Ele havia mesmo chegado antes.
Quando Millicent alcançou a área da cama e se preparava para despir as peças primárias do uniforme, notou sons vindos da copa. Conhecia-os muito bem: eram os sons do trabalho dos droides serventes que manipulavam aparelhos e organizavam a mesa; vez por outra, seus bipes eram intercalados pela voz de Armitage, que lhes designava tarefas.
Ela suspirou, sentou-se à beira da cama e descalçou as botas. Deixou o casaco sobre seu travesseiro – bem como a lâmina ao lado da peça – e saiu para o refresher antes que ele tivesse tempo de deixar a copa e vir encontrá-la.
***
A água morna não levou embora apenas o suor e a fadiga. As lágrimas que ela tentou reprimir durante o trajeto do terraço aos aposentos agora corriam livres, para logo serem levadas pelos fios de água que lavavam seu rosto. Permitir-se chorar durante o banho era o melhor que podia ser feito; do contrário, teria de atravessar metade da Base e voltar para seu quarto com a pele pegajosa, os olhos inchados e as bochechas vermelhas, o que não passaria despercebido por Armitage; a última coisa que ela desejava era criar motivos para questionamento.
A moça apertou os olhos e deixou escapar um soluço. Voltar para o aposento daquela maneira, evitando-o, não era menos injusto do que embaraçoso. Entre seus momentos favoritos do ciclo, estavam aqueles que os dois dispensavam às conversas; fosse na biblioteca, na copa ou na área da cama, conversavam entre si e sobre si. Não haviam planejado desenvolver esse hábito, mas estavam satisfeitos por tê-lo estabelecido: sabiam que não seriam bem-sucedidos no serviço se negligenciassem o que havia para além dele.
E agora ela se via fugindo. Sabia o que precisava ser feito, mas estava incerta quanto à maneira de fazê-lo. Àquela altura, Armitage já devia ter notado seu desconforto; na realidade, ele o fizera ainda na ponte, quando a viu chegar e trocar de lugar com o oficial do turno anterior: os sinais do mal estar sentido no refresher não passariam despercebidos. Não por ele. E o que ele perguntaria? O que ela deveria responder? Como ele encararia suas respostas? Ele por certo acreditaria nela. Mas o que faria após ouvi-la? Ele raramente dava ouvidos a alguém se não achasse necessário tomar alguma providência. Havia tanto que pensar...
Mas ela não podia se esconder para sempre. Desligou o chuveiro, finalizou sua higiene e saiu do refresher, tentando não pensar no medo que a acompanhou para fora dali.
***
Mllicent estava sozinha na copa. Não sabia para onde Armitage havia ido, mas aproveitava o pouco de alívio que trazia o fato de estar sozinha. Havia planejado se alimentar no refeitório junto dos outros oficiais, mas desistiu logo depois de pegar o copo de leite verde. Agora, via sua segunda tentativa fracassar com o prato diante de si: ela passava mais tempo mexendo o conteúdo com os talheres do que levando comida à boca.
Sentiu o estômago embrulhar antes que metade do prato estivesse vazio. Tentou ingerir uma última porção, mas desistiu. Chamou o droide e mandou que ele recolhesse o prato. Quando ele se foi, a moça apoiou os cotovelos no espaço vazio à sua frente e pôs a cabeça entre as mãos.
Depois de alguns instantes, levantou-se e foi para a saída da copa. Não estava preparada para o que viria, mas o encararia de qualquer maneira.
***
Ele estava sentado no lado dela da cama, próximo do travesseiro. Na mão esquerda estava o datapad, mas a outra repousava ao seu lado sobre o lençol. Millicent não precisou olhar por muito tempo para perceber que esta mão também não estava vazia: metade da palma escondia um objeto que ela reconheceu como sua lâmina. Ignorou o nó que se formou em sua garganta.
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Millicent - Uma História de Star Wars
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