao aposento.

Ela aceitou a oferta com um sentimento que achou conveniente chamar de gratidão, mas tudo o que havia acontecido durante o ciclo, tudo o que presenciou naquela sala inspirava pouca coisa que não pudesse ser resumida em cansaço e tristeza.

Descalçou as botas, despiu-se do uniforme e soltou os cabelos. Um droide se aproximou para oferecer seus serviços, mas ela o dispensou. Foi para perto da parede de transparaço, pela qual os últimos raios de sol entravam no aposento, aquecendo o carpete, iluminando os objetos com o brilho vermelho que apresentava àquela hora do ciclo; sentou-se ao canto próximo da parede negra e dobrou os joelhos, passando os braços em volta deles. Do lado de fora, a luz do sol vez por outra era ofuscada por nuvens pesadas que vinham do leste e cruzavam ligeiras as montanhas de gelo; apenas de se imaginar o vento gélido que soprava lá fora era possível sentir tremores pelo corpo. Lá embaixo, troopers da neve e outros cuidavam de seus afazeres; não havia como saber o impacto do frio sobre eles nem sobre o que faziam.

Observar o que acontecia diante de si era como um descanso para os olhos e para o coração. Era um método que sempre ajudara Millicent a se manter firme em seus anos de serviço quando acreditava que não conseguiria alcançar o fim de um ciclo ou a finalização de um serviço e que, ela esperava, a ajudaria agora: faltavam alguns minutos para o fim daquele ciclo, então era certo que ela chegasse ao próximo. O que faria a seguir, podia decidir depois. Por ora o que precisava era entender, não só o que viu, mas como o viu. Como deveria ver.

O problema era que nem uma coisa nem outra faziam sentido.

Ela não tinha forças para pensar em nada que pudesse dizer quando Armitage voltasse, mas ficar em silêncio não era uma opção. Devia se sentir aliviada pois, com o encerramento do ciclo tão próximo, ele não demoraria a voltar, mas a perspectiva de vê-lo novamente a deixava mais inquieta do que a lembrança daquela sala. Havia tanto que deveria pensar, que deveria sentir pelo que havia acontecido, pelo que havia sido feito, mas ela era incapaz.

Como podia não se sentir em paz agora que tinha certeza de que K'Ora nunca mais a atormentaria? Como podia não estar satisfeita por ele receber o devido tratamento pelo que havia feito a ela e a sabe-se quantas outras pessoas? Como era possível que ela não se sentisse contente por ter alguém que o tivesse feito pagar por isso, que se importasse com ela e que fizesse o que era necessário para protegê-la? Armitage não apenas prometera resolver tudo antes do fim do ciclo, mas fez questão que ela presenciasse o cumprimento da promessa.

É minha responsabilidade assegurar que minha esposa se sinta feliz e confortável.

Armitage Hux levava suas responsabilidades a sério como nenhuma outra pessoa. Ele a selecionou, a treinou e chegou a conhecê-la como poucos; ouvia o que ela dizia, compreendia-a e, sempre que podia, incorporava suas opiniões na solução dos casos; não demorou até que tomasse providências a fim de protegê-la, e não escondia que cuidar dela era menos um dever do que um prazer para ele; logo passou a admirá-la por quem ela era além de seu posto, e a desejá-la pelo mesmo motivo. Todas estas eram as maneiras pelas quais Armitage dizia que a amava.

Millicent - Uma História de Star WarsOnde histórias criam vida. Descubra agora