Cachoeira de Angahy Pequeno - Aiuruoca (MG)

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Em 1983, Suzana Almeida Lima procurou as autoridades da cidade de Aiuruoca, no interior de Minas Gerais, para reportar um trágico acidente. Seu marido, Rubens Almeida Lima, desaparecera três dias. O corpo fora encontrado nas águas do Angahy Pequeno, um riacho com uma série de belas cachoeiras na região.

De acordo com a autópsia, Rubens fora vítima de afogamento. Uma fatalidade tragicamente comum na região de pedras íngremes e corredeiras traiçoeiras.

Mas esta era a questão que inquietava a viúva. Como seria possível que Rubens, o campeão do time de natação do corpo de bombeiros de Belo Horizonte, morrer afogado num rio?

O delegado da região tentou acalmar Suzana, afirmando que mesmo os atletas profissionais sofrem de caibras e são vitimados por acidentes.

Não satisfeita, a viúva resolveu investigar a morte de Rubens por conta própria. Da próxima vez que o delegado a encontrou, seu corpo inerte jazia no aço frio da mesma mesa do IML que recebera o corpo do marido dias antes.

Para nosso cérebro sedento de causalidades, muitas vezes é impossível aceitar a imprevisibilidade da vida. Tem que haver um motivo, uma causa, uma explicação.

Superstições e misticismos são parte da experiência humana. Por mais que os céticos contestem tais manifestações, a busca por sentido faz com que pessoas procurem o sobrenatural para explicar o aparente acaso da existência.

Durante o império e a maior parte da velha república, Minas Gerais foi um dos Estados mais poderosos do Brasil.

Desde 1700, quando o jesuíta Codeo fez em seu mapa a menção à região do Quadrilátero Ferrífero como Minas Gerais dos Cataguás, o Estado passou a responder por quase 50% da produção de minério do Brasil. Ferro, ouro, diamante, fosfato, zinco, alumínio e tantas outras riquezas passaram a ser extraídas daquela terra através das "minas gerais".

Infelizmente, o passado do Brasil é marcado por uma chaga que ainda reverbera nas relações sociais: Minas Gerais fez pleno uso de escravos nas atividades extrativistas.

Se hoje em dia, com a tecnologia e a preocupação com a segurança dos trabalhadores, a profissão de minerador é uma das mais perigosas do planeta, imagine as condições sob as quais os escravos eram submetidos a trabalho forçado no início do século XVIII.

Vistos pelos senhores como meros instrumentos de trabalho, os escravos mineiros tinham baixa expectativa de sobrevivência. Muitos morriam de desidratação, doença, atacados por animais selvagens, quando não eram esmagados por deslizamentos.

O nome do rio Angahy nasceu de uma dessas tragédias corriqueiras da época. Conta-se que havia uma mina de ouro particularmente produtiva na região. O bastante para que os capatazes e capitães do mato passassem a desviar parte das extrações em benefício próprio.

Não demorou até que o dono da mina descobrisse que estava sendo roubado e ordenou que todos os escravos que frequentavam aquela mina fossem afogados no rio.

Um a um, os capatazes executaram os escravos. Os mais fortes foram nocauteados com pedradas e jogados no rio. Os mais fracos, simplesmente tiveram os rostos mergulhados na água até que parassem de se debater. Ao final de dias de execuções, mal se viam as águas, tantos eram os cadáveres boiando na superfície.

A última tribo indígena da região relatou que um exército de mortos despencara da cachoeira local. Por isso, batizaram o rio de Angahy, o Rio das Almas.

Séculos depois, a cachoeira do rio Angahy pequeno ainda é vista como amaldiçoada pela população da cidade. A bela localidade, que chega a atrair turistas e outros viajantes, não é tão apreciada pelos moradores de Aiuruoca.

Muitos desconhecem seu histórico sinistro, mas sentem as energias negativas que sondam aquelas corredeiras. Não é incomum ouvir o som de batidas metálicas que parece emergir das águas. As vezes, até mesmo gritos e lamentos de dor ecoam por entre as corredeiras.

Em 1975, duas crianças foram levadas ao pronto-socorro da cidade. Os irmãos de 7 e 10 anos apresentavam ferimentos nos braços e pernas. O pai afirmava que tinham caído do alto da cachoeira. O mais velho não resistiu aos ferimentos e um exame mais detalhado do corpo revelou marcas de dedos adultos ao redor do braço. Uma prova forense que colocaria o pai na condição de suspeito de assassinato, não fosse o filho sobrevivente jurar sua inocência.

Na década de 90, as amigas Mônica e Jussara relataram terem sido atacadas enquanto nadavam na cachoeira. Segundo as adolescentes, algo havia lhes puxado os pés debaixo d'água. Primeiro, julgaram se tratar de uma cobra, ou talvez um peixe grande, e o susto foi grande o bastante para que ambas deixassem o local às pressas. Somente mais tarde, quando os hematomas se consolidaram, as meninas constataram que as manchas arroxeadas nos tornozelos tinham a forma de mãos.

Ainda hoje os moradores de Aiuruoca evitam a cachoeira de Angahy. Apenas os mais destemidos se aventuram pelas matas do entorno e, aqueles que o fazem, raramente vão desacompanhados.

Rubens era um homem atlético, de formação militar e coragem reconhecida por amigos e familiares. Mesmo ele não ousaria frequentar as margens do rio sozinho. No dia de seu desaparecimento, no entanto, quis a sorte que um chamado de emergência o levasse até a cachoeira.

Uma família local reportara que o gato de estimação estava preso numa árvore na entrada da floresta. Rubens, ciente do dever de militar e dedicado protetor dos animais, foi de bom grado atender ao chamado.

Como um atendimento tão corriqueiro se transformou num acidente trágico é difícil de dizer. Alguns alegam que o gato teria fugido em direção à floresta. Ou que algum barulho metálico o teria atraído até o rio.

São teorias plausíveis que explicam o que levou Rubens até a água, mas não dão conta de um particular detalhe da sua trágica morte.

Os hematomas na sua perna, em forma de dedos humanos. Marcas semelhantes as encontradas na perna de sua falecida esposa, exatos sete dias depois. 

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