Capítulo 32 - O peso de suas escolhas

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O cheiro suave de lavanda vindo do edredom que cobria meu corpo, foi a primeira coisa que senti ao acordar.
Eu estava em um dos quartos.

Olhei para meus pulsos, eles estavam enfaixados com um pano um pouco grosso e ainda ardiam, muito.

- Rick, Rachel?

Levantei da cama, ouvi vozes abafadas vindas da recepção e antes de ir até lá, abri as gavetas da cômoda que ficava ao lado da cama.
Meio a alguns pápeis, maços de cigarros e frascos de perfume achei algo enrolado em um lenço branco, ao fundo da última gaveta.
Era uma arma, e ao outro lado da gaveta, uma caixa com algo que eu deduzi ser munição, e estava cheia.

Eu não tinha absolutamente nenhuma experiência com armas, só as via pela TV.
Quando foi que as coisas mudaram tanto?
Bom, especificamente, quando eu fui convidada para ClownTown.

Eu estava me sentindo desprotegida, vulnerável.
Precisava de algo para me defender em caso de ataque, proteger meus amigos...
Aquilo serviria, e muito.

Coloquei-a em minha cintura e caminhei até a recepção, vagarosamente.
Estava um pouco zonza, minha cabeça doía, e naquele momento de uma coisa eu tinha certeza:
Não queria mais ficar ali.

- Sarah, você...
Precisa voltar pra cama, não pode se esforçar! Precisa ficar forte, não é? - murmurou Rick, pacientemente.
Pude ver um misto de felicidade e preocupação em seus olhos.

- Eu já estou melhor Rick, eu só não quero mais ficar nesse lugar.
Não é mais seguro, na verdade, acho que nunca foi.

- Precisamos resolver algo antes Sarah. - o moreno direcionou o olhar para o canto da recepção, onde estavam Josh, Dylan,Rachel e um garoto.

- Quem é ele? Como entrou aqui? - proferi em um tom um pouco alto, chamando a atenção dos 4 que ainda não haviam percebido a minha presença.

- Sarah, nós ficamos tão preocupados com você! - Rachel correu até mim e me deu um abraço apertado.

- Você nos assustou mocinha! - exclamou Dylan.

Eu não conseguia assimilar muito as coisas, meu olhar estava preso ao garoto no canto da recepção.
Retraído, calado...
Algo ali parecia não estar certo.

- O que sabem sobre ele? - indaguei.

- Que ele é apenas um garoto, e que está muito assustado.
Ele não nos disse muita coisa, deve ter se separado dos pais durante a evacuação da cidade. - Rick olhava com compaixão para o mesmo.

- E como ele entrou? Já estava aqui antes de chegarmos?

- Provavelmente já estava, escondido em algum canto.
Ele apareceu aqui enquanto a maioria de nós estava no banheiro com você, depois do incidente. Quando ia buscar toalhas, o encontrei aqui. - explicou Josh.

Ri sarcasticamente e sai de perto deles.

- Vocês não aprenderam mesmo né? Depois de tudo o que passamos, o que vimos...
Espero que não tenham deixado um desconhecido amolecer vocês.
Ficar vulnerável é um erro, e não podemos ter o luxo de errar nesse lugar.

- Pelo amor de Deus Sarah, ele é só um garoto. Um garoto!
Nem todo mundo é ruim, sabia? - Rachel parecia não acreditar no que eu havia acabado de dizer.

Isso era burrice.

- Por aqui as coisas não são bem assim Rachel, você sabe muito bem disso.
Eu vou conversar com ele, vamos ver o que ele tem a dizer.

- Estamos há tempos aqui e ele não nos disse nada, acho que seria perda de tempo tentar.

- Eu o farei falar.

Enquanto caminhava em sua direção, o garoto levantou a cabeça e me olhou com desdém.
Um pequeno sorriso estranho brotou em seus lábios.

- E então, qual o seu nome? - tentei forçar simpatia, algo naquele garoto não me agradou nem um pouco.

Ele permaneceu em silêncio, e com o mesmo olhar de desdém, me encarara.

- Se você não quer falar, tudo bem. Mas aqui você não vai ficar, não com a gente.

- Sarah? Está assustando ele. - murmurou Josh, se aproximando.

- Eu não ligo.
Vou perguntar uma última vez, qual se nome?
Eu sou a...

- Sarah White.
Eu sei quem você é. - o menino interrompeu-me, fiquei surpresa com suas palavras, quer dizer...
Nem tanto.

- Ótimo, se sabe quem sou também deve saber o que faço com quem cruza o meu caminho. O que está fazendo aqui? - engoli em seco e fixei meus olhos em seu rosto, o encarei com frieza.

O menino de aproximadamente 12 anos sorriu.
Novamente.
Como se me conhecesse, como se estivesse jogando algum tipo de jogo comigo.

- Você não quer mesmo colaborar? - perguntei retóricamente - Vamos ter que fazer do jeito difícil.

O grupo a alguns metros de mim me olhava com certo espanto.

- Venha até aqui Sarah! - exclamaram em coro.

- Já volto, garoto.

Ao dar 3 passos vi que o garoto havia se levantado da cadeira onde estava.
Virei-me para ele novamente, meu plano estava dando certo.

- É só eu dar as costas e você se levanta? Por que não fez isso enquanto conversávamos? - fiz aspas com os dedos.

- Você sabe o porque...

Arqueei as sombrancelhas.

- Eu sei?

O mesmo colocou a mão esquerda no bolso do casaco e de lá retirou algo pontudo.
Uma navalha, aparentemente.

Ri de sua leviandade.

- Pretende fazer o que com isso? - indaguei com ironia.

- Phill sabe onde você está, ele sempre soube.

- Então porque você está aqui, e não ele?

Rick, Josh e Dylan se aproximaram.
Rachel continuou no mesmo lugar em que estava.

- Qual é garoto? Não precisa fazer isso. - se manifestou Rick. - Pode ficar com a gente, pode sair dessa.

Uma lágrima escorreu pela bochecha do menino, ele pareceu pensar na proposta.
Mas quando voltou seus olhos pra mim e secou sua face, Rick e todos nós sabíamos o que ia acontecer.

- Não tem como sair. - no mesmo momento, o garoto segurou firmemente a navalha e veio em minha direção na intenção de me atacar.

Instantaneamente, levada pela adrenalina do momento saquei a arma e mesmo com as mãos trêmulas, mirei em sua cabeça.

- É melhor sair, eu não quero machucá-lo.

- Você quer Sarah, eu sei que quer. - ele então movimentou seus braços e aproximou-se mais alguns centímetros, e quando me dei conta, vi seu corpo no chão.

Apertei o gatilho e agora ele estava morto, morto.
A bala atravessou sua testa, e seu sangue formou uma poça debaixo de sua cabeça.
Eu matei uma criança.

Meus olhos se fixaram em seu cadáver, eu não conseguia descrever o modo como eu me senti.
A teoria é bem mais fácil do que na prática.

- Sarah, você fez o que tinha de ser feito.
Ele estava com Phill, era ele ou você. - O moreno me abraçou, tentando me deixar calma.

- Eu fiz a durona pra assustá-lo, pensei que se eu demonstrasse frieza ele recuaria.
Céus, porque isso teve que acontecer? - ainda nervosa e com o corpo trêmulo,deixei que as lágrimas caíssem.

- Ei, tem algo ali. - Rachel se abaixou e retirou algo do bolso traseiro da calça do garoto. - É um papel.

Rachel o desdobrou e ao vermos o que havia escrito ali, o espanto foi inevitável.














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