"A Música Nunca Parou" e a Musicoterapia

30 4 0
                                    

"A Música Nunca Parou "é essencialmente uma obra que nos faz refletir, especialmente por tratar-se da adaptação de uma história real. Partindo de um olhar filosófico podemos encontrar diversas questões do homem com os quais o Existencialismo lida diretamente. As duas mais evidentes discussões que afloram no tecido do enredo do filme são a liberdade e a angústia.

Durante toda a sua infância Gabriel Sawyer foi um garoto gentil e obediente à sua família, compartilhando até mesmo o gosto do pai pela música romântica das rádios da primeira metade do século XX. Porém com a chegada dos anos 60 (Woodstock) Gabriel conheceu o rock e a cultura hippie, aderindo às novas formas de pensamento que esse período de grande revolução cultural trouxe consigo. Ao lado da contestação a todas as formas de controle que esse movimento propunha uma busca pela liberdade autêntica: a liberdade de pensar, de agir e de ser verdadeiramente. Essa nova mentalidade em constante busca por emancipação é o que leva Gabriel a entrar em choque com os valores vigentes de sua época, ocasionando assim desentendimentos profundos com seu pai sobretudo que o levam pôr fim a sair de casa.

Muitos anos depois quando Gabriel é reencontrado por sua família e constata-se o seu tumor cerebral podemos observar muitos outros aspectos temas da corrente existencialista se processarem na dinâmica da vida dos personagens. A ansiedade pode ser muito bem percebida no comportamento de Henry ao longo da história, mesmo antes do reencontro com o filho. Sempre que estava em casa ele permanecia ouvindo rádio por horas, talvez por isso o fazer recordar-se dos bons momentos que teve com Gabriel ainda pequeno. É possível que esse comportamento dele vise mascarar a sua ansiedade de aguardar com intensidade poder se relacionar positivamente uma outra vez com seu filho.

Já a angústia é colocada na dinâmica da relação de Henry e sua esposa. Em dado momento ela rejeita dormir na mesma cama que ele, não suportando encará-lo, pelo fato de culpar-se de não ter dito nada que pudesse ter evitado a partida de Gabriel. Ela também demonstra indignação com o fato do próprio Henry estar aos poucos estar se deixando mudar, não sendo assim mais o amável homem que a conquistou ao som de baladas de namorados nos velhos anos. Após ela o deixar sozinho o marido chora sozinho, constatando com angústia que ela tem razão. Por causa de seu autoritarismo seu filho o deixou antes e por causa de sua indiferença atual sua família se fragmenta mais e mais. O medo da solidão é raiz desses sofrimentos.

Podemos ter um vislumbre bastante interessante sobre a musicoterapia em "A Música Nunca Parou". Trata-se de uma terapia diferenciada, chegando até mesmo a ser confundida por alguns como alguma ciência alternativa. Porém a musicoterapia possui embasamento científico comprovado e ainda em pesquisa. Nessa abordagem são utilizados instrumentos musicais para estimular os pacientes e ajuda-los com diversos problemas como dificuldades de aprendizado, problemas na nomeação, discriminação e expressão de afetos, depressão e outras patologias. A musicoterapia também é muito efetiva para a realização de dinâmicas psicológicas em grupos.

É justamente através da musicoterapia que Gabriel demonstra o que ficou para ele de vivência depois das experiências de consciência de juventude. Estar consciente das críticas sociais presentes em suas músicas preferidas, das implicações da guerra do Vietnam para a vida das pessoas de todo mundo, incluindo seus amigos, estar consciente das consequências do consumo de carne e das muitas hipocrisias das pessoas nos mais diversos aspectos da realidade foram grandes determinantes da consciência de mundo que Gabriel desenvolveu e que depois ficou oculta por seu problema neurológico.

Ao fim do filme é possível repensar em como nossas escolhas passadas influenciaram nosso presente e como nossas decisões atuais moldarão o futuro. Tudo isto está diretamente atrelado a nossa inerente responsabilidade como construtores de nossa existência. A vida realmente "feliz" por assim dizer em que somos capazes de assumir as consequências, boas e más, de nossas ações, não sendo medíocres em delegar a outros o peso do que realizamos. 

Janela da Alma: Cinema & PsicologiaOnde histórias criam vida. Descubra agora