CAPÍTULO DOZE :Encurralada

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Não falei para ninguém sobre o que aconteceu na piscina. Saí do prédio atordoada com vários pensamentos me assombrando. Monstro. Ele me salvou. Como isso aconteceu? E por que ele pulou na piscina para me resgatar?

É claro que ele havia sido o motivo de eu ter caído na água. Assim que eu vi o seu rosto no reflexo, meu coração pulou do meu peito e eu fiquei um pouco tonta. Quando vi já estava quase afundando, respirando com dificuldade. Por um momento eu pensei que eu fosse morrer. Pensei mesmo que ele me deixaria ali com a água enchendo os meus pulmões, mas não, ele pulou e me tirou de lá. Suas roupas ficaram tão encharcadas quanto as minhas. Isso acabou me fazendo pensar em algo impossível. Talvez bem maluco, mas eu não era tola o bastante para achar que fantasmas se molhavam.

Monstro não é um fantasma.

Monstro é real.

Monstro nunca morreu.

Monstro agora vive escondido em algum lugar do internato.

Monstro com certeza teve a ajuda de alguém.

Monstro teve ajuda do padre Lazaro.

Por que Monstro vive no internato com tantos outros lugares para se esconder?

Esses pensamentos me atormentaram o dia inteiro. Tive que inventar uma desculpa para irmã Madilte. Eu disse a ela que caí na piscina sem querer e que estava um pouco cansada e que por isso precisava ficar aquecida no meu quarto durante o resto do dia. Ela franziu o cenho e não acreditou muito na minha história, entretanto, irmã Judith, que era uma espécie de irmã enfermeira me deu aval para que eu pudesse descansar o resto do dia. Ela também me disse que logo iria até o meu quarto me levar uma xícara de chá e um pedaço de bolo de fubá. Agradeci e subi até o quarto onde fiquei me atormentando durante todo o dia. As meninas ainda não haviam voltado o que me deu uma certa privacidade. Eram tantas ideias passeando na minha cabeça. Primeiro era a minha mãe. Eu não tive notícias dela deste que cheguei no internato. Não consegui falar com ela por telefone e a cada dia que passava temia ainda mais pela sua vida. Segundo, eram aquelas estrelas de papel, a primeira estava destinada a Anita e a segunda era um aviso para mim. Monstro queria que eu fosse embora, mas por quê? Eu nem o conhecia? Não fazia nem uma semana que eu estava no internato, por que ele queria que eu fosse embora dali? Argh! Estava começando a odiar aquele lugar. Queria mais do que nunca estar na minha casa longe dos problemas. Longe do Monstro e daqueles olhos cinzentos dele que me encararam na piscina de um jeito tenso e assustador.

Mordi os lábios pensando em cada uma das hipóteses que eu pensara, mas não consegui chegar a nenhuma conclusão. Tentei então não pensar nele, mas era impossível esquecer aqueles olhos por baixo daquele saco de estopa.

Todas as meninas me inquiriram sobre o meu desaparecimento a tarde. Eu disse para elas o mesmo que eu havia dito para as freiras. Apenas Anita pareceu desconfiada, mas eu a ignorei. Anita nunca acreditava em nada do que eu dizia. Por que Monstro mandaria uma estrela para ela?

Eu tentei dormir. Até que consegui por algumas horas. Tive um sonho interessante. Na verdade, não era um sonho, mas sim uma lembrança. Eu e a minha família estávamos almoçando em uma vinícola de vinho no interior do Rio Grande Do Sul. Meu pai era gaúcho e mesmo sendo órfão ele sempre fazia questão de se lembrar das suas origens. Eu tinha treze anos. Sentamos em uma mesa bonita cercada de carne, polenta e vinho. A vista era esplêndida, verde com várias árvores e um pequeno riacho nos circundando. O ar fresco, o cheiro de churrasco e a música típica embalavam o nosso almoço naquele dia ensolarado de verão. Meu pai estava feliz. Ele sorria e ria como uma criança enquanto a minha mãe o enchia de beijos e repousava o seu rosto no ombro dele. Aquela era uma lembrança feliz. Uma das poucas:

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