XVI - Purgatório

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Hoseok

Em um período de noventa e poucos dias é possível que os mais próximos se afastem e os mais distintos se aproximem; algo que também se torna possível é o afastamento da pessoa que você costumava ser antes de alguém. Como se o chão em que pisasse houvesse aos poucos se quebrado, o Jung mais velho mesmo depois de três meses ainda sentia o peso de sua decisão em preservar aquele que amava e a si mesmo. Hoseok não se arrependia, contudo não estava feliz.

O profissionalismo o fazia forçar os sorrisos que ele dava aos alunos em suas aulas, porém só o mesmo sabia o quanto lhe custava aquilo, ele não queria fingir, mas também não podia transparecer. Nem queria. O caso da professora Sang foi a maior prova de que apesar de bem resolvido com sua sexualidade, ele tinha muitas coisas das quais zelar e uma delas era o bom emprego e o peso de carregar o orgulho que seus pais tinham por ele. Um filho que havia se formado com as melhores pontuações e de cara havia conseguido um bom emprego na maior escola de elite de Seul não podia simplesmente deixar tudo ir por água abaixo por conta de um amor.

Os Jung não depositavam tantas expectativas em Hae Won como faziam com Hoseok, isso sempre fora nítido. A garota havia crescido mais livre quanto suas escolhas, assim como o filho recém nascido do casal que nascera neste meio tempo. Por ser o mais velho, a responsabilidade de carregar um nome era o que fazia Hoseok pensar duas vezes antes de colocar tudo a perder. Por mais que amasse Yoongi, decepcionar sua família estava fora de cogitação. Mas até que ponto vale a pena abrir mão do que você quer pelo que os outros esperam de você?

"Somos de carne e osso, mas temos que viver como se fossemos de ferro" ele lembrava da frase que havia conhecido há algum tempo. A necessidade de manter-se firme na frente de todos e não deixar que seus sentimentos o dominassem era grande, mas quando estava sozinho, quando sua única companhia era o reflexo do espelho, Jung Hoseok colocava para fora tudo aquilo que reprimia dentro de si. Suas lágrimas, seus gritos contidos na garganta, o medo. Era cansativo sentir tudo e esconder por trás de um sorriso sem significado, para então no fim do dia não compartilhar com ninguém senão consigo mesmo.

Desde o término, ele começou a evitar a sala dos professores, encontrando um pouco de paz interior em um pequeno jardim que havia nos fundos da escola. Ali carregava consigo livros e mais livros que já havia lido duas ou três vezes, mas um leitor ávido como ele sempre captava uma perspectiva diferente a cada nova leitura. Talvez aquele local em que apenas poucos alunos frequentavam fosse seu refúgio de ter que encarar Yoongi todos os dias com seu semblante suplicante e suas insistências. Mesmo tendo pedido para Hae Won permanecer ao seu lado, ele ainda queria Hoseok de volta a todo custo.

O inverno já tinha dado as caras em Seul, trazendo consigo flocos de neve que quase não o incomodavam, porém era muito sensível ao frio, então pegou-se tremendo seus ossos do lado de fora, obrigando-se a voltar para o interior do colégio, repetindo o mantra consigo mesmo tomara que eu não dê de cara com ele. A sala dos professores que antes era palco de aventuras tanto românticas quanto sexuais mais parecia um purgatório, por trás da porta fechada podia se esperar qualquer coisa e ele torcia para não encontrar o pior lá dentro. Torceu o nariz antes de entrar e quase que fechou os olhos para não ter uma surpresa, porém abriu a porta de uma vez, sendo recepcionado apenas por um lugar vazio e silencioso. Hoseok suspirou aliviado e então sentou-se no sofá, munido de um de seus livros.

Tudo naquela escola parecia mais tenso desde a saída da professora Sang, os alunos pareciam mais reclusos e até mesmo toda a extravagância e antipatia daqueles que eram filhos de magnatas e burgueses pareceu ter desaparecido por um tempo. As pessoas estavam com medo de mostrar quem realmente eram. As únicas pessoas dali que ainda davam jeito para se camuflar naquele ninho de cobra eram Seokjin e Taehyung, que mesmo tendo presenciado a cena, esgueiravam-se vez ou outra em salas vazias - como se morar juntos já não fosse o bastante. No fundo, Hoseok tinha inveja da coragem daqueles dois. Se insistisse em ficar com Yoongi, estaria no mesmo barco, escondendo-se, achando oportunidades e conhecendo de perto o perigo que era se aventurar. Perigo. Palavra pavorosa do vocabulário do Jung. Ele sabia bem que Seokjin só tinha toda aquela coragem, pois se fosse demitido, não teria que se explicar a ninguém, já Taehyung não via a sombra do pai há meses. Eles estavam mais seguros do que ele.

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