Tem uma igrejinha branca, muito antiga, bem no alto da serra. Não é maior do que uma casa de um peão, mas era lá que meus bisavós costumavam ir antes de ser construída uma substituta na baixada. Essa, sim, era muito mais acessível e comportava uma quantidade razoável de fiéis.
Hoje, aos cinquenta e seis anos, ainda me lembro daquele dia, quando era menino e visitei aquela igreja à procura do cemitério em que meus pais estavam enterrados. Meus avós me contaram que eles haviam contraído tuberculose e assim como várias pessoas da cidade, foram obrigados a se isolar na igreja até a morte. As pessoas da cidade nem sequer aceitaram que seus corpos fossem trazidos para o cemitério comum, com medo de contaminação.
Como garoto católico, que carregava uma imagem de Nossa Senhora Aparecida no chapéu, eu prometi que rezaria pela alma dos meus pais. Então, um dia, subi a serra à cavalo, deixei o animal amarrado sob a sombra de uma árvore e entrei na igrejinha. Havia apenas três bancos de cada lado e estavam cheios. Não cabia mais do que trinta pessoas ali dentro, mas elas se aglomeravam, com os joelhos no chão a zumbir orações.
Fiz o sinal da cruz diante da imagem de Nossa Senhora e de Jesus crucificado e me ajoelhei também para rezar por meus pais. Como o lugar estava cheio, no entanto, não consegui me concentrar.
As pessoas ao meu redor rezavam alto e me atrapalhavam a recitar as orações decoradas no catecismo. Desisti, me levantei e decidi procurar o tal cemitério. Queria achar os túmulos dos meus pais.
Assim que estava saindo, encontrei um homem na porta. Pelas vestes, deduzi ser o padre.
— Que está fazendo aqui, menino? — Ele perguntou assustado.
— Vim rezar.
— A igreja está fechada.
Estranhei.
— Mas tem um monte de gente aí, senhor. — Me virei para mostrar à ele, e todas as pessoas que antes rezavam, estavam agora de pé, com os olhos arregalados e vidrados em mim.
O padre puxou a porta com força e passou a chave. Seus dedos tremiam.
— Padre, quem são eles? Onde fica o cemitério?
Ele me encarou com o rosto completamente pálido.
— Não vê que acabou de sair dele?
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Histórias estranhas
HorrorColetânea de contos curtinhos de terror e mistério com finais inesperados