1. Chegamos

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E lá estávamos nós, naquele vôo meio apertado, uma fadiga aparentemente perpétua e as mãos suando de nervosismo. Eu sentia meu interior tremer toda vez que eu pensava que estávamos indo para a "Cidade Maravilhosa" em busca de um sonho.

Eu e Geovana iríamos até o Rio de Janeiro em virtude de uma vaga na Universidade Federal do Rio. Confesso que o caminho até ali não fora fácil, porque psicologia e nutrição estavam longe de serem conquistadas à toa, e apesar do nervosismo, a sensação de estar realizando um sonho era como açúcar para um café amargo, boa e reconfortante.

Enquanto eu estava a ponto de um colapso ansioso, Geo dormia tranquilamente ao meu lado na poltrona devido ao efeito de Petivite que ela tomara antes do avião decolar, e isso me impedia de descontar minha ansiedade em alguns bons diálogos.

Depois de um tempo eu começo a prestar atenção nas pessoas ao nosso redor, vendo um casal de idosos conversarem baixinho, em seguida duas crianças dormindo e depois um rapaz bonito escutando música enquanto balançava a cabeça, provavelmente, no ritmo da melodia. Quando penso que a situação de observar as pessoas já estava um tanto estranha, volto minha atenção para o livro em minhas mãos, começando a relê-lo e me perdendo em meio a leitura e acontecimentos da história.

[...]

Cutuco Geovana quando pousamos no solo, e vejo seus olhos castanhos atordoados me encararem.

— Nós já chegamos Geo, vamos. — murmuro com um sorriso nos lábios e já segurando minha bolsa entre os dedos.

— Eu dormi o vôo inteiro? — ela pergunta já se levantando e segurando a almofadinha que havia trazido, para então começar a caminhar pelo corredor comigo em seu encalço.

— Basicamente, sim, e me deixou falando sozinha e ansiosa. Obrigada. — dramatizo, escutando sua risada e sorrio também, me concentrando em descer do avião sem tropeçar e cair.

Logo estávamos em busca de nossas malas, e passados bons minutos, finalmente vejo uma mala rosa com flores e outra vermelha, respectivamente, minha e dela. Assim que terminamos todo o processo pra pegar nossas malas, caminhamos para fora do aeroporto.

O sol quente tipicamente carioca fez meus olhos doerem quando encaro a imensidão de carros que passavam na avenida que estávamos. Sinto quando Geo se aproxima mais de mim, e meu maior medo naquele momento era de sermos assaltadas, tendo em vista a diferença gritante entre uma cidadezinha do interior do Rio Grande do Norte e a grande capital carioca.

Com a bolsa apoiada no ombro e a mão esquerda segurando a mala, uso a mão vaga para pegar a mão de minha amiga e puxo ela de forma suave mas rápida até um dos táxis que estavam ali. Motoristas de aplicativo estavam fora de cogitação levando em consideração a quantidade de dinheiro que tínhamos.

Assim que entramos no veículo depois de arrumarmos as malas no porta malas, cumprimento o motorista. Um senhor de aparentemente uns 50 anos, negro e com um sotaque estranhamente familiar.

Após dizer a ele o endereço de onde iríamos, engatamos uma conversa animada e acabamos por descobrir que ele era de uma cidadezinha vizinha a nossa, e que morava ali há 5 anos, mas que nunca perdera contato com a família de lá.

Durante todo o caminho conversávamos e ele nos contava sobre sua experiência de morar no Rio e enquanto eu escutava as vozes dele e Geovana se entrelaçarem, eu continuava encantada com o ar carioca.

Era como se eu ainda estivesse na minha cidade, com os olhos fechados e sonhando com o dia que tudo aquilo estaria acontecendo e o detalhe principal era que agora estava acontecendo. Era real e com 0% de ilusão. Estávamos eu e minha melhor amiga numa cidade nova como sempre sonhávamos.

A conversa entre Paulo e Geovana acaba assim que chegamos em nosso destino, e com despedidas e troca de números, saímos do carro. Finalmente havíamos chegado na sede da UFRJ.

Com certa dificuldade nós caminhamos até a recepção pois ainda precisávamos confirmar nossa matrícula e estadia lá. Fomos atendidas por uma senhora bem gentil com um sotaque fofo, e nesse momento percebo a diferença fonética que tínhamos mas que não era um fato que impedia ela de ser legal e prestativa.

Assim que finalizamos todo o encaminhamento das coisas, saímos da sala e caminhamos em direção aos dormitórios, mas antes que pudéssemos completar a rota, escuto um barulho e alguns resmungos atrás de mim, e quando me viro, deparo com a cena da minha amiga com a camisa suja de café e um garoto pedindo trocentas desculpas, quase pensei que ele fosse chorar ali.

Ao contrário de mim, que ria baixinho pela situação, Geo parecia realmente brava, e esbravejando ela nos deixa ali, caminhando apressadamente para longe.

— Me desculpe mesmo, eu não queria derrubar café nela. — o carinha choraminga, e eu assinto em concordância.

— Tudo bem, é que somos novas aqui, então para o primeiro dia não foi tão legal assim. — explico.

— Entendi... A propósito, eu sou o Daniel, vou estudar medicina aqui. — ele estende a mão e eu aperto. Para um futuro médico, Daniel parecia gentil. — Vim aqui deixar alguns documentos, sabe como é.

— Eu sei bem, sou a Cristina, e minha amiga se chama Geovana... — anuncio e antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa eu escuto a voz de Geo gritar um "vamos Cristina" e arregalo os olhos. — Tenho que ir, mas foi um prazer te conhecer Daniel.

— Digo o mesmo. E fala pra sua amiga que eu sinto muito pela camiseta dela. — o garoto diz, coçando a nuca e soltando uma risada baixa. Concordo e com um aceno eu me afasto dele, correndo até minha amiga.

— Não queria ter que odiar café. — ela reclama e nós voltamos a caminhar para nossos dormitórios, conseguindo então cumprir nossa primeira meta.

Eu sabia que aquele lugar reservava muitas coisas para nós duas, e não sabia se sentia medo ou euforia diante daquele pensamento.

E De Repente, Era Amor - T3ddyOnde histórias criam vida. Descubra agora