Capítulo 3

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-Estão só fantasiando - replicou Brendan. - Todos os nova-iorquinos fazem isso. Minha mãe está sempre ameaçando de nos mudarmos para o campo, mas no fundo ela não está falando sério.
-Você tem razão. Meus pais também adoram esta cidade.
-Ei, Brendan, venha cá - gritou uma voz de dentro do apartamento. - Tem uns caras aqui na porta que dizem que conhecem você lá do campo de futebol.
-Ah, deve ser o Danny! -gritou Brendan de volta, se afastando de mim. - A gente continua mais tarde - sussurrou no meu ouvido, me arrastando para dentro da sala.
Logo Brendan estava cumprimentando ruidosamente os recém-chegados na porta da frente, e me vi engolida pela multidão que já lotava o apartamento.
-Não vi você chegar, Amber -comentou Mandy Blake.
Mandy fazia parte da turma de Suzanne e também tinha se tornado minha amiga.
-Isso porque o Brendan arrastou-a lá para fora no exato momento em que ela pôs os pés aqui - comentou Suzanne rindo.
-Para quê, admirar a vista? perguntou Alicia.
-Para o que você acha, imbecil? -retrucou Suzanne,girando os olhos em minha direção. -É,minha cara, acho que vocês já viraram fofoca nacional. Escutei. um garoto por ai falando de você como "a nova gatinha do Brendan".
Senti minhas bochechas esquentarem quando percebi que as outras garotas
começaram a me olhar com um interesse especial. Lauren, uma caloura bastante popular em Dover, estava olhando fixamente para o meu vestido.
-Você o comprou no Village, não foi?-
perguntou ela. - Eu o vi numa vitrine
English Street, mas não tinha dinheiro suficiente.
-Decidi que seria melhor andar pelada o resto do ano e comprar o vestido -
respondi sorridente e delicada. -Minha mãe ficaria louca se soubesse quanto paguei por ele.
-E para que servem os cartões de crédito? - brincou Suzanne.
-Fica muito bem em você - observou Lauren.
-Você pode usa-lo de vez em quando, se quiser - ofereci, me sentindo generosamente magnanima.
-Obrigada - disse ela, sorrindo.
Eu me senti maravilhosamente bem sendo o centro das atenções, recebendo olhares de admiração de todos os lados e conversando de verdade com algumas das alunas e dos alunos mais populares da Dover. Poucos minutos depois Brendan apareceu com um copo de cerveja para mim. Dei um gole, apesar de não ser chegada em bebidas. Além do mais, detesto o gosto da cerveja.
A sala estava ficando cada vez mais apinhada, e alguns garotos tinham acendido cigarros, enchendo o ar de fumaça azul. O nível de barulho aumentava junto com a fumaceira. Alguém tinha colocado um CD de rap, e alguns garotos estavam dançando no corredor. A música soava tão alta que produzia a sensação de ser parte de uma gigantesca batida de um único coração.
-E se alguém chamar a policia, Brendan? - perguntou Mandy.
-Não se preocupe. Acertei tudo com os vizinhos. Todo mundo neste andar vai ficar fora de casa durante a noite, e o velho que mora aqui embaixo não liga. E molhei a mão do zelador com vinte dólares. Está tudo em cima, tudo sob controle.
Ele me puxou para perto de si e me deu um rápido beijo na bochecha.
-Então você conseguiu se virar para vir aqui sem que os teus pais te amolassem, Amber? - perguntou Mandy.
-Dissemos a eles que ela ia dormir na minha casa - disse Suzanne.
-Na verdade foi fácil - expliquei.- Mal estavam prestando atenção quando
perguntei se podia vir. Eles têm tido um monte de preocupações ultimamente. Meu pai pegou um caso importante que está indo agora para os tribunais, e minha mãe tem que fazer uma apresentação para um novo cliente da empresa em que ela trabalha. E no meio disso tudo meu avô ainda ligou de Wyoming, dizendo que quebrou a perna e não tem como tomar conta do sitio. Agora meus pais estão tentando decidir o que fazer com ele...
- Você tem um avô num sitio, Amber? - interrompeu Thomas, um dos amigos de Brendan.- Por alguma razão me parece que isso não combina com você.
-E não combina mesmo - disse eu. - Nem com o meu pai. Ele não via a hora de cair fora de lá quando chegou a idade de ir para a faculdade.
-Sei lá...-comentou Alicia. -Acho que um sítio me soa tão romântico. Tofos aqueles cavalos... Você nunca vai lá?
- Não estivemos mais lá desde que eu era bem pequena - respondi. - Meu pai e meu avô não se dão muito bem. Meu avô não consegue entender as necessidades que meu pai sente da vida urbana. E não tenho grandes lembranças do lugar. Só me lembro de um menino que tentou me beijar no celeiro de meu avô. E me lembro também dele colocando um sapo nas minhas costas, por dentro da roupa,
quando estavamos passeando perto do rio, e de meu avô dizendo que eu era uma mimada e fricoteira por ter ficado nervosa durante uma tempestade com raios e trovões. Não foram as melhores férias da minha vida.
Alguém colocou um outro CD de rap, e todos nós começamos a dançar. Mas estava me sentindo um pouco culpada. Queria ser livre e dona do meu nariz como os meus amigos, mas não conseguia me desvencilhar daquela estúpida sensação de culpa.
Será que eu era a única que se sentia assim? Como Suzanne dissera, não tinha mentido para os meus pais. Apenas não havia revelado todos os fatos. Todo mundo fazia coisas desse tipo o tempo todo. Meus amigos achavam que não tinha nada demais. Por que então me sentia mal?
Segurei Brendan quando ele passou perto de mim.
-Dança comigo - pedi.
Quase ao mesmo tempo a música mudou para uma batida lenta. Brendan me agarrou apertado. Sentia o calor da bochecha dele encostada na minha, e seus bragos me enlaçavam com tanta força que respiravamos como se fossemos um só. Fechei os olhos, com um sentimento de perfeito e extremo contentamento. Era a noite mais maravilhosa da minha vida. E eu não queria que acabasse.
Não escutamos a campainha no começo.
-Dê uma olhada se são penetras, cara- pediu Brendan a Thomas, que estava em pé perto da porta bebericando uma cerveja. - Se for o velho de baixo reclamando, seja simpático com ele.
-Obrigado por me deixar cuidar disso, Brendan - disse Thomas sarcastico, ao
mesmo tempo abrindo a porta.
Brendan beijou minha testa e começamos a balançar nossos corpos no ritmo da música. Estávamos começando a nos embalar quando Thomas abriu caminho à empurrões no meio da multidão para chegar até nós.
-Ei, Amber! chamou preocupado. - É sua mãe e o seu pai. E não parecem estar muito felizes!

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