- Continue correndo, Arthur! Vamos lá...corra direitinho! - repetia a voz meiga da mulher que batia palmas discretamente, para incentivar o pequeno vampiro a saltar por cima de armadilhas para ursos ao longo de um trajeto semelhante a uma corrida de obstáculos moderna.
A criaturinha obteve êxito por algumas tentativas mas, ao perder o fôlego devido ao excesso de repetições, finalmente fora capturado pelo tornozelo direito. A armadilha fechava-se quase que de forma absoluta em torno de sua perna pequenina e rechonchuda; a dor era pungente, o que lhe arrancou lágrimas.
- Está doendo! Está doendo!
- Acalme-se, Arthur...Está tudo bem, não chore... - a mulher o abraçava, confortando-o - Mamãe está com você...
Naquele tempo, Arthur Seingalt ainda pensava que era uma criança normal. Mas...
- Humana, eu posso fazer uma pergunta?
- Eu já disse que pode me chamar de "mamãe", Arthur. "Humana", não. É feio chamar a mãe dessa forma.
- Desculpe-me, hum...mamãe. Posso fazer uma pergunta, ma...mãe?
- A pergunta que quiser, Arthur.
- Por que a senhora não come sangue?
A mãe mostrou-se surpresa diante da simplicidade dessa pergunta. Quase se sentiu grata por ter sido apenas essa a curiosidade do pequeno. Chegou a sorrir de alívio:
- Ora, querido...isso não tem importância. Eu não gosto, apenas isso.
- Então, por que eu não consigo viver sem comer?
- Já terminou sua janta?
- ...sim...
Arthur já conhecia os modos da mãe a ponto de compreender quando uma conversa não poderia ser continuada. Obediente como nunca deixara de ser, não insistira no tema anterior. Depois de colocar as roupas de dormir na criança, a bela mulher o acomodara num caixão apropriado para o seu tamanho reduzido.
- Eu quero dormir na cama com você, humana, quer dizer, mamãe.
- Não, Arthur. Você deve se acostumar ao seu tipo de acomodação, assim como eu também estou treinando você para que possa se defender sozinho no mundo lá fora, quando tiver que caçar suas próprias presas para comer - ela disse de maneira sombria, olhando para o machado que usou para cortar a cabeça da vítima com que alimentara seu filho.
Os membros superiores da vítima jaziam ao lado do fogão a lenha; ela literalmente as descartava um pedaço por dia, dentro do que conseguia carregar.
- Teremos que sair daqui em breve. Você deve estar sempre pronto para fugir, Arthur. Entendeu?
- Se ele estivesse aqui, estaríamos protegidos.
- Arthur...nós conseguimos ficar sozinhos até agora, não conseguimos?
- Sim...
- Eu não tenho conseguido comida para você? Então, você há de concordar que não precisamos dele aqui.
Ela se referia ao patriarca dos Seingalts, que Arthur era inocente demais para entender que não tinha uma relação nada boa com sua mãe.
- Mãe...a senhora disse que eu tenho irmãos. Quando irei conhecê-los?
"O destino de vocês é perder, porque tu és o mal, e o bem sempre vence."
A frase deixada por Martinelli ficou solta no ar, invadindo os pensamentos de Helena e Arthur. A colocação tinha sentido: Helena mesma sempre ouviu falar dos vampiros como uma ameaça, algo a ser vencido sem piedade, e antes de Arthur Seingalt sequer considerava humanizá-los. Arthur, por sua vez, refletia sobre sua mãe e ele: sempre fugitivos, combatidos, odiados, os criminosos que tinham que se deslocar de um lado a outro assim que começavam a sentir dos demais o peso da desconfiança. Eram eles os caçadores noturnos que vez por outra iam para a floresta provocar alguma tragédia, arrancar dos braços de uma mãe um filho, e de seus olhos as lágrimas. O meio vampiro ainda conseguia escutar o barulho da velha saca de lona sendo arrastada pelo chão, quando sua mãe perdia as forças para agarrá-la nos ombros, com os restos mortais do filho desaparecido de alguma família numerosa da região. Dada sua força reduzida de jovem mulher, ela se via obrigada a decapitar crianças cada vez menores. Atraía-as com doces; Arthur conseguia se lembrar do seu processo de fabricação, e recordava também de que o gosto dos doces não lhe apetecia, mas o sangue das vítimas atraídas sim. Uma vez questionou a mãe ao ver uma dessas mulheres debulhada em lágrimas pelo sumiço do filho:
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Vampires will never hurt you
VampireHelena é sobrinha dos Lee Rush, uma tradicional família de caçadores de vampiros da Inglaterra vitoriana. Com apenas 16 anos, assume uma inusitada responsabilidade: servir como isca sedutora para monstros ávidos de luxúria e sangue. Por trás de tão...