Parte II

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O barulho das trombetas foi ouvido por todos os cidadãos que estavam presentes na praça da cidade, anunciando a chegada do rei. Ele apareceu cabisbaixo, não escondendo a dor que sentia.

A multidão se inclinou em reverência enquanto entrava o capitão do exército seguido de soldados vestidos de vermelho, empunhando suas espadas em posição ereta. Atrás deles uma mulher de cabelos castanhos e soltos se aproximava. Ela usava um vestido branco acinturado e reto, sem nenhum adorno. Os cabelos se ondulavam nas costas chegando à cintura, fazendo com que sua visão se assemelhasse à de um anjo.

A multidão ficou em silêncio. Aquela era sua adorada rainha que estava indo para a forca. Ninguém entendia o que estava acontecendo, mas alguns concordavam com a sentença, afirmando que o único dever da rainha era gerar um herdeiro à coroa e nada mais justo do que dar lugar para outra mais capaz de fazer isso. Apesar destes, a grande maioria da população amava Susana e os que lá estavam, foram para vê-la pela última vez.

Antes que qualquer coisa fosse dita, um soldado se aproximou do capitão e disse alguma coisa em seu ouvido. O capitão fez o mesmo com o rei e ele concordou com a cabeça.

- Foi capturado recentemente - declarou o capitão para a multidão - um assassino foragido e já sentenciado à morte anteriormente. Ele estava preso aguardando o cumprimento da sentença quando fugiu e o rei autorizou sua execução nesta data. Tragam o prisioneiro.

Um homem sujo e assustado, com os cabelos compridos, barba espessa e as mãos presas atrás das costas apareceu arrastado por um soldado. Enquanto ele era posicionado ao lado da estrutura da forca, o juiz ergueu a voz e pronunciou a sentença da rainha e do assassino acrescentando a seguir:

- Majestade, isto não é comum, mas antes de pronunciarmos a oração pela sua alma, a senhora gostaria de fazer um último pedido? Acredito ser uma concessão razoável considerando a sua posição.

A rainha levantou os olhos para ele e, após breve reflexão, disse:

- Se for possível, excelência, meu pedido é que minha morte não tenha plateia. Não sou uma criminosa qualquer. Meu crime foi uma imposição divina, pois não partiu de minha vontade, então gostaria de morrer como uma pessoa honrada.

O juiz olhou para o rei sem jeito, pois este pedido era incomum e difícil pela natureza da execução. Aguardou a resposta do rei. Ele se aproximou de sua mulher, olhou em seus olhos, envergonhado pela sua incompetência em livrá-la da morte e disse:

- Assim será feito. Removam a forca para o pátio cercado da prisão e que para lá se dirijam apenas a rainha, o carrasco e o réu condenado. Todos os demais devem partir imediatamente. Capitão, encarregue um de seus soldados para escoltar o prisioneiro e a rainha até o local e que ele saia imediatamente após certificar-se de que tudo está conforme ordenado.

Assim foi feito. Todos foram embora, inclusive o rei. Ele já havia se despedido de Suzana, com toda dificuldade.

Não sabia como teve coragem de dizer o que a aguardava e não conseguia se perdoar por não ter conseguido salvá-la. "Devia ter fugido com ela", pensou, mas se o fizesse para onde iria? As moedas todas tinham seu rosto estampado e nos outros reinos era tão conhecido quanto no seu, não havia como se esconder. Simplesmente essa possibilidade não tinha passado por sua cabeça antes. Ele apenas pensou em revogar a lei, fazer aquilo que um rei poderia fazer. Só agora, no fim, a fuga lhe ocorreu. Mas mesmo se tivesse pensado nisso antes ele não teria sido capaz de fazê-lo. Nasceu príncipe, não sabia pensar como alguém diferente.

Susana aguardava enquanto o soldado se retirava do pátio cercado por muros altos e fechava o portão. Só restava ela, o homem sujo e assustado e um homem mascarado e assustador que terminava de verificar as condições da estrutura de madeira que se erguia à sua frente. Ela não sabia como eles conseguiram transportá-la de um lugar para outro. Não era uma construção grande, como as de antigamente, porque não se faziam mais execuções públicas recentemente. Eles tiveram que construir esta às pressas e o rei determinou que fosse pequena e removível para que no dia seguinte ele não visse mais aquilo quando passasse pela praça.

A Lei e o destinoOnde histórias criam vida. Descubra agora