18. Harry

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O que eu tava esperando dizer? Eu não sei, mas desde que aquele tal de Will se envolveu com a minha Kelly tudo começou a ir por água a baixo. E eu não vou deixar isso barato.

O resto do dia passei sozinho igual os últimos. Voltei pra casa, meu pai ainda não olha na minha cara. Tomei um longo banho e fui pra cama.

Na quarta de manhã, tinha o maldito clube do livro depois da aula. Quando acabou o horário das aulas fui ao refeitório para almoçar e tentei imaginar situações na qual eu ia passar na próxima hora.

Terminei a porção que restava de purê de ervilha no meu prato e verifiquei o relógio. Ainda tinha mais dez minutos antes da aula começar. Sem contar os mais dez que iria me atrasar. Imaginei a hipótese de não ir e ficar fazendo hora na escola, mas como meu pai é o reitor, não vai rolar.

Vou ao banheiro e ando pelos corredores sem compromisso enquanto observo-o ficar vazio.

Quando já estou cansado de ficar rodeando os mesmos lugares, entro numa das últimas salas do corredor. Uma sala reservada para reuniões como essa. A primeira coisa que vejo são nove pares de olhos me observando.

"Parece que alguém se atrasou no primeiro dia". A professora de literatura, Sra. Haley, diz como se soubesse que iria comparecer - que eu não duvido, pois meu pai pode ter mencionado.

"Perdi a hora", digo e me sento num dos sofás. Do meu lado estão Helena - faz aula de matemática comigo - e um tal de Sam.

A sala tem paredes e estantes escuras com um estilo antigo. No meio tem dois sofás marrons escuro com um estofado que parece da idade média. Credo! Ao lado está a escrivaninha, feita de madeira, provavelmente de pinheiro - pela cor, mais ou menos. A Sra. Haley está encostada na escrivaninha enquanto os outros sentam nos sofás, poltronas ou no tapete mesmo.

Olho ao redor da sala pra ver se encontro um rosto familiar. E quando menos espero, Allie está no sofá a minha frente. E quando a professora volta a falar sobre um gênero literário ou algo do tipo, Allie me olha, se inclina pra frente e diz só mexendo a boca:

"O que você está fazendo aqui?", me pergunta com curiosidade.

"Meu pai", sou direto.

"Tem alguma coisa a ver com a noite da festa?", ela ainda diz sem reproduzir nenhum som. Parece começar a se culpar. Deve ter imaginado algo muito ruim pra eu estar aqui. "Por que se foi sobre aquela noite..."

"Cof cof!", a Sra. Haley interrompe, chamando a nossa atenção para a aula. "Srta. Pressman, espero que o Sr. Bingham não atrapalhe seu desempenho durante as aulas", diz nos entreolhando. Ótimo, comecei bem!

Allie não diz nada, só se encosta no sofá duro e olha pra baixo.

Estou quase cochilando quando a professora está falando sobre o enredo de um tal livro e blá blá blá... até que diz que chegou ao fim da aula. Essa foi a hora mais longa da minha vida!

Todos se levantam e caminham até a porta. Enquanto acompanho eles, a Sra. Chata diz:

"Menos você Bingham!". Droga!

Dou meia volta. "O que foi?", digo entediado.

"Eu sei que seu pai te pediu para comparecer às aulas extracurriculares do clube do livro, e entendo que não queira colaborar. Mas espero que entenda, que isso não é o corredor para dar o seu showzinho. Então, se estiver disposto a participar das aulas, todos vão recebê-lo de braços abertos". Ela diz com seriedade. Isso parece mais um clube de apoio do que de livro. Até parece que vou me misturar com essa gente.

"Obrigado, mas não". Viro as costas e saio andando.

"Caso mude de ideia estarei aqui", ela finaliza.

Saio da sala o mais rápido que posso, e do prédio da escola mais rápido ainda. Encontro Allie na metade do caminho pro portão. Corro até chegar ao seu lado.

"Oi. Tudo bem?", pergunto. Ela leva um susto comigo e para de andar.

"Ah! Oi, o que aconteceu pra você vir no clube do livro? Você nunca participou", ela pergunta.

"Eu bati meu carro, não foi nada demais. Aí meu pai falou pra eu participar dessa baboseira".

"Foi na noite da festa, não foi? Que droga eu deveria ter te dado carona", agora ela está mais nervosa.

"Não se preocupa, a culpa não foi sua..."

"Mas eu poderia ter evitado o acidente e... espera! Você se machucou?", sem perceber o que tá fazendo ela põe as duas mãos no meu rosto e analisa cada parte dele de um lado pro outro, procurando algum machucado ou arranhão. Fico sem reação.

Quando percebe o que tá fazendo ela para e tira as mãos do meu rosto. Constrangida ela diz:

"Desculpa. Você tá bem?"

"Sim, como eu disse não foi nada demais", dou de ombros.

Ela se recupera e logo pergunta:

"Então como seu pai ficou quando viu o carro?", volta a andar e caminho com ela pra fora da escola.

Conversamos bastante até chegar no ponto no qual nos separamos.

"Então...", ela diz. "Te vejo quarta que vem? No clube?"

"Sim, infelizmente", faço uma careta. Ela ri e dá um tapinha no meu ombro:

"Para! Não é tão ruim assim", rio junto.

"'Cof cof! Srta. Pressman!'", faço uma imitação da professora irritante.

Quando terminamos de rir, ela diz:

"Ok então, até quarta que vem". Ela me dá um sorriso e se vira.

"Até". Até que esse tal de clube do livro não foi tão chato quanto imaginei.

Hallie - A outra versão do mundoOnde histórias criam vida. Descubra agora