CAPÍTULO QUATRO :Quando me falaram que o internato era mal-assombrado

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— Havia um menino... um menino não! Um rapaz. Um Homi já feito. Ele e o pai dele eram donos do circo mais conhecido da região. Todo mundo ia assistir as apresentações do circo. O rapaz era o palhaço, mas ele não era um palhaço qualquer não. Ele era o palhaço mais assustador de todos! Ele era meio louco o coitado, sabe? Enquanto o pai dele era o mágico, o menino fazia palhaçada daquele jeito dele. Tudo ia bem. O circo tava fazendo sucesso. Eles viajavam pra tudo qualquer canto. De norte ao sul do país. Saíram até em um jornal grande da capital! Mas aí aconteceu. O pobre infeliz do garoto cresceu os olhos pra cima da filha do coronel da cidade vizinha, pode uma coisa dessas? Se apaixonou por ela. A moça era granfina. Era parecida com 'ocê. Ela era meio loirinha tipo 'ocê, andava toda estabanada com os cabelos esvoaçantes, o nome dela era Melissa. O menino ficou louco por ela. É claro que isso não ia terminar bem. A loirinha dos zoio azul ficou arrastando as asinhas pra ele também. O pai dela ficou uma onça! Jamais ia deixar a filha casar com um palhaço. Então ele proibiu o namoro dos dois. Ela até que aceitou, mas ele... Hum... Ele não aceitou muito bem isso não. E como ele já estava mancomunado com uns comunistas ai da cidade não deu outra! Aí teve aquela noite..., mas não foi a noite do desastre. Foi outra noite. O rapaz resolveu zombar dos militares no meio do espetáculo! Pode uma coisa dessas? Começou a falar mal dos militares, do presidente, dos Estados Unidos... Vish! Foi um escândalo! Não deu outra. Todo mundo sabe o que acontece com quem fala mal do governo. A gente pode fazer tudo. Ficar até tarde na rua, ir no cinema, namorar bastante, mas a gente não pode falar mal do presidente. Não pode mesmo. Isso nunca. E o menino fez isso. Ele se deu muito mal!

— O que aconteceu com ele? — eu perguntei curiosa.

Dona Lurdes se aproximou de mim ao perceber que todos da lanchonete observavam atentamente a nossa conversa.

Então ela começou a sussurrar no meu ouvido, bem baixinho mesmo. Era como se ela estivesse com medo.

— Botaram fogo no circo. Todo mundo morreu queimado. Foi um horror! Eles esperaram o espetáculo terminar e botaram fogo lá. Armaram tudo certinho pra aparecer que foi acidente, mas a gente sabe que não foi. Todo mundo morreu. A bailarina, os animais, o trapezista, a mulher barbada, o mágico... Todos foram se encontrar com São Pedro mais cedo, menos o palhaço. Ele continuou vivo, mas ele não era mais o menino bonito com o rosto gentil. Ele era um monstro! Seu rosto ficou todo deformado! Queimaduras horrorosas! Quando o rapaz saiu do hospital ele ficou com sede de vingança. Parecia até protagonista daqueles filmes do Billy The Kid. Então, ele foi até o internato onde a moça que era filha do seu inimigo estudava. Ele então descobriu um jeito de se vingar do coronel.

—O que ele fez? — indaguei mais curiosa ainda enquanto apoiava os meus dois cotovelos no balcão.

— Matou a moça e se matou. Mas parece que o espírito dele nunca encontrou descanso. Logo depois dessa tragédia, boatos começaram a crescer e hoje a gente sabe que o espírito dele vive dentro das paredes do internato, infernizando a vida de todo mundo. Essa é a história. Não é mentira não. São apenas os fatos — Ela deu de ombros.

— Eu não acredito muito em fantasmas — falei, mas a minha voz não saiu tão confiante. A vida já era difícil. Eu já estava em um lugar totalmente desconhecido. Não queria complicar ainda mais a minha vida pensando em fantasmas. Mesmo sabendo que eles podiam ser reais.

— Bom, isso aí é problema seu, mas não diga que eu não avisei — resmungou bem alto. — Além do mais, essa cidade... Logo, 'ocê vai perceber que essa cidade é estranha. A gente tem de tudo aqui. Lobisomem, Mula sem cabeça, Bruxa e o diabo do Homem Mariposa. É o demônio da cidade, sabe.

Me inclinei para trás e encostei minhas costas no pequeno encosto do banco. Eu não queria ser mal-educada. Dona Lurdes havia sido tão legal comigo naquele dia. Ela era dona da única lanchonete da cidade.

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