Foi um dia muito estranho, e bem no finalzinho da tarde começou a chover, escurecendo ainda mais rápido, e fazendo com que ventos frios viessem, transformando a primavera de outubro em um inverno de junho. A cidade parecia assustada, e às 18h da noite estavam todos já em suas casas, alguns com as portas trancadas, outros não estavam nem ai com a situação, e estavam do lado de fora, sentados conversando, como sempre faziam. Santa Helena não é uma cidade muito atrativa na questão de entretenimento, aqui as pessoas tem como diversão apenas sentar do lado de fora e comentar sobre desgraças, como esta que está acontecendo.Mais cedo no meu almoço com Ceci, descobrimos muitas coisas a respeito do ocorrido, porém, não conseguimos falar com o Chico, pois afinal, ele deve saber de mais alguma coisa, já que estava muito preocupado a ponto de querer seu filho de outro estado mais próximo dele. Sinceramente eu não fazia ideia de nada, nem sabia em que acreditar, simplesmente eu estava vivendo um sonho, um pesadelo para ser mais exato. Ao chegar em minha casa, fui logo tirando a roupa e indo pro banho. Enquanto aquela água morna caia por sobre meus cabelos, uma saturação de pensamentos vinham sobre mim. Pensava no Rogério, e em seu desaparecimento, pensava nos animais e no vídeo do vigilante sendo atacado, e por fim pensava na Ceci. Queria estar com ela agora, queria estar seguro com ela, pois quando estávamos juntos, talvez ela não tivesse a mínima noção disso, mas eu me sentia mais seguro, eu conseguia ser eu mesmo ao lado dela, e acho que Rogério gostaria de conhecer a garota incrível que ela é, seriamos um trio e tanto. Me abaixo e sento no chão com o chuveiro ligado, parece uma cena melancólica depressiva, mas eu só queria pensar, assim como a água escorria em minha cabeça, queria que meus pensamentos fizessem o mesmo e escorressem ralo a baixo. Foi quando comecei a imaginar que o desaparecimento de Rogério tivesse alguma coisa a ver com essa fera. E se ele também tivesse sido levado pela criatura?
Talvez eu não tenha relatado tantas coisas sobre Rogério, e fique talvez um pouco pairando no ar algumas coisas, mas na real eu e Rogério éramos almas gêmeas, melhores amigos inseparáveis, e não era porque ele tinha uma boa situação financeira, de longe o que vivemos como amigos foi estabelecido no interesse, tudo o que eu via nele era talvez eu mesmo, pois parecíamos demais. Meu pai quando eu tinha apenas 5 anos, bateu o carro indo para Goiânia com minha mãe e meu irmão Pedro, que é 6 anos mais velho que eu. Eles estavam indo fazer compras de roupas e presentes de Natal quando essa fatalidade ocorreu. Eu estava na casa do Francisco naquela noite de 24 de Dezembro, pois eu não quis ir, já que ficava muito enjoado e passava mal viajando longas distâncias de carro. Meu pai, Sandro Fernandes, era amigo de longas datas de Francisco, que mesmo depois de enriquecer com o prêmio da mega sena, resolveu colocar meu pai em seus planos, e ao comprar suas terras e começar a trabalhar com agronegócio, ele contratou meu pai para trabalhar pra ele e receber um bom salário. Então basicamente, meu pai estava sempre com Francisco, e como eu tinha a mesma idade de seu filho Rogério, dávamos super certo, e sempre que possível, eu dormia lá com ele, fazíamos noites do pijamas e jogávamos em seu Playstation 1 a noite toda. E naquela véspera de Natal não foi diferente, já que meus pais iriam a Goiânia aproveitar o bom salário de meu pai para compras, eu poderia ficar ali, com Chico e sua família até eles chegarem. Mas isso não aconteceu. Somente o papai e Pedro voltaram. Minha mãe, Michele Souza Fernandes, entrou em coma após uma kombi perder o controle na estrada e bater de frente com o carro do papai. Meu irmão pedro teve pequenos arranhões, meu pai quebrou umas costelas, mas minha mãe foi arremessada para fora da estrada pois seu cinto de segurança estava mal colocado.
Eu podia ouvir Francisco lá fora do quarto falando alguma coisa com sua esposa, enquanto eu e Rogério estávamos jogando, foi ai que eles entraram no quarto e me deram a notícia. “Então quer dizer que eu não poderei dar feliz natal pra mamãe e pro papai?” disse eu deixando o controle do video game no chão. Então neste dia, essas palavras fizeram Francisco chorar na minha frente, que me abraçou e disse: “Você vai sim, vai dar feliz natal sim pro papai e pra sua mãe, só volta a jogar que tudo vai ficar bem”. As pessoas falam que tudo vai ficar bem, mas em 90% dos casos nunca fica bem, e aquela noite foi um grande exemplo disso. Dois dias depois meu pai e meu irmão vieram, e me buscaram e fomos para Goiânia novamente, pois os médicos disseram que minha mãe havia despertado do coma e que estava apresentando uma pequena melhora e seu traumatismo craniano estava relativamente melhor. Ao chegar lá, com muito cuidado eu abracei a mamãe, ela sorriu muito, e vi ela chorando de alegria em me ver, e lembro-me dela dizer que me amava muito e que estava preocupada comigo. Foi quando ela frisou o olhar para o nada, e disse “meu filho, tome cuidado com os lobos maus que irão aparecer, nunca confie em ninguém, e sempre seja uma pessoa honesta…”. Essas foram as últimas palavras dela, ela morreu bem ali, comigo abraçado junto a ela.
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A BESTA
HorrorJosué Fernandes vive uma vida super comum em uma pequena cidade no interior de Goiás, onde começa receber relatos de animais mortos de maneira sinistra levando as pessoas a se questionarem oque pode estar acontecendo. A curiosidade de Josué e seus a...