(IV). Aqueles que a amavam mais do que tudo

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"Ela dançava com os seus fantasmas

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"Ela dançava com os seus fantasmas. Os que ela perdeu e os que encontrou e aqueles que a amavam mais do que tudo"  — Florence In The Machine.

Diário de Jennie Kim (Fevereiro de 1984)

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Bae Joohyun é a pessoa mais próxima que eu tenho.

Eu a chamo de Irene, como Irene Adler, a mulher que Sherlock Holmes gostava. Ele dizia que ela "combina o rosto da mais encantadora das mulheres, com o espírito do mais determinado dos homens", que é uma frase machista para um grande caralho, mas explica bem o caráter durão de Irene, mascarado por um rostinho bonito.

Ela é inexpressiva a maior parte do tempo, menos quando está comigo. Eu gosto quando ela sorri, quando me dá esporro e quando me prende, porque Bae Joohyun é uma policial. Mas nem sempre foi uma, claro, éramos amigas na escola, roubei um beijo dela na quarta série e ficamos mais algumas vezes depois disso. A noite das garotas era especial porque sempre acabava comigo e minhas mãos curiosas debaixo dos cobertores dela.

Depois que ela se formou no ensino médio ficamos um tempo afastadas, porque Irene foi fazer faculdade e eu fui vender drogas, anos depois ela se casou com um cara, Junmyeon. Eles moram perto de mim, a duas quadras. Ele sai para caminhar e sempre acena quando me vê pela janela.

Posso parecer rancorosa ou frustrada agora, mas não tenho inveja da vida dela, nem fico pensando no que poderíamos ter sido. Irene é uma detetive brilhante com um futuro promissor e suas companhias — vulgo eu — não são nada boas. É só isso que penso sobre nós duas.

Mas também imagino que a nossa vida daria uma série de comédia estrelada por duas loiras estadunidenses, jogando piadas idiotas, de como era engraçado uma traficante e uma detetive serem melhores amigas. Mas na vida real, não há nada de engraçado nisso. Ela não gostou de ver o que estava no balcão da minha cozinha e me pediu novamente para "parar com isso". Nós discutimos feio e eu gritei coisas horríveis sobre ela, seu marido bonito e seu futuro bebê, porque, sim, Irene e Junmyeon estão tentando ter um bebê e ela me quer como madrinha (insira aqui uma risada).

É fácil para Irene falar "largue isso" quando está olhando do seu lugar confortável, com um bom emprego e uma carreira a seguir. Se eu largar isso não terei nada e, provavelmente, com a ficha criminal mais longa que minha perna, nunca irei arrumar um emprego decente.

As coisas escalonaram bem rápido quando brigamos, ela agarrou meu maxilar, daquele jeito durão, como se fosse pegar a minha cara e esfregar na bancada cheia de anfetamina, mas apenas gritou:

— Ruby, ou você pára com isso ou da próxima vez que eu aparecer aqui, vai ser para te prender e apreender toda essa merda!

— Então você vai ter que me prender, porque eu não vou parar! Diferente de você, eu não dou a mínima se vou morrer amanhã, hoje ou daqui a dois dias, porque eu não tenho um marido solícito ou um bebê, e não fui eu a hipócrita do caralho que prometeu que nunca iria se casar e virar uma versão da sua mãe submissa, parideira e chifruda para, no fim, encontrar um garoto idiota e descumprir a promessa!

— Nós tínhamos 14 anos, Jennie! As pessoas mudam, porra!

— Menos você! Você não tinha esse direito! — Apontei o dedo no peito dela, furiosa. — Você era a Irene que fumava maconha comigo escondida dos pais, que pulava a janela para sair à noite, que ficou ao meu lado quando elas foram embora! Agora você se tornou tudo que a gente mais odiava!

Gritei tão alto que minha garganta doeu, era horrível segurar o choro quando se estava furiosa, fazia subir uma queimação na garganta que parecia que nunca mais ia passar. Irene ouviu tudo calada e ficamos nós duas na cozinha, sem dizer nada. A noite chegou e trouxe aquela semi escuridão pelo cômodo.

Eu quase senti falta de vê-la na penumbra, quando os tempos eram mais fáceis, quando tínhamos Jisoo e Rosé.

— Eu desisto de você, Jennie — ela simplesmente disse. — Deve estar satisfeita, conseguiu afastar todo mundo que tinha um pingo de preocupação por você, agindo como uma pirralha de 15 anos idiota e afetada. E quando isso der merda, porque vai dar merda, não conte comigo.

Ela foi embora e voltou meia hora depois, fardada e com a viatura, e me prendeu.

Descobri da pior maneira possível, que Bae Joohyun e eu não podíamos continuar sendo amigas, acho que nós duas sempre soubemos disso, até antes dela entrar para a polícia. Irene nunca vai aceitar o que me tornei, e eu também nunca aceitarei suas imposições, e mesmo que ela tenha ferrado com todo o meu plano três dias antes de começar o Divine, nós continuaremos com essa relação de amizade estranha, nos apegando ao que éramos antes.

Acabo de chegar em casa, o festival é amanhã e Jungkook e Taehyung estão lá em baixo, refazendo tudo que ela apreendeu. Fora isso, não quero parecer doida escrevendo o que vou escrever agora, fico tranquila em saber que ninguém irá ler e posso ser maluca o suficiente para mim mesmo, mas sinto que algo vai acontecer. Posso sentir o cheiro quando as coisas vão mal, como o cheiro de comida estragada na geladeira — você sabe que tem algo podre ali, mas não sabe exatamente o que está.

Minha avó não acreditaria nesses tormentos, me aconselharia a rezar três ave marias antes de dormir, Jisoo procuraria uma explicação científica e Rosé só acenderia um cigarro, mas Irene, bem, Irene ficaria atenta se eu contasse.

Temo que sua lealdade a nós seja meu único triunfo. Ela me conhece mais do que eu mesma me conheço e lutaria por mim até o fim.

É pelo menos o que eu espero que ela faça quando chegar a hora.

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Aê pessoas, vim avisar rapidinho que tem att dupla hoje e que mudei a data de postagem, antes segunda-feira e quinta-feira, para apenas segunda. Beijinhos.

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