Capítulo 9

532 38 1
                                    

Deixando de lado seu livro de gravidez e uma lata vazia de sorvete de morango, Olívia  encolheu embaixo das cobertas e ficou olhando a lareira branca. Ela ouvia a chuva forte caindo na janela do quarto. Dias de sol, noites de chuva. Ouvindo o estalar do fogo e o vento soprando fora, fechou os olhos e recostou a cabeça sobre o travesseiro de Ian.
Que tarde estranha.
Depois do ultrassom, Ian a levara para fazer compras, insistindo para que ela levasse tudo que tornasse sua estadia mais confortável. Na verdade, ele realmente gostou da tarde que passaram juntos. Ele flertara com ela. E ela se viu flertando de volta.
Depois, já no meio do jantar à luz de velas, servido pela empregada, quando ela estava em seu segundo prato de lasanha com brócolis cozidos, Ian recebera uma ligação telefônica. Sem qualquer explicação, ele beijara a têmpora de Olívia, e a deixara jantando sozinha!
Olhando o fogo, ela imaginou quem teria ligado para ele.
Graças a Deus que ela tivera o bom senso de recusar seu pedido de casamento. Ele só estava aliviando sua culpa, fingindo fazer a coisa certa. O que ele teria feito, se ela tivesse dito sim? Provavelmente, a mesma coisa que estava fazendo agora... ido direto para os braços de outra mulher.
Poderia ser uma ligação de negócios, disse a si mesma. Algum  problema a resolver com uma mina de aço na Mongólia. Poderia ser sobre negócios, certo?
Sim, claro.
Mas ele pedira para ser sua esposa. Ela ainda não conseguia acreditar. O playboy do mundo ocidental a pedira em casamento. Será que alguém acreditaria? Ninguém.
Então, quem poderia acreditar que ela recusara?
Ela puxou a colcha até as orelhas para tentar afastar os pensamentos inquietantes. Os lençóis tinham cheiro de limpeza, com um leve aroma de sua colônia. Ela fechou os olhos, apertando o rosto contra o travesseiro. Ela bocejou, sentindo-se mais exausta do que se sentira em toda a vida.
Mas sabia que não podia dormir. Não, com ele entrando a qualquer momento, vindo se deitar com ela, na mesma cama. Ela bocejou. Tinha de estar pronta para lutar contra não apenas a sedução, mas também com o desejo traiçoeiro de seu próprio corpo.
— Olívia.
Ian a sacudia. Ela sentou no meio da cama, onde estava espalhada. A lareira era só cinza e o vento que soprava junto às janelas havia parado.
Ela percebeu que já era de manhã. A chuva havia parado, e quando ele abriu as cortinas, ela viu o céu cinza-rosado, acima do oceano Atlântico. Estava desorientada, de pijama e cabelos desgrenhados.
Ian,  por outro lado, estava impecavelmente vestido. E lindo. Barbeado. Ele agora estava de calça cinza, com um colete cinza bem talhado e camisa amarela. O corte elegante de suas roupas só enfatizava o corpo musculoso e rijo do guerreiro que havia por baixo.
Ficou pensando no que ele teria feito na noite anterior.
Ela não estava com ciúmes, dizia a si mesma, vorazmente. Nem perguntaria. Por ela, Ian podia sair com modelos todas as noites. Na verdade, Olívia  ficaria até contente, pois isso significava que não estava tentando seduzi-la.
— Bom dia, amorzinho. — Ian segurava uma bandeja de prata. Ela viu ovos, torradas, frutas e suco de laranja num copo de cristal. E uma rosa vermelha.
— Eu lhe trouxe café da manhã. Ela sentou na cama.
— Café da manhã? — perguntou, contente, quando sua barriga roncou.
Ian se inclinou sobre ela, colocando a bandeja em seu colo, e ela sentiu o cheiro do sabonete, sentiu seu calor masculino e, subitamente, precisou lutar contra a fome que sentia, ainda que apenas comendo torrada.
— Dormiu bem?
Ela rapidamente olhou para o alto, torcendo para que ele não a tivesse visto olhando suas costas.
— Sim, obrigada.
Ele retribuiu o sorriso, com franqueza.
— Como estou indo?
— Em quê?
— Em servi-la.
Ela olhou para a rosa na bandeja.
— Você, provavelmente, poderia arranjar um emprego no Dairy Burger, se o negócio do aço não der certo.
O sorriso dele se expandiu.
— Obrigado. — Ele abriu o guardanapo e o colocou sobre o colo dela. — Tenho um dia movimentado programado para nós.
— Você não vai trabalhar hoje?
— Não, vou lhe mostrar a minha cidade. Quero que você a ame tanto quanto eu.
— Por quê?
— Isso faz diferença? — Ele franziu uma sobrancelha. — Aceite minha oferta. A menos, é claro, que já esteja satisfeita com os guias sobre as cidades estrangeiras.
—  Bem... — Era tentador. Ela certamente sempre sonhara em viajar, quando menina. Mas...
Ela deu uma mordida na torrada, depois sacudiu a cabeça, resoluta.
— Você não vai me fazer mudar de idéia com um pequeno passeio, Ian.  Depois que os bebês nascerem, vou levá-los para casa.
— Casa pode significar muita coisa. Uma cidade, um prédio. — Pegando a rosa vermelha do vaso na bandeja, ele suavemente afagou o rosto dela, com as pétalas aveludadas. — Casa pode significar família.
A sensação da rosa sobre sua pele provocou um arrepio que se estendeu por todo o seu corpo, depois ela sentiu algo remexer abaixo de seu coração, até mais forte do que no dia anterior. E dessa vez ela soube que não era seus batimentos cardíacos.
Eram seus bebês.
Ela resfolegou, se endireitando na cama, empurrando a rosa e a bandeja sobre o cobertor. Ela colocou as mãos na barriga. Não sentia nada por fora, mas por dentro...
— O que foi? — Ian se inclinou acima dela, ansioso. — O que há de errado? Vou chamar a médica.
— Não. — Ela sentiu de novo. Uma mexida pequenina, mas aconteceu. — Senti um dos bebês se mexendo!
— Sentiu? — Sua expressão habitual de arrogância havia desaparecido. Ele parecia estranhamente inseguro.
— Sim. — Com uma risada encantadora ela pegou a mão dele e colocou sobre a barriga. — Bem aqui.
Ele esperou.
— Não sinto nada.
Ela moveu a mão dele acima do osso da bacia.
— Vai sentir. — Ela suspirou. — Embora possa levar alguns meses.
Ele a olhou.
—  Se você pode esperar, eu também posso — disse ele, baixinho.
O ar entre eles ficou eletrizado. Com a mão sobre a barriga dela, em pé, acima da cama, ele sentiu seu coração disparado. As pupilas dela se dilataram. Olívia  não conseguia respirar.
— Eu não serei sua amante, Ian — ela sussurrou. Ele deu um sorrisinho.
— Não quero que seja. Ele não a queria mais?
Ela deveria estar aliviada, mas, diante das palavras dele, uma dor fria atingiu seu coração. Ela subitamente soltou a mão dele e o bebê se mexeu, em protesto.
Não vou perguntar onde ele foi, ontem à noite. Não vou, disse, a si mesma. Tenho orgulho demais...
— Onde você foi, ontem à noite? — disparou ela, depois teve vontade de chutar a si mesma.
— Onde eu fui? — Ian entortou a cabeça, olhando para ela. — Somente minha esposa teria o direito de fazer esta pergunta.
— Qualquer esposa sua nem ia querer saber — disse ela, baixinho. — Ela provavelmente teria um ataque do coração.
— Olívia. — Ele se ajoelhou ao lado da cama. — Você não tem qualquer motivo para ficar enciumada. Cheguei em casa logo depois que você adormeceu.
— Chegou de onde? — A voz dela saiu num tom indignado e suas faces ficaram vermelhas, de constrangimento. — E não estou com ciúme!
Mas é claro que estava. Desesperadamente. Ela estava melancólica há meses, observando, de seu cubículo, quando ele deixava o escritório, sempre com belas mulheres a tiracolo.
E seria exatamente assim, se ela fosse sua esposa. Ele a levaria para a cama, pagaria suas contas, daria um nome aos seus filhos... mas nunca lhe daria sua lealdade, ou seu coração. E ela ficaria com a alma murcha, até morrer.
Será que ela sobreviveria, se ele a seduzisse?
Mas... será que sobreviveria, se ele não o fizesse?
— Deixe-me mostrar minha cidade, Olívia — disse ele, baixinho, pegando a mão dela. — Você não se arrependerá.
O desejo de ficar segurando aquela mão, de ficar com ele pelo tempo que pudesse, sufocava cada pedacinho do que lhe restava de bom senso. Pegando a rosa, ela saiu da cama.
— Tudo bem — disse ela, olhando para a rosa vermelha, ainda na mão. Ela tinha cheiro de ternura, de verão e felicidade. — Mas nós só iremos como amigos, certo? Só isso!
Ele entrou no closet e escolheu um vestido branco, de renda.
— Vista isso.
— É adorável. — Segurando o vestido nos braços, ela pegou suas coisas para ir tomar um banho. — Mas só amigos, Ian — alertou ela. — Não serei sua amante. Estou falando sério!
— Não, não será minha amante. — O sol refletiu nos olhos dele, ao sorrir. — Eu lhe dou minha palavra.

Baile de amor Onde histórias criam vida. Descubra agora