Síndrome do Crepúsculo

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    Embora determinada, Amber não fazia ideia de como proceder.
    Longe de onde Amber estava, mais ao norte, na frente de uma casa ouviam-se suspiros, após duas ou três batidas, quem morava na casa abriu a porta, esperava outra pessoa, mostrava-se preocupado, contudo não negou a entrada daquele que estava em pé na sua frente, pelo contrário, quem estava ali talvez pudesse ajudar, sendo convidado para entrar caminha imponente atrás do anfitrião, já dizia a lenda, vampiros não entram nas casas sem serem convidados. Se iniciava ali mais uma obra de arte, totalmente brutal e com um tema diferente, para a surpresa do artista alguém abriu a porta assim que ele havia amarrado o dono da casa, tinha acabado de ganhar material extra para criar. Seria um dia atípico, já se aproximava das 19hrs, o sol ainda alto e lentamente se esgueirando por trás dos prédios, uma visão rara, a última coisa que as pessoas daquela casa viram.
    O tempo passava, a mente de Amber não parava de pensar em alguém conhecido que poderia acabar nas mãos do assassino, começou então a montar uma lista de nomes que pudesse levar a resposta. Conseguiu imaginar algumas pessoas, o primeiro que veio a sua mente foi Dylan, mas por que o rapaz? Ela gostava muito dele e não queria imaginar um cenário onde ele seria morto, sempre o observou mas nunca se falaram, o assassino não imaginaria que são próximos, ou será que Dylan também estava de olho nela? pensou Amber, as chances seriam de 50% a 50%, nunca havia de fato conversado com ele por isso não sabia de suas intenções, na verdade ele poderia ser o próprio assassino! A segunda pessoa que lhe veio à mente foi seu professor, esse não era muito provável, mais suspeito de ser o assassino do que ser assassinado, o próximo seria o seu chefe, improvável, no trabalho só falava o necessário, tinha mais olhos para Lucy do que para a própria esposa que o esperava em casa todos os dias. Lucy poderia ser um alvo? A lista era muito grande, desde sua vizinha até Catherine que conheceu no metrô.
    Já fora do banheiro, Amber caminha e para em frente a sua mesa, em um rápido momento de loucura pega sua bolsa e pede para que Lucy avise ao chefe que está passando mal e precisou sair, já Lucy sem entender nada conseguiu apenas dizer “sim”. Seu destino era um telefone público, iria fazer uma denúncia anônima, ligar para a polícia e indicar a possível vítima que seria quem, Amber?
    O telefone toca, Franklin Kale, o diretor da faculdade atende.
    – Alô quem fala?
    – Boa noite senhor Franklin, confortável na segurança de sua casa?
    – Quem está falando? E que voz estranha é esta?
    – Assisti sua entrevista na TV hoje, o senhor fala bonito, além de ser muito seguro de si...
    – Você é o assassino!
    – ...e esperto também.
    – Fale o que deseja seu covarde ordinário!
    – Nem nos conhecemos e você me trata assim, que deselegante.
    – Fale de uma vez seu monstro!
    – Velho ignorante! Enfim, queria dizer que achei esplêndido a forma como me descreveu para todos, achei tão bom que gostaria de me encontrar com o senhor pessoalmente.
    – Isso é uma ameaça?
    – Um convite.
    – Pois eu nego, jamais me encontraria na presença de um ser desprezível do seu tipo.
    – Sei que vivemos em um país livre, entretanto não pode negar meu convite.
    – Assim que desligar vou ligar para a polícia.
    – Vai pedir que a polícia te vigie? Vai precisar.
    – Estou desligando, seu filho da puta!
    – Só mais uma coisa!
    – .....
    – Estou particularmente interessado na repercussão desses acontecimentos, por isso queria que o senhor fosse meu porta voz em algumas coisinhas.
    – Como assim “desses acontecimentos”?
    – Verá.
    – Alô, alô!? Maldito, desligou.
    O departamento de polícia de Manhattan recebe uma ligação às 19:27, uma policial atende.
    – Departamento de polícia de Manhattan, boa noite!
    – Boa noite, gostaria de fazer uma denúncia anônima de um possível assassinato.
    – Sim, claro, prossiga por favor.
    – Uma aluna de arquitetura, turno da manhã, estuda na faculdade Manhattan, seu nome é Catherine.
    – Outra vez naquela faculdade!? O sobrenome dela?
    – Não sei senhora.
    – Tudo bem, vou providenciar que procurem pelo endereço dela em arquivos da faculdade.
    – Muito obrigado.
    – Como suspeita que seja essa aluna?
    – Desculpe senhora, não posso explicar, obrigado por me ouvir, adeus.

    A jovem tinha suas dúvidas, escolheu Catherine justamente por ter recebido as cartas também, como o assassino havia dito, suas escolhas eram feitas por acaso, entretanto em nenhum momento ele citou Catherine nas cartas, sendo ela mesma que entregou uma delas diretamente para Amber, só restava acreditar que a polícia confiaria na ligação.
    Ainda próxima do telefone público Amber é abordada por um rapaz, aquele que estava esperando para ser interrogado junto aos demais.
    – Ora ora se não é a ruivinha.
    – O que foi cara, veio me acusar de novo?
    – Olha, foi mal por aquele dia, estava irritado de esperar.
    – Não me convence.
    – O seu nome é Amber certo?
    – Como sabe disso?
    – Calma aí sua desconfiada, não lembra que o detetive bundão te chamou pelo nome aquele dia?
    – Verdade. E o seu, eu não sei o seu nome!
    – Henrique, Ricky para os íntimos.
    – Então, Henrique, vou indo embora.
    – Espera, espera! Não vá ainda, está cedo, vamos beber alguma coisa, eu pago.
    – Eu não bebo, mas obrigado pelo convite.
    – Não disse que tipo de bebida seria.
    – Eu presumi!
    – Presumiu certo, uma cerveja seria ótima agora, mas você pode beber outra coisa. Na verdade, gostaria de conversar sobre uma coisa com você.
    – O que seria?
    – O que mais seria? Sobre o que todos estão falando?
    – O assassinato da Jane?
    – Bingo! Todos da sala são sérios demais e evitam falar sobre o assunto, você não é como os outros, me parece mais mente aberta. Eu ando bastante, converso bastante, e com tudo isso acontecendo acabei juntando algumas informações que se tornaram ideias.
    – Se eu for com você, precisa ser em alguma lanchonete, e que não demore muito.
    – Você quem manda senhorita.

    19:35, o departamento de polícia repassa as informações da ligação de Amber através do rádio para o responsável pelo caso, detetive Adams, que se encontrava em seu carro.
    – Boa noite detetive Adams quem fala é Rose.
    – Boa noite Rose, o que tem para mim?
    – Recebemos uma ligação anônima indicando um possível assassinato, e seria outra aluna daquela faculdade!
    – Rastrearam de onde veio a ligação?
    – De um telefone público mais ao sul da cidade, a uns 7 minutos.
    – Por que demorou este tempo para entrar em contato policial Rose?
    – Como a pessoa na ligação nos deu um nome, rapidamente começamos uma busca por documentos dos alunos, foi necessário avisar e instruir os policiais que iriam até a faculdade buscar os arquivos.
    – Entendo Rose, pelo visto a possível vítima não passou pelo interrogatório. Quem ligou, um homem ou uma mulher?
    – Era uma mulher, senhor.
    – Provavelmente quem ligou foi interrogada naquele dia.
    – O senhor demora muito a chegar na faculdade para ajudar?
    – Não, de onde estou é rápido até lá. Obrigado policial Rose.
    – De nada, senhor.

    Simultaneamente, Amber e Henrique entravam na lanchonete que ficava próxima ao escritório, um local movimentado. Se sentaram mais ao fundo do estabelecimento, Amber pediu panquecas e café, Henrique pediu uma cerveja.
    Conversa vai, conversa vem, Henrique tinha ganhado a confiança de Amber e aparentemente foi perdoado por acusá-la, a jovem portava um semblante de durona, uma mulher independente, de fato era independente porém era muito carente, um pessoa solitária que enfrentava o mundo sozinha todos os dias, mas ainda sim muito cautelosa. No meio da conversa Amber chama atenção de Henrique para o assunto principal, ele muda a feição, de canto de olho observa ao redor e começa.
    – Amber, você não acha estranho que a maioria dos alunos da nossa sala tenha sido interrogada?
    – Na verdade acho sim, a Jane estudava jornalismo, então por que interrogar quase metade da nossa sala?
    – Sim, e dessa metade uma parte foi interrogada no dia do assassinato, sabe o que isso significa?
    – Não.
    – Ora Amber, pensa um pouco, se uma grande parte foi interrogada no mesmo dia que aconteceu o assassinato e no outro dia o resto de nós foi intimado, significa uma coisa...
    – Alguém que estuda com a gente pode ter indicado outros da nossa sala, na verdade pode ter indicado pessoa por pessoa.
    – Exato!
    – Mas porque, qual a intenção?
    – Mais uma vez óbvio Amber, se você foi intimada a prestar um depoimento sobre uma pessoa que nem conhecia, certeza que foi armação.
    – Agora que comentou, surgiu uma dúvida.
    – Qual seria?
    – Você conhecia a Jane?
    – Não, claro que não!!
    – Entendo. Mas porque você disse que eu não a conhecia também, não lembro de ter falado nada a respeito.
    – Hum, veja bem, a questão é que ninguém da nossa sala poderia conhecer uma aluna do jornalismo que fica do outro lado da faculdade, aquele lugar é enorme.
    – Bom, isso é verdade.
    – Adoraria ficar a noite toda aqui com você, mas preciso voltar para casa, minha mãe está sozinha, ela já deve ter começado a ter os ataques dela, saio e bebo para não precisar ver aquilo.
    – Ataque!? Ela sofre de alguma doença?
    – Alzheimer.
    – Puxa vida, sinto muito.
    – É complicado, ela tem umas crises quase todo finalzinho de tarde, se chama síndrome do crepúsculo.
    – Que nome exótico.
    – O que acontece com ela também é exótico. Por causa do Alzheimer quando se aproxima das 17hrs ela começa a sofrer uns delírios, ansiedade, fica mais confusa do que já é.
    – Que horror Henrique, deve ser muito difícil passar por isso com ela.
    – Não passo, eu sempre estou fora de casa nessas horas, se eu estiver próximo ela até fica agressiva.
    – Mas e seu pai, irmãos?
    – Não, somos só eu e ela. Quando volto na parte da noite ela já está mais calma, as vezes pergunta quem eu sou, fico explicando que sou o filho dela, as vezes ela não acredita, me expulsa de casa e preciso entrar de novo escondido, uma loucura.
    – Você passa por maus bocados né. Sinto muito se lhe enxerguei com maus olhos, agora sei de onde vem sua agressividade e mau humor. – Riu Amber.
    – Se eu fosse você não ficava rindo dessas coisas hem, pode acontecer com seus pais. – Riu Henrique.
    – Acho bem difícil. – Disse Amber com um sorriso melancólico.
    – Falei brincando, não desejo isso a ninguém, é muito ruim ver quem você ama daquele jeito.
    – Sei que falou brincando. Acho que já está na hora de irmos, amanhã tem aula! – Amber sinaliza para a garçonete pedindo a conta.
    – Deixa que eu pago!
    –  Obrigado.
    – Pois é, amanhã tem aula. Mas fique atenta Amber.
    – Eu sei, e você deve se cuidar também.
    –  Eu vou. A partir de agora vamos manter contato, evitar que o pior nos aconteça.
    – Sim...
    – Mais uma coisa, acho que seria sensato mantermos distância um do outro, quem sabe na saída já fora da faculdade e longe da multidão podemos trocar algumas palavras.
    – É, pode ser, caso nos encontremos lá fora podemos até conversar um pouco.
    – Tchau Amber, se cuida.
    – Tchau, você também.

    20hrs, faculdade Manhattan, o detetive Adams chega, e logo na entrada se depara com vários guardas e policiais, o policial Jackson estava a sua espera.
    – Boa noite detetive Adams.
    – Boa noite Jackson.
    – O senhor chegou rápido mesmo, estava por aqui perto?
    – Saindo da zona norte, peguei um pequeno trânsito, deveria ter chegado mais rápido.
    – Já procuramos os documentos, achamos uma Catherine, além disso, o diretor Franklin foi avisado e está vindo para cá também.
    – Ele também!? Descobriram qual Catherine é?
    – Sim, é a Catherine Sue, estudante de arquitetura.
    – Arquitetura!!
    – Acabamos de achar o endereço dela, devemos ir?
    – Sim, vamos agora. Não vamos poder esperar o diretor, deixe alguém aqui para avisá-lo.
    – Não precisa senhor, ele chegou.
    – Ótimo, vamos colocá-lo na viatura e levar junto.
O diretor Franklin se aproxima dos policiais.
    – Boa noite senhores, tenho que informá-los de algo.
    – Boa noite diretor, informe no caminho, estamos indo em direção a casa de uma de suas alunas. Para onde estamos indo policial Jackson?
    – Zona Norte, senhor.
    – Muito bem então, vamos.

Na Ilha do Purgatório (EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora