XXXI

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"Hey, desculpa acordar-te, mas quero levantar-me." Diz o Michael enquanto lentamente me levanta do seu colo. Eu olho para o relógio no meu telemóvel, são quatro da manhã, devo ter adormecido a ver televisão com ele. Eu levanto-me e faço o caminho para o quarto. "Espera." Fala o Michael antes de eu sair da sala. "O teu cachecol..." Ele fala e entrega-me, imediatamente tento esconder o meu pescoço com o meu cabelo. "Parece que tens algo no teu pescoço." Ele comenta e tenta se aproximar de mim, para ver melhor.

"Deve ser marcas de estar a dormir. Bem, boa noite." Eu digo rapidamente e vou para o quarto que me foi dado. Eles partilham todos um quarto, onde o Calum e a sua irmã dormiam e eu fiquei com o quarto dos pais dele. O lado positivo de ser uma rapariga, um quarto só para mim!

Por mais que tente dormir a minha mente percorre os acontecimentos dos últimos doze meses. Tanta coisa se passou e por mais que eu esteja ciente que houve bons momentos, muito bons momentos, a minha mente só escolhe reviver os maus momentos: as discussões, as brigas, os acidentes, as traições e muito mais. Diz-se que o tempo cura tudo, então porque é que não consigo esquecer as palavras deles? Eles já pediram desculpas, mas mesmo assim não consigo.

Quando acordo no dia seguinte sinto a exaustão de ter passado horas e horas a reviver cenários na minha cabeça em vez de dormir. Desço as escadas e o único barulho são as ondas do mar a bater nas rochas, a casa está tal e qual como ontem, o que me leva a crer que eles ainda não acordaram. Antes de tomar pequeno almoço, decido nadar um bocado, mas o que na minha mente iam ser 10 minutos, viraram em uma hora.

"Bom dia!" Eu ouço a voz do Luke a berrar e olho para a costa, vendo-o a entrar na água.

"Bom dia." Eu cumprimento de volta quando ele se aproxima.

"Sabe bem, não sabe?" Ele questiona com um sorriso. O humor dele está muito melhor do que nos últimos dias.

"Muito!" Eu respondo e equilibro o meu corpo para a posição de deitada, sentindo a água a tocar as minhas orelhas e o Luke faz o mesmo. "Pareces estar melhor hoje." Eu comento depois de alguns minutos de puro silêncio. Ele olha para mim e sorri como resposta.

"Hoje foi o primeiro dia que acordei sem a vontade esmagadora de chorar... Sem o sentimento de mil pedras no peito. É estranha a sensação, nunca pensei que ia sentir isto tão rápido." Ele desabafa e eu levanto-me, apoiando os meus pés na areia e sentido a água a bater suavemente a meio do meu tronco; a maré está baixa hoje.

"É normal, tu não estás em luto há uns dias, estás desde o momento que descobriste que não se podia fazer mais nada." Eu tento reconfortá-lo e ele levanta-se também, mas a água nele bate-lhe no fim do tronco, mostrando os abdominais meio definidos, mas como eu gosto. A atração ainda está definitivamente lá, mas agora qualquer pensamento sobre tal vem com sentimentos de culpa e tristeza.

"Esse dia foi como uma sentença de morte. Foi horrível." Ele continua e eu lembro-me do dia em si, eu estava lá e tanta coisa se passou. "Ele era suposto ter tido 3 anos, 2 anos no mínimo e só teve alguns meses." O Luke fala e eu própria sinto as minhas lágrimas a cair quando vejo as dele. "Que justiça é essa? Nem nos deram o tempo mínimo com ele!" Ele fala exaltado, dando um murro na água e como instinto afasto-me. Eu não tenho medo dele foi simplesmente um instinto inconsciente.

Notando as minhas ações, o Luke olha para mim magoado e confuso e eu aproximo-me tentando reverter as minhas ações.

"Também foi o dia em que acabamos e eu nunca cheguei a pedir-te desculpa por tudo o que fiz. Eu fui cruel sem saber que o estava a ser, mas mesmo assim magoei-te e por isso peço desculpa." Eu digo aquilo que já devia ter feito meses atrás.

"Obrigada." O Luke diz e eu abraço-o e no fim ele atira-nos para debaixo de água num tom de brincadeira. Isto acontece sempre entre nós, passamos de um tom para o outro tão rápido.

"Que é isto?" Ele pergunta quando emergimos da água e aponta para o meu pescoço e, imediatamente, digo todos os palavrões que conheço na minha cabeça. Esqueci-me completamente de cobrir as marcas do meu pescoço. Como é que vou sair desta? As marcas não estão tão pronunciadas como há uns dias, mas ainda se nota a marca de dedos em volta do meu pescoço.

"O quê? Não consigo ver." Eu falo como se não soubesse o que ele estivesse a falar, fingindo tentando olhar.

"Parece tipo umas marcas roxas ou assim..." O Luke tenta explicar e aproxima-se do meu pescoço.

"Eu vou ver!" Eu digo e fujo rapidamente do campo de visão do Luke, fingindo ir ver as marcas desconhecidas.

"Bom dia!" Diz o Ashton com um tom animado, eu simplesmente corro para o meu quarto e ignoro-o sem pensar.

Qual a desculpa que vou arranjar? Cubro e finjo que não era nada?

Sem saber o que fazer, começo a chorar em pânico- o que é estúpido, porque o meu irmão é que me magoou e aqui estou eu a chorar porque não quero contar a ninguém para que nada lhe aconteça.

Eu nunca percebi como mulheres ficam em relações violentas, mas estou a começar a perceber. Eu olho para o espelho à minha frente e olho verdadeiramente para mim: as marcas das mãos dele no meu pescoço, a falha na minha sobrancelha porque há dois anos ele atirou-me uma garrafa de vinho para a cara, as pisaduras no braço deste verão quando me atrasava para fazer o jantar e ele puxava-me, a cicatriz debaixo do queixo porque há uns anos atrás ele estava furioso e eu fiz um comentário desagradável e ele atirou-me das escadas a baixo e, assim, as incontáveis marcas que desapareceram com o tempo vêm à memória.

Eu solto uma risada quando me lembro da minha professora de inglês que chamou os serviços sociais porque achava que os meus me batiam; a teoria dela estava perto.

Eu nunca contei a ninguém, porquê? Nem eu sei a resposta.

Há uns dias atrás foi a primeira vez que a minha mãe viu ele a bater-me e foi a primeira vez que ele tocou nela. As coisas só estão a piorar, ele nunca vai parar ou ficar melhor. Esta é a primeira vez que penso assim, sempre pensei que ele fosse melhorar. Já que estudo psicologia, acredito que todos possam mudar, mesmo os comportamentos que parecem incontroláveis, mas agora não tenho a certeza.

As batidas na porta do quarto acordam-me da minha realização pessoal e eu limpo as lágrimas secas que se encontram na minha cara. Pego numa toalha e cobro o meu corpo antes de abrir a porta.

"Já pensaste numa desculpa?" O Luke pergunta depois de entrar no quarto. As palavras saem da minha boca antes de eu pensar e conto-lho tudo, tiro a toalha e mostro-lhe todas as marcas visíveis e as histórias que as acompanham. Quando chego ao fim, estávamos os dois a chorar.

"Porque é que estás a chorar?" Eu pergunto ao Luke no meio de risadas e choro.

"Porque estamos os dois fodidos por dentro!" Ele respondo e eu rio. "Não, a serio! Ambos viemos para uma viagem que não queríamos com pessoas que queremos evitar porque, bem, estamos fodidos por dentro!" Ele continua acompanhando-me nos risos.

"Quem não está?" Eu questiono e ele atira-se para a cama continuando com os risos. "Que tal ignorarmos os nossos problemas e ficar aqui a ver Friends?" Eu proponho e ele imediatamente concorda deitando-se em condições para eu me deitar à beira dele.

Consoante as personagens falam e nós nos rimos, o nó no meu estômago desaparece e o medo dentro de mim dissipa-se, fazendo o meu corpo relaxar pela primeira vez desde há muito tempo. Depois de alguns episódios, adormeço devido à exaustão criada ontem quando não consegui adormecer.

The A Team (fanfic portuguesa-5sos)Onde histórias criam vida. Descubra agora