Em 1997, Suzana Reis retornava para Maringá, depois de um fim de semana prolongado na casa de sua mãe em Cianorte. Para aproveitar cada segundo da rara oportunidade de passar tempo com a família, Suzana deixou para pegar a estrada o mais tarde possível. Já passava das onze horas da noite quando ela e o marido pegaram a rodovia 323.
Quando o sol raiou, o casal ainda não havia chegado em casa. Logo, amigos e familiares preocupados alertaram as autoridades. A polícia encontrou os destroços do carro de Suzana. Pouca coisa sobrara do automóvel. Os dois corpos ainda estavam presos às ferragens. Um policial mais atento encontrou algo que deixou todos intrigados. Na terra úmida de orvalho ao redor do carro, era possível notar pequenas pegadas humanas. As marcas pareciam indicar que uma criança teria deixado o carro caminhando. Mas esta hipótese levantava duas dúvidas: quem era criança, já que o casal não tinha filhos? E por que as pequenas pegadas pareciam se dirigir para o cemitério dos Caboclos?
O cemitério em questão fica no município de Paiçandu, no Paraná, com pouco mais de 34 mil habitantes região metropolitana de Maringá. Na verdade, trata-se de um muro em círculo, formado por pedras, com uma capela, um monumento e uma cruz no centro.
Situado às margens da rodovia 323, o cemitério foi criado em homenagem aos caboclos sepultados naquelas terras.
Segundo a lenda, vivia na região um famoso curandeiro conhecido por 'Pai Çandu', que deu nome ao município. Respeitado líder indígena, Pai Çandu era uma referência política entre as tribos da região durante a Guerra do Paraguai.
Quando os militares surgiram pedindo apoio das tribos contra as forças paraguaias, Çandu aceitou ajudar os homens brancos. Em troca, a promessa de reservas para seu povo viver em paz. As batalhas cruéis quase dizimaram os índios, mas o Brasil saiu vitorioso. Ainda assim, o exército brasileiro não cumpriu sua parte do trato.
Tomado de ódio, Pai Çandu proibiu que membros da tribo tivessem qualquer tipo de contato com os homem branco e levou essa regra ao extremo. Os filhos de índias com soldados brasileiros, os chamados caboclos, foram condenados à morte. Os corpos, muitos de crianças, foram enterrados em valas sem identificação por determinação do próprio Çandu.
Depois do massacre, as mães dessas crianças construíram o Cemitério dos Caboclos para as vítimas. Mas, de acordo com os moradores da região, as almas das pessoas ali enterradas jamais encontraram descanso.
Muitos acreditam que o local é assombrado e diversas histórias sinistras são contadas pelos moradores. Alguns dizem que vultos são avistados próximo ao cemitério e outros relatos contam que motoristas avistaram crianças andando pela margem da rodovia. Quando olharam pelo retrovisor, nada mais havia.
Vários acidentes de carro também aconteceram nas redondezas. Muitos acreditam que nem todos são frutos da negligência na direção.
O caminhoneiro Dorival Nunes Braga relata uma experiência perturbadora, ocorrida há quase dez anos. Dorival retornava de um frete quando passou pelo cemitério dos caboclos por volta da meia noite.
Nunes afirma que o rádio começou a emitir uma estranha interferência. No lugar dos chiados costumeiros da falta de sinal, a música parecia ser interrompida pelo som de gemidos. Um arrepio tomou-lhe a espinha e Dorival sentiu como se não estivesse só dentro da cabine.
Então, quando tirou a mão para tentar sintonizar o rádio, sentiu um puxão no volante que fez o caminhão trocar de faixa bruscamente, a ponto de quase tombar.
Sem dúvida, estava escuro dentro do caminhão. Sem dúvida, era uma noite nublada, no meio do nada. Dorival podia estar cansado. Sua mente poderia estar pregando peças. Mesmo sabendo disso tudo, ele jura de pés juntos para quem quiser ouvir: caso não tivesse tido a presença de espírito e a experiência de anos de estrada, não teria conseguido evitar o acidente. Mas, enquanto se ocupava em salvar a própria vida, jura ter visto o que parecia ser uma mão puxar o volante para baixo, desviando a rota do veículo. Uma mão pequena. Uma mão de criança.
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Brasil Sombrio
HorrorUma coletânea de histórias e contos sobre as assombrações mais conhecidas de cada estado brasileiro. Relatos que misturam medo e superstições com acontecimentos históricos, criando um reflexo do nosso país que é, ao mesmo tempo, fascinante e apavora...