Voltei para casa atordoada com as lembranças que a imagem de Adam me trouxe. O caminho todo no banco de carona do carro de Jonas foi um tormento, tanto que desci cambaleando.
--- Vê se pega mais leve da próxima vez Sara. Certeza que não precisa de ajuda pra subir?
--- Não Lílian, mas valeu. Eu tô de boa.
Subi todo o lance de escadas no automático até chegar no meu andar e ver uma luz por debaixo da porta do apartamento vizinho que vivia cheio de poeira. Não consigo imaginar quem em sã consciência moraria numa zona daquelas. Além da luz que escapava o cheiro da maconha também se espalhava no hall de entrada que separava junto ao rap que ecoava em alto e bom som.
Entrei em casa e fechei todas as janelas numa tentativa- falha- de abafar o som. Eu precisava de álcool, com urgência. Tirei os sapatos e me joguei no sofá com uma garrafa de cerveja nas mãos. O que é o poder das memórias na gente? Sério, poderia ter um livro de autoajuda com esse título, se é que já não existisse. Foi só aquela desgraça aparecer na minha frente, com aquelas flores idiotas e aquele sorriso ridículo que minha noite foi toda por água abaixo. O que mais poderia ser pior?
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O que poderia ser pior? Isso mesmo, acordar com ressaca e atrasada para a aula. Minha cabeça latejava a cada balanço do ônibus e depois a cada palavra dos professores. Hoje o turno era duplo. Fui para o refeitório e sentei sozinha numa mesa tonta demais para procurar por Lílian ou Jonas.
Comi o almoço sem vontade alguma e de repente um copo gigantesco de café apareceu no meu campo de visão.
--- Lílian, você leu meus pensam... Ah, você não é a Lílian.
--- Darcy, e você?
--- Sara. Orgulho e preconceito?
--- Acho que foi o único livro que minha mãe terminou de ler na vida, foi uma homenagem a sua conquista.
--- Se você me disser que faz Letras vou dizer que tudo foi minimamente planejado pelo universo.
--- Uma pena se eu dissesse Engenharia Química, não?
Na minha frente estava o cara de cabelos raspados e barba me oferecendo um copo de café. Minha vontade de socializar estava beirando o zero, mas ele tinha um jeito imponente, quase amedrontador, seus olhos fundos de olheiras lhe davam um certo mistério, porém não do tipo de mistério que costuma atrair as pessoas, mas do tipo que as faziam correr. E para fechar o pacote tinha a voz rouca e praticamente sem humor, mesmo que um pequeno sorriso aparecesse no seu último comentário.
--- Você tá com uma cara de quem passou a noite bebendo, pensei em dar uma ajuda.
--- A coisa tá tão feia assim?
--- Para um rosto como o seu, a palavra feia não pode ser aplicada numa frase que se refira a você. Mas se o café não ajudar, tenho outras coisas que possam te fazer melhor.--- falou esticando um pequeno saco com um pó branco dentro.
--- Desculpa, mas não curto droga.
--- Se mudar de ideia... Sabe onde me achar. Você é bem bonita, talvez eu faça um desconto se for pra cama comigo.
--- Vá embora. --- falei, com um ato de reflexo, jogando todo o café nele.
Olhei para meu horário. Duas horas de" análise da Revolução Francesa". Meu dia não tinha como ficar melhor.
Cheguei no prédio um pouco mais cedo afim de procurar Lílian e ela não estava em nenhum lugar. Não pensei que ali havia tantas salas até ter que entrar em cada uma delas e achá-la dormindo em cima de quatro cadeiras. Ela acordou com o rangido da porta.
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Gardenville
Short StorySempre existiu no mundo corações partidos e almas incompletas no mundo. Mas o que se esconde da maioria das pessoas é que há pessoas assim que não tem a miníma ideia do seu estado. Sara teve uma briga com seu melhor amigo, antes dele ir embora. Poré...