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[sextas-feiras ; o chão é confortável? ; vinte perguntas]

Sexta-feira, 21 Junho de 2013.

Verifico uma última vez o meu reflexo no espelho límpido, passando os meus lábios carnudos um pelo outro de forma a espalhar o batom neutro, deixando assim o compartimento enquanto ajeitava as minhas roupas simples e confortáveis, que decidira vestir em vez de passar mais um dia, a molengar sem ter o cuidado de se alguém decidir tocar à porta não aparecer com uma figura infantil devido ao padrão do antigo pijama.

Porém, talvez não fosse essa a única razão, optara não dar uma resposta concreta ao rapaz confiante que acabou por escrever os detalhes do sítio pretendido para a saída. Por um lado, não teria nada a perder ao aceitar a sua proposta tentadora, e bastante sugestiva, ele conseguiu notar na pouca vontade que adquiro quando estou entre o recente grupo. Queria contrariar-me ao insistir num mau lado desta situação insólita, contudo não conseguira encontrar um argumento válido. Aceitar ou não? Eis a grande questão.

– Riley! – ouço a voz da minha prima, no fundo do corredor enquanto ajeitava a sua mala de cabedal. – Vou trabalhar, ficas por casa?

– Em princípio, sim. – informo, pousando o meu casaco no bengaleiro.

– Está bem. – ela assente, com uma expressão serena. – Se precisares de algo, sabes o meu número.

Talvez.

– Espera! – peço, agarrando firmemente na porta, provocando um breve susto a Miriam. – Podes levar-me a Wellington?

  

Passeio pelas ruas movimentadas, à espera de um sinal de Ashton que marcara o local (para mim, totalmente desconhecido), perto um quiosque que não escapava na visão de ninguém por causa da sua cor verde aplausível. Mais difícil de que tomar uma decisão acertada sobre aceitar a sua sugestão, fora justificar a Miriam o que faria na capital, numa sexta-feira. Poderia explicar todos os pormenores da situação tentadora, todavia isso seria quebrar o plano. Segundo o loiro, fugir da realidade incluí ninguém para além de nós ter conhecimento sobre o assunto. Uma total loucura para a minha cabeça.

Um suspiro escapa entre os meus lábios devido à espera que me levou a supor que isto não passava de uma espécie de partida, ou um pretexto de risos. Impaciente, retiro os óculos escuros da minha mochila, enquanto aproveitava o quiosque para bisbilhotar as recentes notícias.

– Sextas-feiras. – coloco a mão no peito ao sentir a sua respiração a embater no meu pescoço, seguido com o seu sussurro. – Como eu gosto de sextas-feiras.

– Sempre com boas intervenções – dou um breve sorriso, encobrindo o susto que apanhei, as suas repentinas vindas são algo de que não conseguia acostumar.

– Eu sabia. – Ashton comenta, colocando as mãos nos bolsos das suas calças pretas.

– Sabias o quê? – arqueio uma sobrancelha, demonstrando um ar desorientado.

– Que tu irias aparecer.

– Pouco confiante? – gracejo, fazendo um expressão mais séria quebrando-a segundos depois de encarar a sua expressão neutra.

– Um ida ao Aro? – ele interroga, passando as mãos na barba miudinha.

– O que é isso? – contesto, levando a conversa para um tom de brincadeira.–Um clube de strip?

– Talvez. – Ashton reproduz a minha voz, tal como respondi à sua proposta duvidosa.

  

Abrando os meus curtos passos (comparados com os de Ashton), colocando as mãos sobre as minhas pernas dormentes, a caminhada até ao café que temia sobre a sua existência prolongou-se durante mais de quarenta minutos, e por causa da minha falta de exercício regular, percorrer grandes distâncias era somente em raras ocasiões e, para esquentar o cenário o tempo estava mais abafado do que nos dias anteriores.

– Pausa. – Paro Ashton, sentando-me no chão, visto que não havia qualquer tipo de assento por perto.

Perplexo com a minha atitude imprevisível, o loiro vê-se obrigado a fitar um olhar confuso enquanto colocava a mão na sua testa, em forma de criticar mentalmente a minha ação. Nem mesmo o seu olhar, ou o das pessoas que circulavam pelas estradas me incomodavam, precisava de repousar durante uns breves minutos.

– O chão é confortável? – ele pergunta, sem revelar nenhum comentário a criticar a minha figura perante o público alheio.

– Não é mau de todo. – profiro, prendendo os meus longos cabelos castanhos com um elástico vermelho que trazia sempre no pulso direito. – Companhia?

Sem comentários, Ashton senta-se no chão duro retirando de seguida um cigarro do seu bolso focando o seu olhar misterioso para a rua contrária. Havia algo na sua figura constituída e personalidade carismática que despertava o meu interesse. Toda a gente tem os seus segredos, e que tipo deles teria Ashton?

– Que tal um jogo das vinte perguntas? – ele quebra o silêncio, fazendo-me acordar dos meus pensamentos aleatórios.

– Não vinte, apenas três. – sugiro, verificando os olhares reprovadores de empresários dos escritórios enquanto se encaminhavam para os seus veículos.

– O teu nome é mesmo Riley? – ele apressa-se a iniciar o jogo com as nossas próprias alterações.

– Não acredito que acabei de sair com alguém que nem o meu nome sabe.

– Eu suspeitava. – o loiro defende-se, gesticulando com as mãos deixando o cigarro no canto da sua boca.

– Qual é o teu maior medo?

– Nenhum. – Ashton responde, raspando o seu cigarro no cimento. – Qual é a razão por teres vindo para Nova Zelândia?

– Foi uma promessa que fiz com Miriam quando éramos adolescentes. – explico, olhando firmemente para os seus olhos esverdeados. – De onde é que provém essa confiança toda?

– Charme natural. – ele ri com a sua afirmação, despenteando os seus caracóis loiros. – Porque é que aceitaste a proposta?

– Essa é a questão na qual ainda procuro uma resposta concreta.

– Um dia tenho a certeza que irás saber como responder a essa pergunta. – ele assegura, mostrando uma das suas feições nas bochechas.

– Esse café, Aro, existe? – realizo a última questão, receosa por saber a verdade.

– Não. – Ashton torna a gargalhar, desta vez ligeiramente mais animado. – Era uma desculpa para conversar um pouco mais contigo.


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