16. Raguel

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Raguel permaneceu em posição defensiva por mais alguns instantes, talvez imaginando que a criatura pudesse reaparecer e atacar novamente, mas acabou por constatar que aquela chama verde que surgiu de repente e respondia a seus comandos havia a destruído por completo. Não entendia de onde veio esta força, mas ela os salvou. Sentia uma corrente elétrica percorrer todo seu corpo, e todos os seus sentidos estavam mais aguçados.

Levando a mão às costas, por sobre o ombro direito, ela sentiu o quanto essa chama era densa, e tbm que ela brotava de sua pele, como se fosse a extensão de um membro, depois repetiu esse processo do lado esquerdo e viu que eram um par, como se fossem uma espécie de asas. Concentrou-se em movimentá-las e elas se dobravam ou se esticavam conforme a sua vontade.

Admirada, ela esticou essas "asas", e as dobrou para frente para que pusesse vê-las. Eram transparentes, como se fossem pura energia, porém podiam ser sólidas e firmes, ou etéreas e voláteis conforme a necessidade. Estendendo a mão, ela sentiu o toque provando a ligação nervosa entre esses novos membros e ela, mas apertando sua extremidade entre o indicador e o polegar e pressionando com força, não sentiu dor, apenas uma leve pressão. Era estranho ter sensibilidade, mas não dor, e isso demonstrava que essas asas possuiam muita resistência e poderia ser uma espécie de mecanismo de defesa.

_ É exatamente isso que você é!_ Disse ela como se conversasse com o par de asas que acabara de conhecer_ Um excelente mecanismo de defesa. Se não tivessem surgido, Gabriel e eu estaríamos...

Lembrar-se de Gabriel a fez congelar, ele fora atingido com muita força por uma criatura que, se fez um tremendo estrago em uma porta blindada, que estrago não teria feito nele? Virando-se o viu deitado a alguns metros de onde estava, e com um impulso, se aproximou dele, a uma velocidade impressionante, fato que ela prefiriu ignorar, preocupada com o rapaz.

Ajoelhando-se ao seu lado, viu que ele ainda estava consciente e respirava com dificuldades. Segurando sua mão, ela recebeu uma infinidade de informações sobre a sua condição física em sua mente, como se o corpo dele fizesse o upload instantâneo dessas informações para ela através de seu toque.

Ele havia fraturado diversos ossos de seu corpo, danificado a coluna vertebral, e alguns órgãos internos foram perfurados causando hemorragias, além da forte pancada na cabeça, que lhe causou uma concussão. Não sabia como estava fazendo aquilo, mas sabia que os sinais vitais dele estavam desaparecendo, e ela precisava agir rápido para salvá-lo.

Instintivamente, ela se curvou e o beijou nos lábios, e então ele perdeu os sentidos.

_ Resista, por favor!_ Ela disse com lágrimas nos olhos, mesmo sabendo que ele não podia ouví-la_ Vou levá-lo ao hospital!

Colocando os braços por baixo do corpo inerte dele, ela o ergueu como se levantasse um pedaço de tecido, e lavantando se, seguiu às pressas até uma das viaturas.

Chegando a uma dessas viaturas, algo lhe ocorreu, e ela lembrou-se de suas asas, e segurando Gabriel firmemente contra o peito, ela fechou os olhos e concentrou-se nelas. Com um simples comando mental, ela sentiu seus pés desprenderem-se do chão e o ar tocando sua face ao ser cortado pelo movimento vertical. Sentiu uma leve resistência da gravidade, mas também sentiu que ela não era páreo para o seu novo poder.

Abrindo os olhos, ela se viu a vários metros do chão, certificou-se de que o rapaz estava seguro e de que não o deixaria cair, e projetando-se para frente, ordenou um bater de asas que a impulsionou em um vôo na direção que ela sabia ser do hospital municipal da cidade.

As edificações de Miraculous Clearing eram relativamente baixas em relação a outras cidades, e apenas alguns edifícios faziam parte da paisagem, que ela via agora de cima, e que passava rapidamente por seu campo de visão.

Ela tinha uma percepção apurada de tudo agora e se movia com maestria a uma velocidade considerável, preocupando se apenas com a segurança de Gabriel, que já parecia estar quase sem vida.

_ Aguente firme, falta só mais um pouco! _ Ela disse pra ele, sabendo que não a estava ouvindo, como se estivesse tentando convencer a si mesma de que ainda havia esperança, mas sentia que o coração dele pararia a qualquer momento_ Você vai ficar bem!

O hospital ficava no lado sul da cidade, e ela o avistou de longe e já procurou um lugar para descer, decidindo por fim descer no terraço onde avistou um heliporto. Pousou suavemente na superfície e se apressou até a porta do elevador que não estava funcionando, então decidiu ir pela escada de emergência. Encontrou a porta trancada com um cadeado que arrancou facilmente com uma das asas, e observou que o interior da escadaria seria estreito demais para elas, então se concentrou tentando deixá-las etéreas, mas por algum motivo não conseguiu e por fim sentiu elas se retraírem até sumirem por completo, e ela desceu as escadas apressadamente.

Chegando ao fim das escadas, ela entrou em um corredor vazio do hospital, iluminado por luzes de emergência e encontrou algumas salas vazias, e um silêncio assustador.

_ Eu devia ter imaginado! _ Ela disse pra si mesma, desolada ao entrar em uma das salas que parecia um escritório e avistar no chão um jaleco e algumas roupas que deduziu serem de algum médico que sumiu, assim como sua mãe e os pais de Gabriel._ Mas será que não sobrou ninguém aqui?

Seguindo ainda com ele nos braços, ela sentiu um leve cansaço, mas ignorou, mesmo percebendo que ele começara a ficar mais pesado, e ao chegar ao andar inferior, que ela viu se tratar da Unidade de Tratamento Intensivo, ao ler as placas, o colocou em uma maca que encontrou pelo corredor.

Afastou-se dele por um instante, a fim de vasculhar o andar por ajuda, mas o que encontrou a deixou horrorizada. Pela janela dos leitos viu que os pacientes jaziam mortos e abandonados ainda conectados à aparelhos desligados. Mesmo sentindo o desespero lhe dominar, ela voltou até onde deixou a maca em que Gabriel estava e seguiu pela rampa para o andar inferior, na esperança de encontrar alguma ajuda.

No primeiro andar, mais bagunça e jalecos espalhados pelo chão os aguardavam, e ela, vencida pelo desespero e agora pelo cansaço, sentou-se em uma cadeira de espera no corredor principal, e apoiada no corpo de Gabriel inerte em cima da maca, chorou.

_ De que me adianta descobrir esses poderes, ou poder voar_ Disse, como se conversasse com alguma entidade invisível_ Se eu não puder ajudá-lo.

_ Raguel! _ Ele disse com dificuldade, despertando derrepente para surpresa dela, que se levantou e se debruçou sobre a maca _ Eu tive um sonho estranho, com você se transformando em um anjo e me salvando da garotinha monstro.

_ Eu achei que ia te perder_ Disse ela, agora com lágrimas de alívio nos olhos, ignorando o que ele disse!_ Não se esforce muito, você está muito machucado.

Um barulho semelhante ao de um monitor cardíaco, que ela não tinha ouvido antes, a fez se calar e se concentrar, tentando identificar a sua direção e o seguiu, entrando no centro cirúrgico. Ouvindo o barulho mais uma vez, constatou que vinha das salas de enfermaria ao fundo, e foi checar.

Tentando abrir a porta, viu que estava trancada, mas olhando pelo vidro de observação na parede ao lado, viu que uma pessoa se encontrava deitada em um dos leitos e estava viva, pois estava conectada á aparelhos e ao oxigênio ligado.

_ Se tem alguém sendo tratado, tem alguém cuidando!_ Ela pensou _ E pode cuidar do Gabriel também.

Entrando na sala ao lado, ela viu um leito vazio e levando Gabriel até lá, o transferiu para o leito, com dificuldade, de modo a ficar mais confortável e ele logo adormeceu novamente.

Parecia que a força que surigiu com as asas, passou a diminuir assim que ela as retraiu, e que ela havia gastado muita energia para mantê-las todo o tempo que precisou, estando agora esgotada.

Caminhando pelo hospital ela viu em um relógio na parede que já eram desenove horas, e chegando à recepção avistou algumas máquinas automáticas de snacks e de refrigerantes. Uma delas tinha sido destruída, possivelmente pela cadeira que estava jogada ao seu lado, e estava vazia. Ela então sentiu fome como nunca havia sentido antes em sua vida, e pegando a cadeira, a arremessou contra outra máquina de snacks e depois contra uma de refrigerantes também, e servindo-se à vontade, pegou o que conseguiu carregar e voltou pra sala onde deixou Gabriel.

_ Agora, é só aguardar!_ Disse ela pra si mesma, e colocando todo o espólio em cima de uma mesa, se jogou num confortável sofá de acompanhante, e abriu um pacote de salgadinhos e uma latinha de refrigerante.

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