Capítulo 11

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       O Natal com a família McGowan era sempre uma festa incomum. Para começar, nenhum deles era religioso. Era engraçado imaginar que a Dona Rose e Seu Wallace eram um casal de ateus de quase 80 anos. Na verdade, eles sempre foram o contrário do que era esperado. Eram conhecidos como "os do contra" da cidade, pois estavam sempre se unido em favor das minorias e questionando tudo, principalmente o padre. E com a festa de Natal não seria diferente. O churrasco, geralmente, começava as 15h da tarde e ia até a ultima pessoa resolver que já era hora de dormir ou ir embora. Com rodas de samba, pagode e muita música, as festas iam longe pela madrugada. Podia até rolar uma quadrilha de festa junina no meio do natal, não havia regras. Já no ano novo, eles costumavam fazer um "retiro espiritual" e sempre iam para o sitio pregar o "silêncio" da passagem do ano, por nenhum motivo em especial a não ser o prazer de ir contra as regras. 

     Teve um ano, Gizelly devia ter seus 17 e anos, que eles inventaram de fazer uma festa de dia das bruxas no natal. Naquele ano, Marcia se ofendeu. Já achava um desrespeito com Jesus toda a farra dos anos anteriores, mas naquele ano os McGowan haviam passado de  todos dos limites! Quando pediram que os convidados se vestissem de monstros, Márcia brigou com os "anciões da família" , dizendo que eles não tinham o menor respeito com as tradições e que era uma verdadeira palhaçada.  Seu Wallace rebateu: 

    - Tradição? Mas que Tradição? Não vou questionar sobre a existência ou não de Jesus... Mas todo mundo sabe que os Católicos se apropriam dessa data, que nada mais era do que uma tradição pagã. Fizeram isso na para ressignificar o que eles não conseguiram destruir. Aí botaram Jesus no meio, como se fosse aniversário dele.... Você devia ser a primeira a questionar! Afinal, não existe a menor possibilidade de Jesus ser capricorniano.

   Ele disse a ultima parte na intenção de provocar Márcia, já que também não acreditava em signos e Márcia era uma entusiasta do assunto. Marcia saiu brava e nunca mais voltou para nenhum natal com a família, mas também nunca impediu que Gizelly continuasse participando.

    Naquele ano a festa não teria nenhum tema específico, era só chegar com comida e bebida e tudo estava certo. Eles também sempre faziam um amigo secreto, mas como tudo era diferente com os McGowan, os presentes eram embrulhados e deixados debaixo de uma bananeira que havia no terreno. E em algum ponto da noite, as pessoas pegavam um presente aleatorio e tinham que adivinhar para quem era e quem tinha comprado. Quem errasse, deixava 10 reais na caixinha de doação, que eles faziam para o hospital da cidade. 

    Quando Gizelly chegou, o churrasco já estava acontecendo a todo o vapor. Ela foi recebida com muitos beijos e abraços, apesar de não gostar da efusividade nos contatos físicos, aquela era uma boa excessão. Estava sentindo muita falta de todo mundo e de toda aquela alegria excêntrica dos McGowan. Seu Wallace e Dona Rose eram pais de três filhos. Antonio McGowan, pai de Marcela, Mariane e Enzo e Rick; Douglas McGowan, pai de Estevão e Paula e Romeu McGowan. 
    Romeu tinha um talento esquisito, mas na opinião de Gizelly, era a melhor parte dele. Ele era um homem grandão. Em um primeiro momento causava uma má impressão por sua fisionomia fechada, seus ombros largos de ossos grandes e o rosto de traços brutos. O apelido dele era Ursão, mas apesar de tudo, ele era extremamente amoroso. O talento dele era imitar (quando não com perfeição, algo muito próximo dela) qualquer voz. Uma voz fina, uma voz grossa. Voz tida como masculina ou feminina. Ursão divertia todos nas festas, quando começava a dar seus shows imitando artistas como Elvis, Renato Russo, Pitty, Zeca Pagodinho, Cazuza, sertanejos e etc... Tudo que ele precisava era estar familiarizado com a letra, tons e entonações e pronto, a festa estava feita. 

     Estavam, por enquanto, Estevão, Gizelly e Ursão sentados em uma das mesas, cantando e conversando. 
    - Gizelly fala para ele que ele está perdendo dinheiro! - Estevão dizia para o tio, logo após eles tocarem "Seu Astral", onde Romeu imitou Jorge com perfeição e Estevão acompanhou no violão.  - A Rafa com certeza ia amar te conhecer. 

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