Os Deuses

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Honorra

Aparecer para aquele Féerico é loucura, e todas nós sabíamos disso. Sybilla foi a primeira a entrar no cômodo, seguida por Niume e Runa. Eu fui a última, por medo e insegurança, mas disse a mim mesma que não deixaria me abalar por isso.

Silêncio. Nem o homem, nem nenhuma de nós ousou dizer uma palavra durante minutos, que pareciam eternos.

- Hm, sou Niume. – Disse minha irmã, tentando quebrar o gelo entre ambas as partes- Desculpe, pelas raízes...

- São necessárias para nossa segurança. Não precisa se desculpar por nada, Niume. – Abayomi diz, clara e objetiva.

- S-sou Runa- Sempre se atrapalhando nas palavras, essa era minha irmã mais nova.

Era minha vez de falar, e eu não estava disposta a dizer meu nome para um completo desconhecido. Até que todos os olhares se voltaram a mim, percebi que seria obrigada a isso.

- Tudo bem - Suspirando e respirando fundo – Honorra. É esse o meu nome.

- E essa é a... – Yomi começou a frase, e foi interrompida.

- Deixe que ela mesma fale. – O homem alado sentado e entrelaçado em camadas e camadas de raízes ainda ousa exigir alguma coisa. Dessa vez em vão.

- Ela não vai te dizer nada – Digo ríspida e rindo da cara de confusão da parte dele. – Fazem alguns anos desde que Sybilla fez um voto de silêncio, e tenho certeza que não será um homem com asas que a fará voltar a falar. - As palavras eram conhecidas, e mesmo assim causaram estranheza a ele.

- Desculpe-me. É Sybilla, certo? – Ele diz em direção a Syb e mais ninguém. A irmã mais velha, sorriu e confirmou com sinceridade, como se aceitasse as desculpas. – Sou Azriel.

- Sabemos. – As três disseram ao mesmo tempo, Runa ri, Niume fica sem graça e eu permaneço séria.

- Apresentações feitas – Yomi prossegue com o plano, que foi explicado mais cedo a todas nós- Vamos direto ao ponto então. Precisamos de sua ajuda para chegar até seu Líder, como o chamam? Grão- Senhor... – Ela faz a pergunta para si mesma, e responde dando uma leve risada pela nomenclatura usada.

- Não buscamos nenhum desconforto ou baderna em suas terras. – Complementa Niume- Estamos em busca de um lar, e somente isso.

- O que pudermos ajudar em suas terras será um prazer – Runa diz no tom mais doce e dessa vez não gagueja- Sabemos o que a Guerra pode causar.

- Visamos o nosso bem-estar, caso ache que somos mercenárias, saiba que seu ouro não nos interessa. – Yomi diz enquanto se aproxima de nós.

- E eu sei que está se perguntando: O que são vocês? – Minha vez de falar, enquanto mexia as mãos para disfarçar os tremores- Mortais e Abençoadas pelos dons que temos, nada além disso.

O olhar do homem a nossa frente é uma mistura de incompreensão, seriedade e choque.

- São Bruxas... – Ele diz a conclusão que tentava encaixar na cabeça – Eram usadas para nos assustar quando crianças...

- É... longa história. – Digo respondendo e tentando não estender esse debate – Traumatizar criancinhas é a nossa especialidade... Indiretamente.

- Seus "irmãos" estão à procura de você, eu imagino. Já fazem algumas horas desde que peguei você emprestado – Yomi diz fazendo alguns cálculos invisíveis em sua cabeça- Irei sozinha com você ao encontro deles.

- Vão mata-la antes que consiga falar com eles. – Azriel diz dessa vez, com nenhuma expressão marcante só cuspindo palavras.

- Não se preocupe tanto comigo. – Yomi volta a respondê-lo e continua o plano – Eu faço minha parte e você faz a sua. -Minhas mãos nunca tremeram tanto assim e eu tentava me controlar, mas nosso plano estava preste a ser revelado para um completo estranho.

Ela continua a fala 

- Leve-me até seu Grão-Senhor e eu me mantenho viva até lá. – Ela diz como se tivesse tudo sob controle. Tola. Aquelas criaturas não queriam conversa, estavam furiosas com o sequestro de alguém tão próximo.

- Como terei garantia que não vai ferir mais ninguém? – Azriel a questiona, exatamente como ela disse que ele iria fazer.

- Farão um Juramento por Sangue – Interrompo o diálogo dos dois e me incluo nisso. – Ambos precisam cumprir sua parte do acordo ou... bom, será divertido manter segredo sobre as consequências... – Paro a explicação e Niume me olha incrédula, foi inesperado para todos ali, até para mim, mas finjo que fazia parte do combinado.

- Não quero que descubra onde estamos, então você vai tirar mais um cochilo hoje – Abayomi diz rindo um pouco e o homem permanece sério, seus olhos, ainda sim, revelam uma agitação interna, talvez insegurança. – Recapitulando o acordo: Vou leva-lo até sua família. Você os convencerá de que eu preciso falar com o seu Grão-Senhor. Ninguém se fere, a menos que eu seja atacada. Esse é nosso Juramento.

- Feito! – Azriel diz convicto e firme.

Faço com que minha adaga surja em minhas mãos, ela é feita de freixo assim como todas as outras armas que trouxemos para cá, já sabendo desse pequeno detalhe de invulnerabilidade. Pego sua mão direita, que agora está livre das raízes graças aos movimentos de Niume e corto sua palma da mão, o sangue começa a surgir. Sou rápida com a mão de Yomi, que já estava próxima, fazendo a mesma coisa. Junto as mãos dos dois e digo as palavras necessárias.

- Sanguine Foedus Iuxta Defendat- Uma gota de cada, se unem e giram intensamente no ar até que se transformam em duas pequenas cápsulas. Yomi é a primeira a consumi-la e Azriel só a imita. – Divirtam-se. – Digo por fim, na intensão de tirar a tensão do ar.

- Preciso fazer isso... – Runa se aproxima do rapaz, dizendo como se fosse uma obrigação e que não estava nem um pouco satisfeita com isso, se aproxima de sua orelha e diz outras palavras - Mendacium Altum Somnum. – Lentamente os olhos do rapaz vão se fechando até não abrirem mais.

- Não se esqueça de desconfiar de tudo e todos. – Niume diz para Abayomi, totalmente preocupada com a irmã. – Por que tem de ir sozinha, mesmo?

- Eles só me conhecem, caso algo dê errado só uma de nós estará em perigo. – Abayomi, nos disse isso mais cedo, mas Niu precisava de uma confirmação mesmo assim. – Caso alguma coisa não saia como eu planejo, corvos serão enviados, todos eles se necessário. E eu quero que prometam que partirão assim que os escutarem.

Não queríamos aceitar que esse plano falhasse, era o melhor que tínhamos em semanas. É o único com grande potencial e mesmo assim é o mais arriscado. Não queria dizer adeus a minha irmã, poderia ser a última vez que nos veríamos, para sempre.

- Prometam. – Ela exige que confirmássemos. – Não precisamos de um Juramento de Sangue e é por isso que confio em vocês. Prometam que irão embora se algo não der certo.

Todas nós prometemos mesmo não querendo.

Antes de partir, Abayomi se aproximou de mim e disse:

- Cuide bem delas.

- Por toda minha vida. – Disse por fim, antes de ver minha irmã se arriscar por nós. Saindo em busca de uma incerteza que poderia melhorar ou arruinar nossas vidas mais uma vez. Sem garantias e sem chances de errar. Que os Deuses a protejam. 

Corte de Escuridão e MagiaOnde histórias criam vida. Descubra agora