Eu estava me abominando.
Abominando-me por ter sido tão impulsiva e pela voz da minha razão não ter sido forte ao ponto de evitar a minha própria insensatez.
Desde o momento que saí do cais e cheguei até a propriedade do visconde Walsh para trocar as vestes emprestadas, minha mente pareceu notar o que realmente ocorreu, não me deixando em paz mesmo depois de regressar ao palácio e me recolher.
Após aquela noite, haviam se passado dois dias no quais eu tentei me esquivar de qualquer compromisso que envolvesse a Família Real, principalmente Isaac Harrington.
Agora, estava deitada sobre minha cama, observando distraidamente os pequenos feixes da luz da lua que entravam pelas frestas da porta da sacada.
Meus sentimentos brigavam dentro de mim, enquanto as palavras de Heilee se repetiam em meus pensamentos: "apenas brinco sobre ter aventuras com os intocáveis da nobreza, mas não desejo que se envolva com eles."
E a resposta me apavorava ainda mais porque, no fundo, eu sabia que já havia me envolvido, porém, eu não queria aceitar e não poderia. Nunca. Jamais.
Por esse motivo, ainda restava uma pequena parte de mim que não se arrependeu pelo que fez, pois, apesar de tudo, o príncipe claramente odiou aquele beijo e, se os mares queiram, ele não me procurará mais, facilitando a minha missão de afastá-lo.
Doía como queimar ao fogo, porém, no fim, isso era o melhor para todos. Isaac não precisava correr riscos para confrontar seu irmão apenas por mim e a Lady Sullivan não merecia sofrer por amizades interpretadas de maneira errônea pelos olhos indelicados da Corte.
Por fim, quando a maré entre meu coração e cabeça finalmente pareceu se acalmar, consegui cair em um sono profundo, o qual eu só me lembrava dos resquícios do que aparentava ser um oceano azul em seus olhos e um calor já reconhecido por mim.
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— Levante-se, bela adormecida! — uma voz exageradamente alta soou pelo cômodo, interrompendo o sono maravilhoso que eu prestigiava.
— Não... Heilee... — resmunguei em mal humor, cobrindo-me com a manta.
— Sim, Saphira! — ela gritou novamente, tomando a manta de mim com força. — Tem muito o que fazer hoje. Com bastante dificuldade, justifiquei sua ausência no desjejum somente para que pudesse dormir mais um pouco.
— O que tenho de fazer hoje? — dei um suspiro e me levantei, encarando minha amiga.
Heilee deu uma risada nasalada, fitando-me com sarcasmo.
— Acha mesmo que aquela ranzinza perderá a oportunidade de nos importunar com suas lições maléficas e formalistas? — rolou os olhos. — Ela havia me dito que mulheres não devem se dedicar à arte, incluindo a música!
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Spéir: O Porto dos Sonhos [Completo]
Historical FictionSaphira vive como pode em meio às dificuldades enfrentadas pela sua posição social em Spéir, um farto reino irlandês do século XVI. Encontrada e criada por piratas celtas desde a infância, sua principal motivação é descobrir quem ela é com a única p...