capítulo 44

18 0 0
                                    

Dulce

Dar à luz é bem mais difícil do que pensei. a dor beira o insuportável. minhas costas parecem pegar fogo de tanto que ardem, as contrações não me deixam respirar direito e sinto que minhas forças estão me deixando.

O Miguel está aqui e de alguma forma isso me conforta. a dor é tanta que não consigo controlar o choro, só quero que isso acabe logo e eu possa segurar meu menininho nos meus braços.

- Respira fundo e quando a dor piorar você faz força para baixo- minha mãe me fala. seu olhar denuncia seu medo, mas sua voz é firme e carinhosa. a parteira não dá notícias e isso me deixa apavorada. faço minhas preces mentalmente para que tudo dê certo.

Faço do jeito que minha mãe fala, e sentir tanta dor me faz repensar meus planos de ter muitos filhos.

A água da banheira já esfriou, mas não me importa. a dor é tanta que nada ao meu redor tem importância. o Miguel nos deixou sozinhas aqui no banheiro. o pavor no seu olhar estava me deixando ainda mais ansiosa, por isso não fiz questão de que ele ficasse aqui.

Sinto uma pressão muito grande em meu quadril e faço força para ajudar meu bebê.

" Deus, me ajude, faça essa dor passar logo, eu imploro"

Respiro fundo e rápido repetidas vezes. mantenho meus olhos fechados. Que dor absurda!

- força Dulce- minha mãe pede e eu penso em respondê-la, mas nesse momento vem mais uma contração e empurro para baixo até não aguentar mais. sinto sua cabecinha saindo e logo em seguida o seu corpinho. minha mãe o puxa, arde tanto. choro e nem sei mais se é de dor ou de felicidade por ver meu bebê.

A água está misturada ao sangue e sinto um vazio dentro de mim. um alívio me preenche ao ouvir seu choro.

É tão surreal!

Minha mãe sorri e chora, assim como eu.

Seguro meu bebezinho com o maior cuidado possível. seu rostinho é tão lindo... ele é todo perfeitinho. estou tão emocionada, finalmente tenho meu filho em meus braços. Nada mais importa a não ser ele. até mesmo o tempo passou a ser algo irrelevante.

Vejo minha mãe cortar o cordão umbilical e abraço meu menininho junto aos meus seios. o Miguel entra no banheiro com um certo desespero e vem me ajudar a sair da banheira. estou fraca, mas me forço a ficar em pé e mesmo sentindo meu corpo ainda dolorido, apenas seguro meu bebê junto a mim e deixo minha mãe e o Miguel me conduzirem de volta ao quarto.

meu pai nos observa atento, os olhos vermelhos de quem chorou. ele vem até mim enquanto eu me sento na cama bem devagar. a dor ainda está presente, mas a alegria de vê lo em meus braços é imensamente maior.

- Parabéns, filha- meu pai fala baixinho e olha com carinho pro neto recém-nascido.

Olho o Miguel e me emociono ainda mais por vê-lo com os olhos marejados. ele está estático e emocionado... olha fixamente para o nosso filho. Parece não acreditar no que vê.

- estou me sentindo fraca, segura ele um pouco Miguel - peço calmamente e seus olhos arregalam assustados.

- melhor sua mãe fazer isso, Dulce- ele recua alguns passos para trás. sei que está com medo. minha mãe e meu pai apenas nos observam em silêncio- não sei como segurar um bebê, posso acabar machucando ele- ele admite.

- é seu filho. confio em você, sei que não vai machucá lo. segure, Miguel- insisto novamente e ele se aproxima cauteloso, suas mãos estão tremendo, mas ele faz o que eu peço e segura o filho.

É a cena mais linda que eu já vi na minha vida.

Algumas lágrimas molham meu rosto e sorrio satisfeita. tudo o que passamos, por piores que tenham sido, não importa mais. agora somos uma família completa, sei que a chegada do nosso bebê vai mudar nossa vida. Enquanto Miguel continua segurando nosso filho, que agora dorme tranquilamente, me visto e minha mãe arruma minha cama.

Meu pai saiu do quarto para me dar privacidade. coloco uma calcinha com absorvente e amarro meu cabelo. me deito e peço a bolsa do meu bebê à minha mãe. ela sai do quarto e nesse momento eu lembro que ainda não escolhemos o nome.

-amor - chamo o Miguel e ele continua olhando atentamente o filho. Chamo novamente e ele enfim me olha.

-oi - há tanta emoção nessa simples palavra. Sua voz é baixa e rouca. minha mãe volta e abre a bolsa, colocando sobre a cama roupinhas, fraldas e outros acessórios que vamos precisar.

- ele precisa de um nome - digo tranquilamente e o Miguel pisca para mim, parece não entender o que falo - eu quero que você escolha o nome do nosso filho, Miguel!- explico pacientemente.

Ele o observa novamente. fica pensativo e depois de alguns minutos, ele sorri timidamente e fala...

- Alejandro Luis Hernández - o nome do avô materno! gosto da sua escolha. estou tão cansada, bocejo e os dois me olham ternamente.

- durma um pouco filha, pode deixar que vamos cuidar direitinho do pequeno Alejandro- minha mãe é realmente incrível! se eu puder ser pelo menos metade da mãe que ela é, já estarei realizada.

- tudo bem - concordo já sonolenta. o dia amanheceu e a chuva deu uma trégua- você vai ficar aqui, não vai Miguel? -pergunto ansiosa e meus olhos pesam.

- eu não vou a lugar nenhum, Dulce. pode descansar tranquila- sorrio com sua resposta e fecho meus olhos. estou realmente exausta.

(...)

Acordo ouvindo um choro alto e escandaloso. Abro os olhos e procuro o meu bebê, ele está no colo do Miguel, que tenta fazê lo se acalmar. sorrio com a cena e com sua expressão desesperada. ele ainda está aqui conosco.

- ele deve estar com fome, amor- chamo sua atenção e ele vem apressado até mim, mas no momento de me entregar o nosso menino, ele faz com tanto cuidado que desconfio que ele pense que nosso bebê é de porcelana!

Abaixo a alça da minha camisola e ofereço meu seio ao meu menininho. seu choro cessa e ele suga com força e desespero. Faço carinho em seu cabelo com a minha mão livre... a sensação de amamentar meu filho é algo sublime. ele é tão perfeito! suas mãozinhas, os dedinhos, os olhos claros, a pele macia.

- preciso ir em casa, Dulce -olho rapidamente pro Miguel, ele senta ao meu lado e beija minha cabeça.

- mas eu pensei que você fosse ficar aqui conosco!- digo alarmada e ele suspira impaciente.

- eu não dormi nada nos últimos dois dias, estou exausto e preciso de um banho!- ele boceja e vejo em seus olhos que está mesmo cansado.

- tudo bem então, desde que você volte.

- eu volto sim, relaxa. Já liguei pro seu médico, ele vem às quatro horas, e sua mãe fez uma canja pra você.

Seu tom de voz varia de preocupado à impaciente e temo que ele brigue comigo. no fim é sempre isso! ele me deixa sozinha, mas agora tenho meu pequeno para me fazer companhia e não quero ficar mais angustiada por causa do Miguel.

- tá bem. eu e o Alejandro vamos ficar bem! - digo levemente irritada e ele suspira mais uma vez.

- eu volto Dulce! E não precisa ficar me ligando. - ele beija minha cabeça mais uma vez, acaricia os cabelinhos do filho e sai.

Logo depois, minha mãe aparece e traz uma bandeja com canja, suco, água e algumas frutas. meu estômago ronca.. meu bebê dormiu novamente. O entrego à minha mãe e puxo a bandeja até meu colo.. só o cheiro da comida já me faz salivar. meu corpo ainda está dolorido, mas agora não me sinto mais tão cansada.

As horas passam, a manhã se vai, meu bebê acorda e mama novamente. minha mãe não me deixa sozinha muito tempo. ela troca a sua fraldinha enquanto eu bebo uma vitamina de abacate com banana e mel que ela mesma fez.

A tarde, o Doutor Fernando, que me acompanhou durante minha gestação chega e nos examina. me elogia pelo meu lindo bebê e me parabeniza pela maternidade. me aconselha nos primeiros cuidados com meu filho e eu ouço tudo com atenção, minha mãe também ouve. Então ele se vai. meu bebê chora novamente e eu lhe amamento mais uma vez. à tarde vira noite e tiro outro cochilo, enquanto meu Alejandro também dorme.

Por volta das sete horas, consigo tomar banho sozinha.. escovo meus dentes, meu cabelo e passo um perfume sem álcool por causa do meu filhinho.

O Miguel não ligou, nem voltou e isso não me chateia tanto mais. A ausência dele não é nenhuma novidade pra mim.. claro que pensei que ele mudaria seu comportamento egoísta depois do nascimento do nosso filho, mas quem perde com essa distância é apenas ele.

Durante a madrugada quase não durmo. O Alejandro é um bebê esfomeado, mama bastante e isso me deixa exausta, mesmo com a ajuda da minha mãe. acabo dormindo no quartinho dele, na cama de solteiro que há. penso no quão idiota o Miguel é por não ter voltado.

(...)

A manhã chega e estou com olheiras pela noite exaustiva. minha mãe traz meu café da manhã e dá banho no meu bebê, aproveito e tomo meu banho também. volto e o amamento... enquanto ele dorme eu aproveito para cochilar um pouco. minhas dores diminuíram, mas ainda sinto cólicas e estou inchada, mas isso é normal. ainda é muito recente e meu corpo está se recuperando. a tarde, o Brandon me entrega um buquê de flores e me parabeniza. agradeço envergonhada e não deixo ele prolongar a conversa. digo que estou cansada, ele entende e se vai. meu dia se resume a cochilar e amamentar meu menininho agora.

Quando a noite chega eu mal consigo me manter de olhos abertos. Não imaginei que fosse tão cansativo ser mãe, mas quando seguro meu filho, uma felicidade enorme preenche o meu coração.  minha vida agora se resume a ele, e mesmo eu sentindo a falta do Miguel, não lhe telefono.

A vida é feita de escolhas mesmo e o Miguel tem deixado claro que não quer ficar perto. dói reconhecer isso. choro sentindo sua falta e acabo dormindo tomada pelo cansaço.

O dia amanhece, depois de minha higiene e a do meu bebê o levo para tomar um pouco de sol no jardim. ainda é cedo, minha mãe fica ao nosso lado. quando começa a esquentar, entramos em casa novamente e ela o leva para o berço. tomo café da manhã com meu pai e conversamos um pouco. quando acabo, volto para o quarto do meu filho. me deito novamente, quando penso em cochilar ele começa a chorar desesperado... me levanto e o pego no braço. canto baixinho e ele se acalma. troco sua fralda e o amamento, quando ele adormece o coloco no berço.

Minha mãe aparece no quarto e me avisa que tenho visita, antes que eu pergunte quem é, o Miguel aparece na porta acompanhado dos pais, que trazem embrulhos coloridos nas mãos. recebo os abraços e os presentes... Eles olham o neto com carinho e admiração.

O Miguel se mantém distante.. não me aproximo e ele parece não se importar. suspiro frustrada... como posso amá lo tanto e ele me esnobar dessa forma tão evidente e fria?

Meu sentimento por ele ainda é muito forte, mas estou tão magoada por suas atitudes. ele se mantém longe de mim enquanto eu luto comigo mesma para não ir até ele e abraçá-lo. isso é tão desgastante!

A Dama Do TráficoOnde histórias criam vida. Descubra agora