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SALMO XLVIIEscrevo para exorcizar-me
Dos anjos, do meu primeiro beijo chorado...
Ah aquele primeiro olhar de adeus
É-nos um mistério anichado.
Só quando meus pecados estiverem
Nas mãos dos santos poderei sanar-me.
Antes, porém, dessa volta de mundo,
Piedosamente escrevo
E todos os suspiros que insuflei
Cinzentaram nuvens
Que outros de vós chamam
Beleza,
Poema,
Horror...
Eu chamo-as de meu bem e fim-primeiro.
Jaz uma crônica
Nos meus olhos,
A ponto de transbordar.
Vejo o impalpável.
E palpito vozes cruas jamais ditas
E as escrevo e escrevo.Sem que eu faça sinal,
Minha mão retalha uma cruz sobre mim
E os papéis que maculei
São glória
Das minhas confissões não perdoadas.
Agora mesmo eu as sinto,
Veniais, sorvendo
As orações que enlaço.É que sou padroeira de iletrados.
Sim, os de afagos sem linhas;
Os de tinta-sangue-anêmico
De amor;
Os de paz em vírgulas e choros-reticências;
Os de sorriso-exclamação e virgens-hífens...Por mim, por Deus e por mim de novo
Escrevo.
Estarreço em braços como menino-Deus,
Devolvo em pedradas a pedra
Do fariseu,
Absolvo judas,
Deixo Pedro errar
Quanto quiser das vezes,
Machadeio o lenho-cruz
Antes de erguido,
Dobro e desdobro linhos de pano
A cada túmulo que escavo...
Nada me basta!
Escrevo e escrevo.
Maldição do poeta é ser isso:
Apócrifo de si mesmo.- Dulce de Magdala.
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Salmos de Madalena
PoetryEssa coletânea de poemas intenta ser uma Ode ao feminino e a sua estreita relação com o Transcendente. Deus não é homem nem mulher, mas certamente traz em si - e no-lo dá a revelar - o que tem e gera de feminino e, por naturalidade, as mulheres tran...