Capítulo XII

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*Atenção: este capítulo pode conter gatilhos relacionados a abusos. Leia com responsabilidade.


Quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Noite, 19h31

Eles, Eldric e Harley, não conseguiram comer depois da autópsia, não se dispuseram a falar, cada um ficou em sua própria mente, sabendo que o caso conseguia se tornar pior cada vez mais, porque é incoerente de se pensar que a crueldade do homem pode ter limites; na verdade, o que torna o homem tão perigoso e horrendo é esta falta de limite, que descarrega toda a sua brutalidade.

Tentando não parecer estranhos — ou ao menos normal o bastante para serem confundidos como um casal qualquer — os detetives foram para um hotel, o qual nem se importaram em pegar o nome, pagando por um estadia e subindo desconfortavelmente pelo elevador, que iluminava a magreza de seus rostos, o modo como, em ambos, as bochechas pareciam fundas e as olheiras transformavam os olhos em pequenas covas.

Depois, caminharam para o quarto. Poderiam ter pedido por duas camas de solteiro, era verdade, porém eram tantas coisas que passavam por seus pensamentos que dormir juntos ou não pareceu um problema esquecível, assim como acender a luz do aposento, o qual Harley iluminou depois que Eldric havia entrado; cabeça baixa, pés arrastando.

— Havia trevas sobre a face do abismo; E disse Deus: Haja luz! — recitou ela em escárnio sem saber ao certo se o versículo era apenas aquilo.

No quarto, tem uma cama de casal razoavelmente grande no centro do cômodo, com um piso de madeira, além de uma pequena mesa ao lado dos travesseiros, que sustentava um abajur amarelado e também o menu do hotel, o qual a detetive apanhou assim que retirou seus saltos, sentindo Eldric simplesmente caindo sobre as colchas.

A mulher correu os olhos pelas opções, notando que havia preços específicos para as bebidas no frigobar, o qual estava em sua direção oposta e ela só pode ver quando olhou por sobre o ombro. As garrafinhas de vodca não foram o suficiente para o dia todo e o que ela mais queria, naquele momento, era não se lembrar de nada, era escapar de seu próprio corpo e abster-se de toda a ruindade por um único segundo.

Porém Harley percebeu que isso não era possível em doses tão pequenas assim que leu "costelas de porco" no cardápio e o som dos ossos de Ursel sendo partidos ressoou tão claramente em sua memória que pareciam estar sendo quebrados naquele exato instante.

Ela bateu a capa do cardápio com força e depois largou-o sobre a mesa, enfiando as mãos sobre os cabelos, sentindo o modo dolorido com que os dedos se enroscaram nos nós.

— Sabe que temos que conversar sobre o que aconteceu, não é? — perguntou ela olhando para ele, vendo como Eldric mantinha-se quieto, envolto em uma névoa particular de tristeza e fúria em uma tentativa de afastá-la.

Harley pegou-se surpresa ao ver que estava no outro lado da situação, agora, já que era ela quem geralmente buscava distância das pessoas. No entanto ela se preocupou com ele, de verdade, como não fazia com alguém havia muito tempo, e por isso continuou:

— Não precisamos falar sobre o caso...

— Só sabemos falar sobre o caso, Harley — retrucou ele ao interrompê-la, a voz emanando calma, aveludada, como um sussurro exaurido de qualquer vontade.

A detetive engoliu em seco.

— E há algo a mais que você queira conversar? — Ela decidiu abordar aquilo de maneira diferente, deixando que ele guiasse o assunto, porém Eldric era tão esperto quanto ela, de tal forma que respondeu:

Passado Perverso (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora