12 - ANTÁLIA, TUPI E A DONA

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JORNAL TUPINIQUIM

Publicado em 24 de agosto de 747, por Luís Porto.

Uma grande tragédia familiar assolou as Três Terras neste mês de Agosto. Após semanas de busca, o Duque de Tão Longe, Sr. Lucena, declarou em carta ter assassinado o próprio irmão, em decorrência de desentendimentos familiares. Chris Lucena já estava sendo procurado há semanas, desde que foi dado como desaparecido. Edgar foi encontrado morto em seus aposentos na tarde de ontem. Investigadores afirmam que a causa da morte foi natural, devido à intensa depressão em que o Duque se encontrava. Seus familiares disseram que seu estado de saúde se agravou com o arrependimento do que fizera e que iriam rezar para que seu espírito fosse em paz.

Na carta, Edgar conta que deixou o corpo de Chris na Ilha do Nada, em Tão Longe, antiga Ilha do Reino. Jonatan Lucena é o próximo na linha de sucessão do ducado de Tão Longe.

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Júlia piscou várias vezes para ter certeza se estava vendo aquilo mesmo. Ela não podia nem se beliscar, para saber se estava sonhando, porque estava sonhando. Ficou admirada com a beleza do peixe à sua frente. Ele exalava um ar poderoso, mas calmo. Dentro dele (ele era translúcido então Júlia conseguia ver) não tinha órgãos ou coisas do tipo. Havia engrenagens e relógios com ponteiros, estrelas e planetas. Como se tudo isso fizesse parte do seu ser.

Júlia não conhecia os nomes de muitos peixes, pois não se interessava muito por eles, mas aquele era parecido com um peixe pequeno de aquário. No entanto, aquele peixe que estava ali na sua frente, flutuando, tinha duas vezes o seu tamanho.

Ele parou na frente de Júlia, e ela ouviu a voz. Aquela voz que a chamava no shopping. A voz que ela ouvia e pensava que era a morte a chamando, ou que estava ficando louca, tendo alucinações.

Ela vinha na sua cabeça, como se o peixe falasse na sua mente. Ninguém mais podia ouvir. Ele chamava o nome de Júlia, e a única coisa que ela conseguia fazer, era olhar para ele boquiaberta.

Então, como se quisesse que ela o seguisse, ele virou e continuou nadando/flutuando, na outra direção. E Júlia o seguiu obedientemente. Ela sabia quem ele era. Alcançou o Grande Tupi para andarem lado a lado.

Ela o tocou de leve, com um certo fascínio, para saber como seria a textura da sua pele ou escamas. Ele tinha minúsculas escamas laranjas, que brilhavam como milhares de estrelas, e Júlia teve a sensação de que ele carregava todo universo em si. Sentiu seu poder e de algum modo sabia que ele era símbolo do espaço e do tempo. Era magnífico.

Tão encantada com a beleza de Tupi, não percebeu quando pararam em frente a uma canoa de madeira, onde uma mulher estava sentada à sua espera. O peixe parou, e Júlia seguiu em frente até chegar ao barco e sentar-se. Quando olhou para trás, Tupi havia sumido.

Ela deveria ter achado estranho o fato de não existir mais chão, árvores ou casas. O espaço tinha sumido, e tudo ao seu redor era negro, a não ser pelas estrelas e a lua. E ali, no meio do nada, estavam apenas Júlia e a mulher. O que ela achou estranho mesmo foi o fato de a mulher estar vestida com roupas modernas, diferente de todas as pessoas ali.

Também não achou estranho ela já saber o nome da mulher, e, na cabeça dela, o nome "Antália" vinha e voltava como uma onda. Ela sabia que a mulher tinha entre quarenta e cinco a cinquenta anos. Sentia uma conexão estranha com ela, mas não sabia como, pois nunca a tinha visto na vida. Dessa vez Júlia não precisou se apresentar.

Sem precisar dizer uma palavra, Antália começou a remar o barco em direção ao nada. Ela fazia isso com pouco esforço, pois o barco parecia não pesar. Júlia olhava atentamente as estrelas ao seu redor e embaixo do barco, e ficou se perguntando para onde estavam indo, quando Antália rompeu o silêncio.

A Dona do Castelo 1- O Duque de Tão LongeOnde histórias criam vida. Descubra agora