Capítulo 7

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- A gente poderia ir visitar você nas ferias, para esquiar- disse suzanne,
subitamente tão entusiasmada. - Eu iria adorar me deitar numa nascente de água quente rodeada por um monte de neve. Que romântico!
- Nos não estamos indo morar em Jackson Hole - esclareci com amargura. -Estamos indo morar no cafundó-do-judas, num lugar onde nunca ninguém sequer ouviu falar. Num sitio. A pior coisa que poderia acontecer a alguém.
Eles voltaram a ficar com pena de mim.
- Então simplesmente recuse-se a ir - disse Suzanne. - O que eles podem fazer? Levá-la à força em cima dos ombros?
- Meu pai disse que crianças com menos de dezoito anos têm de ir aonde seus pais forem, gostem ou não - expliquei.
- Não se você fizer o maior fuzuê - opinou Mady. - Quando não me deixam seguir o meu caminho, ameaço parar de comer. Meus pais têm tanto medo de que eu entre em anorexia que acabam cedendo.
- Só tenho mais umas duas semanas antes de partimos contei. - Não acredito que conseguiria ficar desnutrida a ponto de beirar a morte em tão pouco tempo.
-Simplesmente fuja de casa - disse Suzanne, como se fazer isso fosse a coisa mais simples do mundo. - Esconderiamos você, não é, gente?
- Você terá sempre o meu quarto a disposição, Amber - disse Brendan, me dando um sorriso doce e malicioso.
- Não, falando sério - continuou Suzanne. - Se não quer ir, não vá. Você já é quase adulta, e pode morar com algumas de nós. Esconderíamos você até eles irem embora.
- Não poderia fazer isso - disse eu, sacudindo a cabeça. - Eles ficariam doentes de preocupação por minha causa.
- Eles merecem, por não se preocuparem com a sua felicidade - disse Many. - Quero dizer, ir para o Wyoming é pior do que uma sentença de morte. Você vai morrer de tedio lá.
- Pense a respeito, Amber - disse Suzanne. - Nenhuma loja num milhão de quilômetros quadrados, nenhum café, e você vai ter de se conformar com dançar com uns caipiras calçados com aquelas enormes batas de cowboy - ela fez uma pausa e começou a rir. - E vai ter de aprender a dizer ya-hu e iuuii!
- Pode crer que não pretendo me aproximar o suficiente de nenhum garoto no Wyoming para que ele possa dançar comigo - repliquei -E que não vou aprender a dizer ya-hu. Na verdade, estou planejando me deitar em minha cama e ficar olhando para o teto até eles perceberemos quanto estou infeliz. Então vão ter de me mandar de volta para cá.
Brendan estava um bom tempo olhando para baixo, na direção de seu capuccino. Então levantou a vista para mim com um grande sorriso no rosto.
- Anime-se, Amber - disse ele. - Você não acredita mesmo que seus pais vão
aguentar ficar por lá mais do que uns dois meses, acredita? Eles também estão acostumados com Nova York, lembre-se. Podem achar lindo morar num sitio por algumas semanas, mas espere até nevar e se verem entalados num lugar a dez quilômetros da cidadezinha mais próxima e com um único canal de TV. Aposto que para o Natal vocês já estão de volta.
Olhei para ele com uma expressão esperançosa.
- Você acha mesmo?
- Estou contando com isso -  ele respondeu com um movimento afirmativo de cabeça. -Se não, quem vai me aquecer nesse inverno?
Aquilo foi a coisa mais doce que alguém já me disera, e me senti perigosamente perto das lágrimas de novo.
- Espero, espero mesmo que você esteja certo, Brendan - repliquei.
Gastei as últimas semanas em Nova York me fartando de fazer tudo que eu sempre havia desejado mais nunca fizera até então. Brendan fez tudo junto comigo, me acompanhando a todos os nossos programas favoritos e vendo todos os filmes possiveis.
- Assim pelo menos não vai morrer de fome cultural - ele brincou.
Que semanas maravilhosas! Brendan e eu começamos realmente a nos entrosar, a nos conhecer. Como eu iria conseguir deixá-lo?
Em minha última ida à Dover School passamos juntos um perfeito dia de outubro. A temperatura estava quente sem ser abafada, e as folhas começavam a ficar douradas nas árvores do Central Park. Passeamos pelo parque juntos, por entre as
charretes carregadas de turistas, puxadas por cavalos saltitantes. O Central Park nunca me parecera tão adoràvel. Nova York nunca me parecera um lugar tão perfeito para se morar. O Central Park ficava no fim do meu quarteirão, e eu quase nunca arranjava tempo para passear nele. Mas naquele dia saboreei cada àrvore, cada pedra, cada fonte, dizendo a mim mesma: "Você nunca mais vai ter tudo isso".

Coração divididoOnde histórias criam vida. Descubra agora