Capítulo 1

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Dante

Meu primeiro contato com a morte foi aos 5 anos. Eu estava brincando no escritório do meu nonno Paolo escondido. Simplesmente adorava aquele lugar, todo masculino e imponente. Era o símbolo de poder da Família Martinelli. Eu me sentava na cadeira de couro, gigante para um garotinho como eu, e fingia ser o dono do mundo, mandando e desmandando.

Ao ouvir vozes, desci rapidamente da cadeira e me escondi debaixo da mesa. Não queria que meu pai me encontrasse ali e brigasse comigo. Sem ser visto pelo grupo de homens na sala, fiquei ali quieto, ouvindo a conversa. Em um determinado momento, as vozes cessaram e tudo que ouvi foi um grande barulho e vi um homem cair no chão. Pelas sombras debaixo da escrivaninha, assisti um pulso atingir repetidas vezes o homem no chão e logo identifiquei como sendo de meu pai, já que possuía aquele anel vermelho que ele sempre utilizava. Depois um lustroso sapato italiano chutou a cara ensanguentada e machucada do homem caído mais umas 3 vezes e logo em seguida um tiro de misericórdia e o ambiente ficou em silêncio. Logo em seguida, ouvi os homens saírem do escritório, me deixando com o homem morto. 

Não pensei duas vezes, sai do meu esconderijo e corri para fora do escritório antes do meu nonno ou meu pai me vissem.

Eu não entendia o que tinha acabado de ver ou o que aquilo significava, mas sei que aquilo ficou impregnado na minha alma, não estava assustado, mas naquele dia descobri que a morte me fascinava.

Meu pai, Giovanni Martinelli, era um mafioso assustador, instigar medo nos outros era o seu modus operandi. Durante anos ele foi Capo de meu nonno, e somente ascendeu ao posto de Don ao se casar com minha mãe. 

Ele estava envolvido com vários setores do crime, desde tráfico de drogas à extorsão, intimidação e assassinatos. Ele controlava o crime organizado em Nova York, que por sua vez controlava toda a cidade. Ele controlava tudo, mesmo quando ele não fazia coisas horríveis ele mesmo, ele ordenava que outros o fizessem.

Embora sua reputação nas ruas assustasse, em casa, os "assuntos de negócio" eram tratados em segredo. Ele sempre foi amoroso com minha mãe, e comigo sempre foi disciplinador, mas nunca assustador. Eu o respeitava desde sempre e queria ser como ele.

Foi nessa época que descobri de fato o que era a Máfia. 

Estava havendo uma verdadeira caça em Nova York contra o crime organizado, nessa época, chefes de quase todas as cinco mais importantes famílias da Cosa Nostra foram presos. Meu pai foi um dos que não conseguiu se salvar, nem foi um crime muito elaborado (e olha que ele tinha vários em seu currículo) ou coisa assim, ele simplesmente bobeou, tentou comprar as pessoas erradas, foi traído pelo contador e foi pego.

Na máfia era comum dizer para as crianças das famílias mentiras para justificar o período de carcere,  "Seu pai está no exército, mas logo a Guerra acaba e ele voltará para a Família" era a desculpa mais ouvida. 

Meu pai não era assim, ele preferiu que seu único filho desde cedo soubesse o que estava acontecendo, afinal, era um Herdeiro da Máfia e um dia assumiria a Família Martinelli, a mais poderosa e temida da máfia de Nova York.

E assim, meu pai decidiu que aos 8 anos, eu era velho o suficiente para saber onde de fato ele estava. 

Me lembro do meu avó me colocar em seu colo e dizer que queria conversar comigo.

"Meu bambino, vamos ter uma conversa de homem pra homem agora. Seu pai pediu para que explicasse o porquê ele irá se ausentar por um período" Olhei meu avó e concordei, esperando que ele me contasse o "grande segredo".

Meu avó continuou "O seu pai é um homem muito poderoso, mas nós não somos os mocinhos da história. Somos homens de honra, que defende seus negócios e pra isso algumas vezes derramamos sangue. Sangue de outras pessoas, é claro. Somos temidos por isso e ao mesmo tempo respeitados. Mas os que se dizem bonzinhos, os policiais, estão atrás de nós há muito tempo e por uma besteira de um contador traidor, acabaram acusando o seu papà, e ele vai passar um período na prisão"

Eu estava deslumbrado pelas palavras de meu avó, o poder me fascinava, a morte me fascinava. Eu queria ser meu pai. Olhei nos olhos dele após ele me contar sobre meu pai e simplesmente perguntei "Nonno, eu quero ir pra prisão ficar com o papà, posso?"

Minha mãe me olhava horrorizada, claramente assustada comigo. Meu avó no primeiro momento se assustou e logo soltou uma daquelas gargalhadas meio assustadora, meio divertida e disse "Meu bambino, espero que você nunca vá pra a prisão como seu pai. Mas enquanto ele estiver lá, vou te ensinar tudo que eu sei e você será o mais temido, mais respeitado e o maior Don que essa família ou qualquer outra já teve. Será maior do que Lucky Luciano*. Eu o farei um Homem de Honra e tanto eu como seu pai teremos muito orgulho do que você se tornará."

E assim, começou a minha vida de fato na Máfia.

* Lucky Luciano - conhecido como o Pai da Máfia Americana Moderna. Criou a Comissão que contava com a representação das famílias mais poderosas da Cosa Nostra em solo Americano. Era um gangster fascinante e assustador ao mesmo tempo. Muitos o odiavam e aos mesmo tempo o amavam.

O Inferno de DanteWhere stories live. Discover now