A FESTA

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Logo que começou o mês de junho, ninguém no colégio falava em outra coisa além da festa junina. Cada turma formou sua quadrilha para competir no concurso que todos os anos o professor Epaminondas realizava no Harmonia.

Um grande ti-ti-ti.

Na primeira semana, o colégio foi todo enfeitado com bandeirinhas de papel. Na entrada, o pessoal da 8ª série colocou um enorme balão verde-amarelo. Na quadra, todo mundo contribuiu um pouquinho para a construção do "arraiá" do Pindura-Saia, o nosso arraial.

A animação era enorme em todas as turmas. Escolher os melhores dançarinos não era fácil e, na nossa sala, foi ainda mais difícil, pois desde o início Carmita e Bárbara implicaram com a presença de Vânia.

— Ah, não, ela não — insistiu Carmita, aborrecida.

— E por que não? — perguntei.

— Ora, porque... porque...

— Porque ela é nova na sala! — inventou Bárbara.

A turma se dividiu. Houve muita discussão. O grupo que apoiava Carmita era pequeno, mas muito barulhento. Perdemos mais de uma semana naquele participa - não participa. A birra da Carmita acabou não colando e a Vânia ficou na quadrilha. O pior ainda estava por vir, pois a professora Renata propôs o nome dela pra noiva e todos concordaram.

Pra variar, Carmita não perdeu tempo e na mesma hora alfinetou:

— A noiva do King Kong! — repetia de vez em quando, principalmente quando a gente estava ensaiando na quadra.

Elas e as outras riam de rolar pelo chão sempre que Vânia passava de braços dados com Humberto, o noivo da nossa quadrilha. Nada dava mais motivos para as implicâncias do grupinho de Carmita do que ver Vânia de braços dados com o menino, muito clarinho e de grandes olhos azuis.

De vez em quando, ela ia de um lado para o outro, resmungando:

— Nossa, não sei como o Humberto aceita uma coisa dessas!...

Ninguém lhe dava importância. Sem que percebesse, Carmita estava se tomando uma garota simplesmente insuportável para o resto da turma. Pouca gente — além, é claro, de Bárbara, Vivi e Tatiana — falava com ela. Até a professora Renata estava sem paciência com ela. Bastava a Carmita soltar um risinho — muitas vezes sem ter nada que ver com Vânia — pra ser repreendida.

Carmita corria o risco de acabar sozinha se continuasse mexendo com Vânia e fazendo pouco caso de tudo e de todos.

Ela andava sempre com raiva.

Raiva da atenção que Vânia recebia.

Raiva pelas broncas que passou a receber.

Raiva por Vânia dançar direitinho e formar um bonito par de noivos com o Humberto, que fora seu noivo na festa do ano passado.

Só por isso, nem quis fazer parte da quadrilha.

— Se não for pra ser a noiva, não quero! — resmungou, teimosa.

— Mas já estava na hora de escolher outra noiva, você não acha? — tentou argumentar a professora Renata.

A cara de Carmita ficou ainda mais amarrada. Não disse nada. Bem que queria. Imaginei que, se não fosse a professora Renata, ela muito provavelmente diria alguma coisa.

Dessa vez, no entanto, ela apenas reclamou:

— Perder o meu lugar, tudo bem... mas pra noiva do King Kong!

Carmita estava mal-acostumada. Todo ano, por este ou aquele motivo, com uma ou outra argumentação, sempre conseguia convencer os outros participantes da quadrilha a escolherem o Humberto e ela para noivos. Definitivamente, não estava preparada para enfrentar a concorrência inesperada de Vânia.

Pretinha, eu? (Júlio Emílio Braz) (1997)Onde histórias criam vida. Descubra agora