Capítulo 29 - Exponencialmente [2]

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- Eu comprei uma lembrancinha para você. Está na minha mochila, vou buscar – Júlia tentou se levantar da cama, mas foi puxada por Alex. – O que você está fazendo?

- Fica mais um pouco aqui – Alex beijou suavemente os lábios de Júlia que fechou os olhos e se entregou.

- Já estamos há horas nessa cama, preciso esticar meu corpo e precisamos nos alimentar. Nem lembro a última vez que comi. – Após mais alguns beijos Júlia se soltou dos braços de Alex e se levantou com um pulo.

- Eu me lembro – Alex piscou com um sorriso maroto e Júlia lhe deu um beliscão.

- Safada! Eu vou fazer alguma coisa para comermos, depois voltamos para cama – Júlia correu antes que Alex a conseguisse segurar.

- Não demore – Alex disse fazendo bico.

- Abra minha mochila e pegue um pacote em uma embalagem vermelha no fundo, é um agradecimento por ter cuidado do Paçoca enquanto eu estava fora.

- Não precisava se incomodar, já disse que é um prazer cuidar do Paçoca. Ele e o Shoyu pareciam duas crianças brincando juntas.

Alex levantou-se da cama esticando os braços e apanhou a mochila de Júlia que estava jogada ao chão, próxima as roupas das duas.

- No bolso de fora? – Alex perguntou abrindo o bolso menor da mochila de Júlia.

Enquanto procurava o pacote, Alex encontrou um envelope gasto. Seu coração disparou ao tocar aquele papel. Lembrava-se de cada palavra gravada naquela folha. Era a carta de despedida que escrevera e deixara para Júlia sem nenhuma explicação. Com cuidado desdobrou a folha e a leu.

"Essa é a última vez que escrevo para você.

Demorei muito para conseguir ter coragem de escrever no papel o que eu sinto. Eu devia ter feito isso antes que perdesse o controle e me descobrisse totalmente entregue aos desejos que sempre me levam até você. E quando me dei conta de que não sou eu, isso acabou comigo. Não sou eu que ocupo seus pensamentos. Não sou eu a pessoa que você escolheu.

Nessa altura eu já deveria saber que você nunca seria minha. E o que eu fiz? Insisti.

Insisti na esperança de que um dia você me quisesse tanto quanto eu te quis, mas hoje eu entendi que esperança é sinônimo de dor. A dor de saber que não te tenho. Nunca tive. Nunca terei.

Por que você disse que não me machucaria? Por que eu acreditei que em algum universo existiria a possibilidade de você sentir alguma coisa por mim? Alguma coisa que te fizesse ter coragem de ter uma vida ao meu lado, sem o fantasma do medo do que as pessoas vão pensar. Por que você me olhou por um instante enquanto eu te mirava por uma vida?

Eu não posso mais fazer isso, Júlia. Não posso fazer isso comigo.

Uma. Seu cheiro está em todos os cantos.

Duas. Aos poucos vou me livrando dele. Perdi as contas de quantos banhos já tomei desde que você me tocou pela última vez.

Três. Não quero que você pense que estou sofrendo.

Quatro. Eu tenho motivos para não estar bem?

Cinco. Seis. Eu te amo.

Sete. Não era amor. Eu me convenço. Exponencialmente.

Oito. Eu não te amo.

Nove. O Shoyu encostou a cabeça no meu colo e eu quase consegui sorrir outra vez.

Dez. Mas me lembrei da sua terrível mania de deixar que ele lamba seu rosto e quis chorar.

Onze. Chorei e agora você já não significa nada para mim.

Doze. Treze. Quatorze. Repeti isso algumas centenas de vezes na esperança de que fosse real.

Quinze. Agora é real. Você já não é mais nada para mim.

Você cortou o cabelo, fez as sobrancelhas e se depilou.

Dezesseis. Eu ri da sua revolta em não gostar de nada.

Dezessete. Você sempre gosta de tudo, adoro quando expressa sua irritação marota por alguma coisa.

Dezoito. Foi o número de vezes que vomitei ao pensar em você hoje.

Eu me odeio tanto por ter deixado chegar a esse ponto.

Tanto.

Me forcei a te esquecer. Dessa vez eu preciso.

Seu cabelo, sua depilação, seu sorriso.

Nada disso é para mim.

Nunca foi.

Dezenove. Nunca será.

Hoje eu sei. Vinte. Acabou. Acabamos.

Acabamos o que nunca existiu na mesma proporção.

Não me procure nunca mais. Eu farei o mesmo e esquecerei a grande e dispensável dor que foi ter conhecido você."

Alex leu as palavras carregadas de dor e mágoa e se assustou com a agressividade com que elas foram escritas. Júlia tinha razão em não confiar tão facilmente nela outra vez. Ela estava perdida em seus pensamentos, sendo tomada por uma sensação de angústia enquanto as palavras continuavam a rodar em sua frente que não reparou que Júlia estava logo atrás dela com o celular na mão e uma expressão de pânico no rosto.

- Alex – Júlia chamou baixinho.

- Júlia, me desculpa, eu encontrei essa carta e quando percebi já estava lendo – eu não sei o que pensar...

- Alex – Júlia a interrompeu e repetiu, dessa vez um pouco mais alto.

- O que? O que aconteceu? – Alex virou-se para Júlia e sentiu medo ao encará-la.

- Era a Natasha no telefone, seu pai teve um infarto – Júlia disse de uma vez, pois não tinha maneira mais fácil de entregar a notícia.

O céu em seus olhos - Romance Lésbico (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora