O estrondo da tempestade

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Poucos dias haviam se passado desde o casamento, o rei Juan andava de um lado para o outro atarefado com a complexa administração do reino, assim como a rainha Ana, que coordenava os preparativos para o festival de Lyfra, conversando com diversos vendedores que estavam reunidos no pátio em frente ao palácio

-Sua majestade, é uma honra á comunidade dos comerciantes prestigiar o festival mais uma vez!

Disse um dos burgueses, ele usava um fraque vermelho, e um grande chapéu de aba larga enfeitado com três ou quatro penas de pavão, e tinha um cavanhaque grisalho em seu rosto, os outros homens se vestiam de forma parecida

-É um prazer, senhor Henri

Respondeu Ana, fazendo uma brevíssima reverência ao barão

A rainha usava um vestido azul turquesa, com partes de sua saia em tecido branco, seu longo cabelo ruivo se estendia pelas costas, em seu pescoço repousava um grande colar de ouro e pedras preciosas com o formato da folha de Lyfra, a divindade mais importante do panteão. Uma sutil cicatriz no queixo quebrava a falsa impressão de delicadeza que seu semblante passava

Longe dali, Lillya estudava em uma cabana num acampamento militar na região rural da capital de Eterium. Mesmo em outro governo, ela ainda preservava sua patente militar de general, oque lhe garantia certa autoridade no exercito

-Alteza, as pessoas de que falou estão aqui

Disse um soldado logo depois de abrir a porta

-Diga pra eles entrarem

Respondeu a elfa, logo Camille, Aurum e Argentum entraram na cabana

-Ei Lil! vai participar do festival?

Perguntou Camille, os três estavam em roupas comuns, por mais que fossem militares assim como Lillya, a elfa fechou seu livro

-Não, não vou, pretendo ficar aqui mesmo

Respondeu a garota, Aurum pareceu inflar de insatisfação

-Mas como assim? Você não é religiosa?

Perguntou a jovem alada, Lillya balançou a cabeça em negação

-Sou fiel da lua, não de Lyfra, sem falar que não estou me sentindo muito bem...

Disse a elfa, a voz tremeu e falhou no fim da frase, e ela pôs a mão na barriga, que já evidenciava uma gravidez bastante avançada

-Não se estresse demais

Disse Argentum, de forma direta, sem se atrasar nas palavras, Lillya lhe respondeu com um aceno afirmativo de cabeça

-Eu vou ficar aqui no interior, talvez volte quando as festividades acabarem

Reiterou a elfa, sempre com um tom sério e pesado na voz, todos se despediram e os três foram embora, Lillya fez questão de olhar pela janela que separava a cabana do mundo exterior sem qualquer vidro, mas sim com bastões de madeira, vendo o grupo se afastar, ela pegou um copo que estava sobre a mesa e tomou o liquido quente, afastando a sensação de frio, sua garganta foi preenchida pelo amargor e o calor reconfortante do café, enquanto sua mente se perdia em pensamentos

Ela voltou á si, e retornou á ler o seu livro de paginas amareladas.

Muitas horas depois, já no cair da noite, a capital estava submersa numa aura de festividade, com música e gritos de alegria, crianças correndo e casais conversando, rodas de danças se formavam e pessoas se aglomeravam em grande festa

Milhares de diferentes plantas enfeitavam as ruas principais, formando corredores verdes, arcos de parreiras se localizavam na entrada das ruas, mas de todos os casais felizes da cidade, nenhum estava tão ocupado quanto o casal real

-Querido, precisamos ir logo!

Disse Ana, a rainha, ela usava um vestido tradicional com a cor simbolo do festival, o verde, em sua cabeça estava uma tiara de prata e pedras preciosas, e ela segurava um saquinho de pano em sua mão direita

Juan, o rei, estava sendo vestido por dois serviçais em seu traje militar, eles terminavam de colocar suas medalhas e afivelar seu cinto

-Já está acabando, amor, já estou indo

Disse o rei, logo os dois subiram em uma suntuosa charrete puxada por dois cavalos brancos, o rei estava sentado, e acenava para a população que se aglomerava em peso na praça central, por onde a charrete dava voltas

A rainha Ana pôs a mão no saquinho de pano, e atirou doces para as pessoas, as crianças se divertiam tentando pegar o máximo possível, algumas tão logo as pegavam, enchiam a boca, sujando-se com o chocolate

O charreteiro controlava os cavalos, fazendo curvas suaves em um grande circulo ao redor da praça

-Querida, você está maravilhosa nessa roupa

Disse o rei, Ana sorriu e riu, ainda atirando doces, ela pegou um deles e colocou na boca de seu marido, que comeu e sorriu de volta

Até que um rápido zunido parece cortar o ar, um grito é ouvido na multidão, e Juan parece prender a respiração

A rainha deixa os doces caírem, ela leva as duas mãos ao rosto e grita de pavor

Do peito do rei, se projeta uma flecha, cravada em seu torax

-Não!

Grita Ana, ela corre e tenta ajudar seu marido, que não consegue entender oque está acontecendo

Ela então cai por cima de Juan, dando mais um grito, dessa vez de dor e susto

Outra flecha se projeta de suas costas, ela coloca a mão em sua barriga, sentindo uma dor excruciante

Neste ponto a população está em panico, a gritaria e a correria se instalam, e em meio ao caos os guardas não conseguem chegar ao casal real

Outras três flechas são disparadas, uma acerta o abdomen do rei, duas acertam as costas da rainha

Labaredas são vistas em meio ao caos, guardas se esforçam para apagar, mas a confusão mata a velocidade, e o fogo se espalha, consumindo casas e tendas, a fumaça intoxica á todos, piorando ainda mais a ação

Um grupo de cerca de seiscentos homens de armadura de couro e barba longa parecem surgir vindos de fora da cidade, um deles crava um machado no ombro de um cidadão, outro rasga a barriga de uma mulher com sua espada, a multidão em pânico nada consegue fazer, se não correr para a morte

Os bárbaros que surgiram em meio ás chamas, homens do norte sem civilização, eles brandiam suas armas, gritavam e matavam sem remorso

Muitos foram pisoteados pela multidão, outros estavam já cobertos de sangue e fuligem, tossindo e rosnando

Os guardas conseguiram se reorganizar, e cerca de mil homens se dividiram em diversas paredes de escudo, que marcharam para os pontos de massacre, alguns poucos bárbaros ousaram enfrentar as formações, pulando em meio ás armas, sendo perfurados pelas lanças eterinas

Uma trompa foi ouvida ao longe, como um estrondoso trovão, e os invasores restantes correram para longe, sumindo na mata já fora da cidade, nenhum soldado era capaz de alcança-los em meio á fumaça

-General!

Gritou um soldado, Lillya então saiu de sua cabana, para então ver a massa negra de fumaça se erguendo  sobre a capital, o silêncio do medo se instalou entre os soldados.

A Coroa de CinzasOnde histórias criam vida. Descubra agora