— Ca-ca-Clara? O que você... o que você está fazendo aqui?! — Gritou.
Engoli saliva, o peito acelerado e o oxigênio perdido em algum lugar muito remoto de mim.
— Senhor Fábio?! — Naia, a desbocada, disse desacreditando que meu pai era mesmo um dos sujeitos envolvidos naquela sujeira toda.
Mas ele ainda estava atordoado e furioso demais para dar algum tipo de resposta à mulher que me levara até lá. Talvez porque não havia necessidade de confirmar algo tão óbvio.
A questão era que... tudo se encaixava. E não importava o que ele dissesse: Agora eu já sabia de tudo.
Cansado do silêncio, fechou a porta e respirou fundo, esfregando as mãos pelo rosto e deixando-as paradas sobre a boca e o nariz por algum tempo, pensando no que dizer.
— Como veio parar aqui? — Indagou, a voz se esforçando para transmitir paciência.
— Bem... eu tenho uma pergunta melhor... como se envolveu nisso? — Rebati.
Desviando o rosto, deixou um risinho escapar.
— Não é simples como você imagina, filha. — Deu uma pausa dramática.
— Eu sei que não. Mas quero ouvir da sua boca o que já sei.
O homem de fios castanhos e grisalhos fechou os olhos e respirou fundo, matutando uma resposta.
— Eu nunca fui uma pessoa ruim, Clara. Você é minha filha, sabe mais do que ninguém que jamais teria coragem de me envolver em algo tão ruim se não houvesse uma boa causa. — Puxou a cadeira de metal para si e sentou-se nela, enquanto dava uma pausa dramática e me permitia digerir suas palavras. — Isso nunca foi uma viagem de férias de verdade, filha. E muito menos uma repentina. Já havia sido programada há 1 mês.
Suspirei rindo. Como eu não percebera...
Aquilo estava errado desde o início.
— Nossa gasolina, alimentação... todas as despesas foram financiadas pela Paux. Eu sabia que quando a esmola é demais o santo desconfia, mas...
— Como pode? — Interrompi com a voz cortada e a água salgada começando a embaçar minha vista.
Engolindo saliva, ele se calou no mesmo instante.
— Mesmo sendo desonesto, eu não pude evitar, meu bem. — A voz embargou. — Acha que eu não estava cansado daquela maldita escola?! Daqueles alunos insuportáveis? De nossa casa ser sustentada pelos bolos que sua mãe vende na padaria? Ou mais... de ver você, uma menina dedicada e inteligente, estudar no Cazuso?
Agora havia sido minha vez de abaixar a cabeça.
Embora eu não "detestasse" minha escola, não podia negar que era culpada por sempre reclamar de lá, não notando que meu pai fazia o que podia pra me dar uma vida digna.
Mas me custava a crer que ele havia mesmo se envolvido na criação de uma bomba...
— Eles me ofereceram tanto dinheiro, Clara... Um dinheiro que eu, como professor de química, jamais conseguiria obter. E me deram algo que não tem preço: valor. Em quase 15 anos de trabalho, NUNCA reconheceram meu esforço. Mas... aqui? Aqui o que eu faço importa. Meus conhecimentos são úteis pra alguma coisa.
— A troco do quê? — Naia interrompeu. — Degradação ambiental?
Ele engoliu em seco.
— Pai... — Uma lágrima escorreu.
— Você não tem culpa. Eu sou adulto. Sou responsável pelo que escolho me envolver. E agora a bagunça já está feita. Não há mais o que...
— Ah não, gente. Parou com esse chororô! — Naia cansou de tentar manter a paz. — Que história é essa de que nada mais pode ser feito? Senhor, com todo respeito, você foi participante da criação de um dos maiores vírus do planeta. Está ciente que essa "brincadeira" de Estado está ocasionando uma chacina marítima que logo se alastrará pela superfície terrestre e causará o desequilíbrio do ciclo ambiental?
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Tudo Começou Aqui [Concluído]
FantasyMaria Clara tinha uma vida de adolescente quase normal. Terceiro ano do Ensino Médio, uma melhor amiga, um irmão mais velho chato, uma mãe louca, um pai implicante, colegas idiotas na escola e uma coisa detestável chamada "invisibilidade social". P...