Capítulo XV

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Sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Tarde, 13h01

Assim que Elena terminou de contar aquilo, as tiras de peixe frito se remoeram dentro do estômago de Harley e um ácido subiu por seu peito, queimando-a de dentro para fora conforme o respirar se condensava.

— O que houve depois? — questionou a detetive sem reconhecer a própria voz, que pareceu travar em sua garganta.

Leonard Hargroove era um garoto de quinze anos bizarro, ela sabia disso, mas apesar de sua esquisitice e excessiva religiosidade, Haley não pensou que o garoto fosse capaz disso. Mas, realmente, todos somos capazes de tudo, ainda que neguemos.

— Eu... não contei ao Paul, o que houve... — Elena manteve a linha de seu olhar contra os seios da mulher, agora, mas não realmente os vendo, a mente divagando perante as memórias daquele dia. — Não havia motivo...

— Não havia motivo!? — Harley sustentou seu tom mais calmo, porém incisivo na medida certa.

— Eu só queria um tempo para pensar, colocar a mente no lugar e... ver o que era melhor...

A detetive uniu duas falas da mulher em sua mente e, assim, perguntou:

— Vocês dois brigaram porque ele descobriu a faca debaixo de seu travesseiro, não foi?

— Sim... foi por isso — admitiu conforme esfregava o nariz com o dorso da mão. — Ele encontrou a faca, e gritou comigo... perguntou se eu estava louca, se eu tinha... medo dele... — A hesitação antes de completar a frase fez Harley engolir em seco. — Eu não tive escolha senão contar a verdade.

Harley franziu o cenho e voltou a se sentar, ainda que de lado, pronta para se erguer se fosse preciso, as pernas cruzadas e os braços apoiados na mesa.

— Ele não reagiu bem a ela, não foi?

— Eu nunca realmente contei a Paul sobre a traição com Dariel, depois que me separei, mas... algo dentro de mim diz que ele nunca acreditou que Ursel era seu filho.

— Não?

— Não. — A negação veio carregada de pesar. — Acho que há um certo limite para até onde alguém acredita em uma mentira, Haley... e nós dois começamos nossa história baseada em uma... na traição... — Seus olhos ergueram-se para os da detetive. — É difícil uma história dar certo se já começa errada.

Houve alguns segundos de completo silêncio, como se a casa estivesse envolta por uma cúpula que a separava dos barulhos do exterior, antes que a Sra. Hargroove prosseguisse:

— Por isso eu não deveria ficar tão chateada por ele não ter ligado tanto para a morte de Ursel... afinal, o filho não era dele, mas me machuca, sabe?

A detetive estreitou o olhar.

— Vocês falaram sobre Ursel ou Leonard, Sra. Hargroove?

— Os dois — explicou. — Primeiro pensei que pudesse ser Ursel atrás da porta, mas era tolice. Ainda assim, contei isso a Paul, e ele me mandou ir ao médico pegar remédios mais fortes, porém... não suportei quando ele sugeriu que eu fizesse o mesmo com Leonard.

Harley ergueu seu rosto.

— Ele queria drogá-lo?

— Nas palavras dele, nesta manhã, "drogá-lo e mandá-lo para o quinto dos infernos de um hospital!". — Elena sorriu com tristeza e os lábios tremiam ao fazê-lo. — Mas eu não o posso culpar, posso?

A detetive não soube responder.

— Afinal, quem gostaria de viver embaixo do mesmo teto de um assassino?

Passado Perverso (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora