Escrever cartas é um antigo costume de minha família, algo que independente da passagem dos anos, as gerações mantêm, é por assim dizer o nosso modo de nos expressarmos, principalmente quando não conseguimos fazer efetivamente com a palavra falada. E era essa minha situação quanto a Rafaela, eu tinha muito que dizer, mas não conseguiria falar tudo da forma certa. É claro que era algo arriscado, sendo ela irmã do Nicholas, um ótimo escritor que certamente poderia usar melhor as palavras do que eu. Mas o fato do irmão dela escrever era uma vantagem para mim também, pois era certo que ela apreciaria uma carta. Algo que infelizmente já há algum tempo vem caindo em desuso pelo mundo. Os telefones celulares, e suas mensagens instantâneas roubaram a cena das cartas, apesar de não ter o mesmo charme, e tom romântico.
Não foi difícil colocar as palavras no papel, na verdade foi bem fácil, uma vez que estava repleto dessas palavras e sentimentos que ela fazia brotar em mim. O complicado foi decidir quando entregar a ela, por mais que tivesse conversado com o pai dela, e tivesse quase certeza que o Nicholas não enlouqueceria se soubesse do meu interesse na irmã dele, eu queria que fosse num momento que estivesse apenas nós. Quando pudéssemos focar um no outro, por pelo menos um minuto.
O resultado foi esse:
Não sei se há clareza em minhas palavras, talvez o sentido que desejo a elas fique apenas subentendido. Quem sabe eu não consiga usar as palavras de um modo natural, ou por não ser versado em rima e prosa eu já não consiga me fazer entender. Tudo que quero dizer eu não consigo!
Quanto sentimento um coração pode ter represado? De quantos momentos felizes é necessário pra construção solida do amor? Quais os caminhos devem ser seguidos pra encontrar a felicidade. Quanto tempo depois de ditas as palavras ainda estão carregadas de sentido, pra tocar o coração da amada.
Quem me dera ter o poder de transformar sentimentos em palavras, e as palavras em flores, então poderia eu plantar um belo jardim multicolorido como as cores que você acende em mim. E neste recanto de paz você teria porto seguro na vida, teria a liberdade de ser quem quer que deseje. E juntos vagaríamos pelas floridas alamedas ouvindo o cantar perene dos pássaros, deitados na grama admiraríamos o céu e suas belas nuvens. Sentindo o suave tocar do vento em nossos rostos, sentiríamos o doce gosto do ar com aroma de rosas e flores campestres. E a estes momentos daríamos o nome de vida!
Ah, se as palavras viessem a mim de gentil forma, e como amigas se entregassem a mim em rimas bem acordadas, então através de seus verbos, adjetivos e predicados eu poderia descrever os sentimentos que trago no peito. A música da vida ganharia novas e vibrantes notas e então em meu peito a paz e a felicidade faria morada. E a vida teria sentido enfim!
Não vou dizer que é uma carta que irá entrar para o rol das melhores epigrafes do mundo, talvez para as melhores do Brasil, antes que me ache convencido, eu estou apenas brincando. O mais importante era os sentimentos que tentei traduzir na carta, e acho que consegui. No dia seguinte eu iria visita-la em sua casa, e lhe entregaria a carta. Às vezes tudo que temos que fazer é arriscar um pouco.
Nunca sabemos o que surgirá do ato de tocar a vida de outra pessoa. Quais os caminhos que aquela alma trilhou e ficou marcado nela. Quando nos propomos a acessar outras vidas nos aceitamos o risco de ter a nossa própria vida acessada. E por vezes não estamos prontos para descobrir o trazemos nos recônditos de nós. Toda dor, e vivência que encontramos no outro, pode encontrar um eco em nós, às vezes até um par.
Desde que nascemos somos preparados para vivemos à vida com empatia, e amor. Aprendemos que quando encontramos uma real razão para amar alguém então teremos descoberto motivação de nossas vidas, e comigo foi exatamente assim, desde o primeiro momento que a vi, ainda no hospital soube que por ela viveria, e morreria. Que gastaria minha vida inteira para que seus dias fossem felizes, e cheios de realizações. Eu não pensava, e como poderia, que não teria tempo suficiente para vê-la realizar seus próprios sonhos. Mas mesmo hoje se for me dado à opção dou minha vida, para que ela possa novamente viver, e ter a chance de ser tudo que um dia ousou sonhar.
Tendo vivido meu longo período de luto decidi que deveria honrar sua memoria, ajudando a outras pessoas, e para isso me alistei no corpo de voluntários do mesmo hospital que ela tinha estado em seu último ano de vida. No inicio andar por aqueles corredores era extremamente doloroso, mas me consolava reafirmando para mim mesmo que ela aprovaria minha iniciativa, e com o tempo o prazer de ajudar tantas pessoas superou o receio de reviver tudo que tínhamos passado ali.
Uma nova vida se abria para mim, e eu tinha certeza que de onde ela estava feliz por minhas decisões.
Não sei quanto a vocês, mas meu coração dói em pensar que exista tanta dor no mundo, coisas que por mais que desejamos não podemos mudar.
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Grato por tudo.
Sempre juntos!
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Beijo de Inverno
Fiksi RemajaNem todos amores são a primeira vista. Alguns amores nascem com o tempo, a dor, e generosidade da vida. Quando Rafaela conheceu Harry, nada de especial aconteceu. Nenhum fogos de artifícios, nem frio na barriga. Borboletas não fizeram revoada em seu...