Nós

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Abayomi

O monstro que criei, distraiu os guerreiros o suficiente para eu me esconder mais uma vez nas sombras e esperar que as criaturas se afastassem da cabana. Alguns minutos depois, a floresta escura os acolheu. Precisava agir rápido. Corri para a árvore certa e disse as palavras que abriam a fresta de luz para minha entrada na cabana.

Precisava carregar o corpo do outro guerreiro que estava desacordado. Tive que arrastá-lo até a entrada, o rastro deixado foi desfeito com um soprar forte meu que impulsionou o vento a fazer o trabalho de cobrir as marcas deixadas com folhas secas e neve assim como estava antes do meu esforço.

Antes mesmo de bater na porta para que a abrissem, fui recebida por Niume, com o olhar cheio de lágrimas e um sorriso. Ela me abraçou tão forte que senti meu café da manhã se movendo dentro de mim. Seu sorriso se desfez quando viu o homem que eu restava puxando pelos braços logo atrás de mim.

- Yomi...- Ela disse meu apelido em forma de negação – A Horra vai ficar furiosa.

- É, eu acho que vai. – Respondi olhando para ele e imaginando as possibilidades que ele acabou de me proporcionar- Mas ela vai ter que me escutar primeiro.

Entramos na cabana. Runa e Sybilla se voltaram para mim, ambas com sorrisos no rosto. A mais nova saiu correndo e me abraçou também.

-Desculpa, mil vezes desculpa- Ela diz tão rápido que mal consigo acompanhar sua fala- Deveria ter ficado com você, eu sei que devia, mas você me mandou voltar e eu voltei. Desculpa.

- Calma...- Já estou rindo da situação, mas não a deixo ver que achei graça – Eu estou bem, não estou? Não precisa se desculpar. – Faço carinho em sua cabeça, mexendo em seu cabelo e a acalmando.

Sem eu notar, Honorra já estava na sala nos observando, com uma taça na mão direita e o sorriso gelado no rosto.

- Nos trouxe um presente? – Ela diz apontando para a figura desacordada e apoiada no chão. – Ou é assim que você anda conquistando os homens ultimamente?

- Está mais para prisioneiro – digo rindo um pouco – e isso está bem longe do meu método de conquista.

O rapaz alado no chão, usava a mesma armadura que o guerreiro que feri mais cedo, diferem só pela cor das joias, essas eram azuis, que agora estavam apagadas quase que por completo.

- O que vamos fazer com ele? – Niume retorna a conversa me questionando – Não me diga que vamos mata-lo. Não quero fazer parte disso.

- É, claro que não. – Honorra se pronuncia agora, tranquila e calculista- Abayomi não traria ele até aqui, para mata-lo. – Ela chega mais perto dele, ainda no chão. – Deve ser valioso. – Agora os olhos se direcionam a mim. – Não me decepcione. – Esse era o jeito de Horra me dizer "Estou feliz, que está bem".

***

Diversas camadas de raízes e galhos flexíveis colocados por Niume, o impediriam de se mover mais que o necessário. A névoa que cobria o cômodo, para evitar que o homem conseguisse se localizar, foram provocadas por Sybilla. Honorra preparou poções, caso nosso plano não desse certo, poderíamos arrancar as verdades da criatura e força-la a fazer qualquer coisa. Meu papel, era fazê-lo falar e cooperar com a gente, sem magia.

Aguardo seu despertar, que não demora muito. Alguns segundos depois de dispensar minhas irmãs do cômodo e pedir que ficassem em silêncio, ele acorda. Posso ver seus olhos pela primeira vez, são castanhos, mas muito mais claro que os de Niume, e carregam confusão quando olham para os lados, enxergando neblina e mais nada. O corpo tenta se mover em vão, todo o esforço contra a magia seria inútil.

- Antes que diga alguma coisa, seu amigo está bem assim como você. – Digo quando percebo que seus sentidos já estão melhores. – Não sou do tipo que mata por diversão, se é o que está pensando.

- Não foi o que me pareceu mais cedo- Ele diz com muita dificuldade, mas ainda sim firme.

- Sabe porquê fiz aquilo. E não vou me estender nessa discussão. – De pé, caminho um pouco mais perto do homem. – Pelo tom que aquele outro rapaz lhe dirigiu, você deve ser importante... – Sua cara continua séria, sem muitas expressões. Sei que se lembra da cena que ocorreu mais cedo. – É algum amante seu?

- Não. – Ríspido, como se cuspisse as palavras.

- Fico com a segunda opção então. – Mantenho distância dele, respeitando seu espaço, mesmo que sua posição seja desconfortável. – São família. – Já vi aquele olhar milhões de vezes, a boca tenta dizer algo, mas se cala. E os olhos não podem mentir- Parece que acertei. Só posso explicar aquele tom de voz com uma palavra, amor. E se não dividem a cama, deve haver uma união muito mais forte.

- É boa nisso – Em resposta faço uma reverencia brincalhona e ele continua – Para que lhe sirvo vivo?

- Para muitas coisas, eu poderia lista-las para você. Entretanto, vou lhe contar a única que eu desejo no momento. – Seus olhos acompanham meus poucos movimentos e gestos. – Antes, como sou má educada, gostaria de saber seu nome.

- Esqueceu a parte sobre "Conhecer a caça", senhora? – Tão irônico e sútil que as palavras soaram como o vento.

- Conhecer vai muito além do nome, senhor. Sei quem são, sei como mata-los, sei como vivem. E ainda sim, adoraria saber seu nome. – Minha voz, tão sutil quanto a dele, soa pacífica.

- Um nome pelo outro. - É tudo o que diz, e é o suficiente para eu entender.

- Abayomi, Filha de alguém ao qual o nome nunca tive a oportunidade de saber. – A reverencia dessa vez é verdadeira, seria normal se ele não estivesse amarrado e eu o sequestrando.

- Azriel, Filho de alguém que não merece ser mencionado. – A cabeça tenta imitar o mesmo gesto que fiz e dou risada pela situação.

- Pois bem, Azriel. Sei que a situação não é nada legal e apesar disso tudo, preciso de um favor seu, e juro que será a única coisa que vou lhe pedir. – Sem respostas do outro lado, só o mesmo rosto sério e atento. – Preciso que autorize nossa entrada oficial nas terras Féericas e nos certifique que estaremos seguras.

- Nossa? – O homem alado parece confuso e entendo porquê, só havia eu e ele naquele cômodo e desde sua aparição ele havia só me visto, é então que suspiro e digo:

- Meninas – A minha voz não está mais firme, estou arriscando muitas vidas com uma frase só – Podem vir até aqui. 

Corte de Escuridão e MagiaOnde histórias criam vida. Descubra agora