Capítulo 11

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— Lothar! — minha mãe veio me abraçar quando o táxi parou em frente à casa dela. Ela era uma das poucas pessoas que me chamavam assim, e a única que o fazia sabendo que eu não gostava.

Ela tinha me dado esse nome numa espécie de afronta à esposa de meu pai, que não tinha filhos. Lothar era o nome do pai dele, alemão, e nem todos os descendentes gostaram da homenagem, afinal, eu era um bastardinho, fruto de uma traição, e segundo eles, o fato de eu ter nascido com deficiência era um sinal de que o Todo Poderoso não tinha gostado do que meus pais fizeram. Assim, ainda criança, eu me tornei o Loth. O "pobre" Loth. Depois de adulto, fiz as pazes com meus dramas, e desisti de mudar meu nome no cartório. Só mantive o costume de me apresentar como Loth às pessoas, deixando o Lothar para assuntos formais.

— Por que não avisou que vinha, Loth? — disse meu irmão. Eu tinha dois irmãos mais novos por parte de mãe. — Eu teria te buscado no aeroporto.

— Não era necessário. — Sorri e acenei educadamente. A mesma conversa de sempre. Se eu tivesse pedido, ele teria chegado atrasado e reclamando. — Eu decidi de última hora. — O que era mentira, e eles sabiam disso.

Parentes se aglomeraram na rua para me ver. Desde que eu tinha me mudado dali, muito antes de receber como herança a empresa de meu pai e ir para a capital do estado, muitos deles não me viam pessoalmente. Eu morava sozinho desde os vinte anos.

Cumprimentei a todos, respondi perguntas pertinentes e impertinentes, e finalmente consegui entrar na casa para descansar. Eu passaria a noite, que já estava chegando, e sairia no dia seguinte para cuidar de negócios. Depois, como eu não tinha levado adiante meu projeto de férias especiais, eu voltaria para passar o fim de semana em família.

Eu tinha no centro da cidade uma grande loja de material de construção, iluminação e acabamentos. Tão grande e vistosa que servia de ponto de referência para as outras lojas no entorno. Trabalhei nela sem parar por anos a fio, e só me ausentei quando a empresa de meu pai, esta no ramo imobiliário, foi passada para o meu nome.

Bons funcionários mantinham minha tranquilidade em relação ao atendimento a clientes e a honestidade com os recursos, mas a administração de longe era ruim e ineficiente. Não ia dar certo por muito tempo. Decidi que era o momento de passar a loja para frente. Antes que ela decaísse e perdesse valor de mercado. Claro, eu não tinha participado isso a ninguém. Iria resolver tudo o que tivesse pendente antes de levar à público meu interesse de vender.

Foram dias cansativos. Ao extremo. Passei as noites, fora a primeira, num hotel, onde continuava os trabalhos do dia. Pus eu prática todo o meu conhecimento de administração e contabilidade, e organizei vários papeis, além de inventariar tudo o que tinha na loja. No fim desse pequeno período, a loja estava pronta para ser vendida, sem nenhuma pendência ou surpresa.

Era a tarde de sexta-feira quando guardei o último relatório. Participei de uma confraternização rápida com funcionários, os quais ainda não sabiam do objetivo maior de minha visita, e voltei para o hotel. Lá, longe de olhos e ouvidos inconvenientes, fiz aquilo que por todos aqueles dias eu tive vontade de fazer: liguei para o Andy.

Confesso que relutei bastante antes de fazer isso. A informação de que ele não morava sozinho, assim, sem maiores complementos e explicações, não ajudava em nada. Muita coisa passava pela minha cabeça cansada e confusa.

Mas assim que tomei coragem e liguei, Andy atendeu, e sua voz rouca e risonha, como se tudo estivesse perfeitamente bem só esperando pela minha ligação, me livrou desses questionamentos em poucos segundos. Ele tinha o poder de melhorar os meus dias, mesmo que com apenas uma mensagem, e ainda mais com a sua voz.

Depois da Tempestade - DEGUSTAÇÃO Onde histórias criam vida. Descubra agora