CAPÍTULO 10 | A GATINHA DO QUARTO AO LADO

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   Com o frescor da minha chegada ainda no ar, meu plano para moldar a personalidade de Bastien já estava em curso. Não conseguia compreender a ideia de suportar por muito tempo suas oscilações de humor. Em um momento, ele se mostrava como qualquer pessoa normal, mencionando a falecida esposa. No outro, tornava-se provocativo, ignorando a privacidade alheia. Outra hora reinava a ignorância... Viver com alguém assim era simplesmente preocupante.
   Sentindo a necessidade de relaxar um pouco, optei por tomar um banho. Mais tarde, ao relembrar, percebi que havia trazido comigo as cartas que costumo escrever para Rael. Li algumas delas e as guardei novamente. No total, eram mais de 50 cartas que já havia escrito para ele, mas nunca as entregava e nem conseguia jogar fora, apenas mantida elas ali, guardadas comigo.
   Rael era aquele por quem eu nutria sentimentos. Estudamos juntos desde o ensino fundamental até o médio. Ele nunca me viu de outra forma senão como amiga, enquanto eu mantinha em segredo uma paixão desde os 13 anos. Desde então, escrevia cartas expressando meus sentimentos por ele e como me sentia quando estava perto dele. Ninguém, nem mesmo Madeline, sabia da existência dessas cartas; ela apenas sabia que eu o admirava.
   Era aproximadamente dez horas da noite e já havíamos jantado. Na sala de jantar, éramos apenas eu, Sarah e os empregados. Estela me contou que, desde que a esposa partira, Bastien nunca mais compartilhara uma refeição naquela mesa. Sempre pedia para que levassem a comida ao quarto ou saía para comer fora. Estela também mencionou que por isso achou estranho vê-lo almoçar conosco na mesa, já que há quatro anos ele não o fazia e esta noite, resolveu jantar em seu quarto.
   De volta aos meus aposentos, sentei-me à escrivaninha e comecei a organizar minhas planilhas e afazeres da semana diante do computador.

[...]

~Bastien

   Enquanto estava imerso em uma conversa telefônica com uma amiga, fui interrompido pelo som de alguém batendo à porta do meu quarto.

- Desculpe o incômodo, senhor Speer... mas vim perguntar se amanhã é o mesmo horário. Sarah está complicando um pouco as coisas - anunciou Maria, com delicadeza.

- Preciso desligar, meu bem. Até mais! - encerrei a ligação e abaixei o telefone. - É o mesmo horário, Maria. Mande Sarah vir até aqui.

- Sim, senhor.

   Minutos depois, Sarah entrou no quarto, os braços cruzados.

- O que foi? - perguntou, tentando manter uma postura serena.

- Por que está tornando tudo tão complicado, Sarah? - questionei, com calma.

- Você sabe que eu odeio aquela professora, Bastien! - ela retrucou, com raiva fazendo aquela serenidade falsa ir embora.

- Eu também não sou fã de alguns funcionários, mas isso não me impede de ir todos os dias trabalhar.

- Sério mesmo, você é o chefe! - sua irritação só aumentava.

- Tudo bem, você está certa... - eu sorri. - Mas veja, você não pode faltar à escola toda vez que ela for a professora que ministra as aulas. Por que não gosta dela?

- Desde o primeiro dia ela pegou no meu pé e isso é só o primeiro mês, imagine pelo resto do ano? - ela exclamou.

- Ei, acalme-se! Se você for à aula, prometo ir à escola esta semana e falar com sua professora.

- Está bem, vou fazer um esforço... - disse já entendendo que eu não desistiria até que ela mudasse de ideia. - Boa noite, Bastien - ela finalizou, saindo do quarto.

   Eu já havia sido aluno. Também tive um professor que pegava no meu pé todos os anos, então compreendi o quanto isso era desagradável.
   A respeito do trabalho, eu finalmente estava mais tranquilo. Não precisaria trabalhar tanto nem me estressar demais, pois agora tinha alguém para cuidar desses assuntos por mim, a gatinha do quarto ao lado. Pude finalmente parar de pensar sobre isso um pouco, deitei-me e, com um simples gesto, as luzes se apagaram.

A Sinfonia de BastienOnde histórias criam vida. Descubra agora