Capítulo 09 - Grávida

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Querido bebê,

Eu estava descontando minha frustração nas louças quando meu celular apitou. Eu havia brigado com Matt no dia anterior e vomitei as tripas depois disso. Ele continuava reclamando da minha ausência e eu tentei explicar, mais uma vez, que estava tentando equilibrar tudo. Esfreguei uma mancha permanente do último prato e enxaguei antes de ler a mensagem.

Eii, Bianca. Tudo bem? Você está sumida. Aconteceu alguma coisa? Estou aqui se precisar conversar :)

Quis ignorar a mensagem, mas não consegui. Eu sentia falta de conversar com uma amiga. Sentia falta de interagir com mais pessoas e precisava desabafar. Eu não podia contar para Matt sobre os meus problemas com Matt. E nem queria contar detalhes do meu relacionamento para Júnior.

Oii, Lara. Estou bem e você? Na verdade, eu gostaria de conversar mesmo. Será que podemos marcar no sábado?

A resposta chegou rapidamente.

Claro! Na minha casa? Pode ser às 19hs?

Combinado.

Querido bebê,

Matt me deixou na porta da casa de Lara.

- Você precisa mesmo ir? – Ele fez um biquinho fofo e colocou uma mão na minha bochecha. – A gente podia ir em algum lugar legal ou assistir a um filme.

- Desculpa, Matt. – Pedi. – Mas podemos fazer alguma coisa amanhã, ok?

- Ok. – Ele bufou, resignado, e tirou a mão que estava sobre mim. Vi a raiva aparecer e sumir num piscar de olhos. – É só que... tudo é melhor com você. Eu amo você.

- Eu também te amo.

Ele se aproximou e me deu um beijo casto.

Saí do carro e bati na porta escura. Lara estava exatamente como eu me lembrava, os cabelos azuis encaracolados destacavam os olhos pretos e grandes. Ela deu um sorriso largo quando me viu, os caninos tortos deixando sua beleza ainda mais excêntrica, e me convidou para entrar. Seguimos para uma sala toda branca e com um sofá cinza que lembrava a minha casa. Aquela dor incômoda apertou meu peito, mas reprimi a sensação. Começamos a conversar sobre coisas aleatórias e fiquei mais confortável após alguns minutos. A ideia de que eu, estudante de psicologia, queria desabafar me incomodava, por algum motivo de orgulho idiota.

- Então – ela suspirou -, você quer conversar sobre algum assunto específico?

Apertei minhas unhas sobre as palmas e abri, ciente de que meu nervosismo era claro. Mordi o lábio inferior e contive qualquer lágrima que poderia tentar aparecer, inspirando profundamente.

- Sim. – Falei finalmente. – Quero falar sobre muitas coisas. Sobre... minha vida.

Ela fez que sim com a cabeça, encorajando-me a continuar.

- Eu estou morando com meu namorado. Eu saí da casa dos meus pais, entrei na faculdade, arranjei um emprego e comecei um relacionamento sério. Sinto que... estou perdendo o controle. Não estou conseguindo me ajustar a tudo e sinto que estou – pausei, procurando a palavra certa – afogando. É como se eu tivesse que nadar constantemente, o tempo todo, para não me afogar. E estou... exausta. Estou cansada de nadar contra tudo.

Usar analogias era mais fácil do que tentar explicar de forma direta.

- E contra o que você está nadando? – Lara perguntou, os olhos atentos sobre mim.

- Não sei bem – Prossegui. – Acho que estou lutando constantemente para sufocar a dor que sinto de estar longe da minha família. Eu sei que fui precipitada, mas eles me magoaram e não consegui perdoá-los facilmente. Eu só queria que eles entendessem. Queria que eles vissem o quanto foram ausentes para mim, que percebessem que eu me sentia sozinha e que me apoiassem mais. Queria que tivessem aprovado meu relacionamento com Matt... ou pelo menos tentado conhecê-lo. Na viagem que fiz com o colégio, fui... assediada. Fiquei muito mal, porém eles sequer notaram. E sabe o que é pior? Eu acho que já os perdoei, só queria que eles me pedissem desculpas, me procurassem. Eles me ligaram bastante no início, mas depois pararam. E, sei que é idiota, mas fiquei frustrada. Eles desistiram tão rápido assim de mim? – Meus olhos se encheram de lágrimas, mas pisquei para espantá-las. – Não estou falando que eles são ruins. Eu sei que eles me amam. Mas... não tenho sentido isso ultimamente. Não sinto. Eu também sinto falta de Olívia e até das minhas outras amigas. Sinto falta de sair com ela, de falar sobre coisas bobas, de ter alguém com quem posso sempre contar. Com ela, eu era sempre eu mesma, sabe? Eu não tinha medo de decepcioná-la ou algo assim, porque sabia que ela continuaria estando lá para mim apesar de qualquer coisa. Sinto falta dos meus irmãos.

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