☙ • Verdades Mastigadas

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Matt acompanhava tudo encostado no portal de entrada do hospital da Reserva. Os curandeiros, e também Marie, que havia sido convidada pelo Sr. Venon a se juntar a eles no retorno até a Reserva, cuidavam de Mark que apesar de não sangrar mais, ainda estava desacordado. É claro que a ida dela até lá seria a sentença da revelação do segredo deles.

“No início Matt passou o caminho todo se perguntando como ela iria reagir ao saber que era ele, ali, naquela forma de lobo. Ele a levara até a Reserva em suas costas. Ela era tão leve que quase não dava pra sentir que ela estava lá, mas no seu coração, ela pesava.

A incerteza do que aconteceria a seguir o consumia. Talvez ela nunca mais quisesse vê-lo. Talvez ficasse com medo, como na clareira. Sinceramente, ele não a culparia. Mas sentiria a sua falta quando ela se fosse. Ele respirou fundo quando viu que eles se aproximavam do arco. Como começaria a contar a ela? Como contaria?

— Matt, talvez venhamos a precisar de você. Vá vestir alguma coisa. — O Sr. Venon disse assim que chegaram a Reserva e Matt apertou os olhos. O Sr. Venon com certeza não seria uma pessoa pra quem Matt contaria algum segredo. Mas aquilo encurtou o caminho.

Sentiu o corpo de Marie enrijecer. Podia ouvir o coração dela e a sua respiração. Eles ficaram parados um tempo, perto de onde um dia havia estado a estátua da acolhedora. Os dois curandeiros e alguns dos rapazes que agora ajudavam na guarda levaram Mark e Julio pra dentro do hospital Reservado. Nenhum deles ainda estava na forma humana. Luke deu uma última olhada em Matt e foi pra lá também. Precisava de cuidados no pescoço. Mas Matt sabia que ele sairia daquela forma quando já estivesse dentro do hospital. Afinal de contas, estava nu em pêlo. Ele e Marie ficaram sozinhos. Ele respirou fundo mais uma vez e fechou os olhos. Então se abaixou pra que ela pudesse descer. Ele sentiu o peso dela ser subtraído das suas costas quando ela escorregou pro lado e desceu fazendo um barulhinho.

Silêncio.

— Matt? — Marie perguntou.

Ele ainda estava com os olhos fechados, mas podia sentir o olhar dela sobre ele. Arriscou abri ao menos um. Ela estava mesmo olhando-o. Esperando. Era ridículo. Simplesmente ridículo. Ele era aquilo. Era o que era e não dava pra mudar. Mesmo que ele escolhesse nunca mais ser Lobisomem. Ainda existiria essa parte de si. Ele seria assim pra sempre.

Matthew então sacudiu a cabeça, afim de espantar qualquer sentimento ou pensamento ruim. Levantou-se. Olhou pra Marie reunindo toda a coragem que tinha e assentiu. “Sim, sou eu. Esse sou eu. Eu sou assim.” Pensou tentando convencer mais a si mesmo do que a ela. Já fazia dias que Matt estava naquela rotina. Não era como um resfriado. Não ia passar. “Esse sou eu.” Não existia remédio, não existia cura. “Eu sou um lobisomem e eu serei um pra sempre.” Empertigou-se um pouco mais. Deixando o peito estufado, mas não de forma exagerada. Apenas acabara de decidir que não mais iria abaixar a cabeça pra nada e nem pra ninguém. Não tinha nada de errado em ser quem ele era. Matt abaixou os olhos e Marie ainda o olhava. Como se soubesse que ele estava passando por um momento de aceitação pessoal e ela esperava paciente sua vez.

Eles se encararam em silêncio. De novo aquela troca de olhar. Aquele olhar de reconhecimento. “Fala alguma coisa.” Matt pensou ansioso. Marie estava parada boquiaberta. Talvez perdida nos próprios pensamentos. Matt sentiu o coração dar um salto. Achava o ato de ter de esperar simplesmente sufocante. Teve vontade de pegar ela pelos ombros e sacudir. Mas então, ela reagiu.

Ela sorriu.

“O quê?” Matt pensou confuso.

Um sorriso grande e sincero.

Lobisomem - Eu não sou um heróiOnde histórias criam vida. Descubra agora