Ully - O Despertar

dezessete

Quatro dias se passaram, completando seis dias que havíamos chegado na casa dos Suli. Esses dias entraram numa rotina: Alongamentos e exercícios de aquecimento no alvorecer, café da manhã, exercícios físicos mais intensos, pausa, almoço, aulas com Lucca, pausa, Jantar. Nesses quatro dias, Lucca passou diversos exercícios para serem corrigidos no dia seguinte, e cada noite, Ayla, Vasti e eu fazíamos juntas, cada dia no quarto de alguma de nós e isso estava aflorando em nós uma amizade cada vez mais sincera, profunda, principalmente devido às horas conversando sobre um pouco de tudo depois dos exercícios. A intimidade surgindo gradativamente.

E também, com os exercícios, estávamos evoluindo aos poucos, começando a formar palavras. E eu estava feliz com isso.

Ao fim do dia, voltamos para os nossos quartos para nos preparar para o jantar. Não escolhi um vestido longo desta vez. Optei por um que ia alguns centímetros acima do meu joelho, com a saia rodada, mangas curtas e uma abertura imensa nas costas. Mais uma vez, deixei os cabelos soltos para cobrir a pele exposta pela abertura, coloquei um salto fechado e desci para a sala de jantar.

Assim que atravessei as portas, percebi que, além dos Suli, outras duas pessoas ocupavam lugares à mesa. As duas mulheres que vieram com Ári no primeiro dia. A pequena de aparência delicada e a pálida de olhos ferozes. Das seis escolhidas, apenas Áxa, Vasti e eu havíamos chegado. Me sentei no meu lugar e olhei para as duas vampiras Suli de relance, cumprimentando a todos. As duas me responderam assentindo levemente.

Não demorou muito para as outras chegarem e logo o jantar foi servido. Eu estava começando a me acostumar com a sensação esquisita que os Berseas despertavam em mim todas as vezes em que eu estava proxima deles. Começamos a comer, inicialmente em um silêncio esquisito que logo foi quebrado pela mulher de aparência delicada.

--- Bom, antes de tudo, eu gostaria de saber se vocês têm alguma reclamação a fazer. Sofreram algum tipo de violência desde a última vez em que nos vimos? --- ela olhou para cada uma de nós de forma penetrante, a voz fina e melodiosa.

Tentei evitar, mas não consegui não olhar para Liam, e percebi que eu não era a única encarando-o. Núbia e Áxa também, a primeira com receio e um tanto de medo e a segunda com fúria. A mulher de olhos ferozes percebeu, seguiu nosso olhar e encarou Liam com os olhos violeta transbordando desconfiança. As duas vampiras esperaram por uma resposta, e eu estava tentada a dizer algo, mas Liam tirou os olhos do próprio prato para me encarar, cheio de desafio. Depois olhou para Áxa e então para Núbia.

Sopesei minhas escolhas e as possíveis consequências. Eu não tinha ideia do que podia acontecer se eu dissesse que Liam invadiu meu quarto, me seduziu e tentou beber meu sangue. Elas poderiam aplicar algum tipo de punição nele que poderia fazer com que nunca mais chegasse perto de mim, ou, piorar as coisas, caso haja alguma punição e ele decida se vingar. Liam poderia fazer da minha vida um inferno se quisesse. Pode ser também que não haja punição alguma e seja algum tipo de teste para saber se somos submissas. Pode ser que as coisas fiquem ruins tanto para mim quanto para as outras, caso elas decidam delatar Liam. Ou pode ser que nada mude.

Não tinha ideia do que fazer. Olhei para Áxa, que ainda encarava Liam com fúria, e depois olhei para Núbia. Seus olhos azuis transbordavam tanto medo quanto raiva. Então me lembrei do dia em que chegamos, de como ela estava machucada depois de passar horas sozinha com Liam dentro de uma carruagem um tanto apertada.

Ári, a matriarca, olhara para ela apenas uma vez e se aproximou, curou suas feridas e questionou quem as tinha causado. Me lembrei do olhar raivoso que Ári lançara na direção de Liam e a forma como ele se encolheu e se afastou um pouco. Quando os costureiros levaram Liam de volta para o clã a mando de Ári, pensei que ele seria espancado ou coisa do tipo, mas não o vi com nenhum machucado aparente.