Documentário "A Servidão Moderna" e a Teoria Crítica

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Apesar de perturbador, o que o documentário "A Servidão Moderna" nos traz é a realidade do século XXI. Para entender como este macro fenômeno tomou forma e quais são as contradições internas que ele encerra o materialismo histórico dialético constitui-se como um valioso método investigativo.

A concepção de desenvolvimento no capitalismo tardio passa automaticamente pela ideia de progresso, noção de que tudo o quanto possível deve ser multiplicado e aprimorado e de que tudo o que compromete ou impede essa otimização deve ser atenuado ou anulado. Esse pretenso progresso está vinculado a luta de classes, o motor da história segundo Karl Marx. Esta forma de pensar só existe pois a sociedade é dividida em classes e há uma classe dominante interessada em criar um mecanismo que ao mesmo tempo que controla a grande maioria (dominados) mantém uma pequena parcela (dominadores) em sua posição privilegiada. O mecanismo que mantêm este status quo é a ideologia.

A concepção de ideologia na teoria marxista é acentuadamente diferenciada de outras correntes de pensamento (do positivismo por exemplo). Nesta a ideologia é a ferramenta da superestrutura que legitima a condição de servos para o proletariado e de senhorio para a burguesia. A ideologia só é possível pois quando a burguesia é a detentora dos meios de produção da mercadoria (assegurado pela propriedade privada) ela também é detentora dos meios de produção espirituais. E como a produção intelectual se coloca acima da infraestrutura na estrutura social como um todo ela é a responsável por representar ou "apresentar as prováveis" formas de consciência da classe dominante.

Colocar alguém sob dominação é por definição um ato de violência. E este tipo de violência cria a revolta que causa as mudanças históricas. É mais do que correto afirmar que se a burguesia globalista atual manifestasse a sua dominação através de violências evidentes ela sofreria com a reação revoltada da massa e poderia vir a ser retirada de sua posição. Porém isto não acontece na maioria esmagadora dos contextos sociais. A causa disso é que a classe dominante, como dona dos meios de produção material e espiritual, acabou por unir essas suas duas esferas de influência e se tornou a ditadora dos modos de produção da vida. Através da arte, da ciência técnica, da filosofia e da religião a classe dominante cria uma semicultura que quando veiculada através dos meios de comunicação (também sob a posse da burguesia) conduz as massas rumo a semiformação, um conhecimento alienado (forma análoga ao trabalho alienado) que conhece superficialmente seu objeto e é expropriado dos resultados completos de seu trabalho intelectual (tal como a mais valia o é para o trabalho material). Tudo isto é possível pois através do Direito as classes dominantes conferem a sua violência um aspecto legal e aceitável por parte da classe dominada.

A ideologia é falsa pois é um sistema de representação ideal da realidade que concebe o trabalho manual e o trabalho psíquico como separados, negando assim a materialidade total da produção da vida. Desse modo as contradições internas dos fenômenos são suprimidas e estes se tornam elementos em si mesmos, entendidos como são dados e não como o fruto de um processo histórico multicausal.

A única via possível para um confronto do sistema é a tomada de consciência por parte das massas de que a história é práxis, ou seja, a história é construída pela prática dos homens e por ser assim ela sempre poderá ser alterada onde houver indivíduos produzindo sua vida com autonomia. Essa é a verdadeira emancipação.  

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