Capítulo 8: Na Nova Terra

85 13 28
                                    

I do what they say I can't.
(Eu faço o que eles dizem que eu não consigo)
I Like It - Cardi B

Senti uma leve brisa desvendar cada detalhe do meu corpo, ouvia o som de pequenas ondas quebrando embaixo de mim que chegavam até meus pés com uma água quente.

Fazia sol, bastante sol na verdade, de um jeito que nunca havia feito no Reino da França, mesmo nos dias de verão. Eu estava deitada sobre uma superfície quente, fofa e arenosa, abri meus olhos devagar, como se despertando de um sonho, e encontrei Aaron, ainda adormecido, na minha frente.

Desamarrei a corda que nos unia, minha pele do pulso estava em carne viva e ardia, me levantei me desequilibrando e quase caindo em cima de Aaron, minhas pernas estavam moles, como se eu estivesse aprendendo a andar agora...

Oliver, Pierre, Alec e Marlon também estavam adormecidos, verifiquei o pulso de cada um para ter certeza de que estavam vivos, e felizmente todos tinham sobrevivido, apesar da pele (principalmente da boca) vermelha e rachada.

Olhei ao meu redor, não havia nada além de imensas árvores que formavam uma densa floresta, mas algo naquela floresta a deixava muito atraente para mim, caminhei até ela como que enfeitiçada, meus olhos brilhavam e eu não estava preocupada com animais silvestres, ou qualquer perigo que pudesse enfrentar, apenas queria conhecê-la...

Adentrei aquela mata com o coração aos pulos. Os galhos arranhavam minhas pernas nuas e alguma coisa no solo espetava meus pés descalços.

Mas eu continuava seguindo em frente, as plantas tinham um tom de verde quase cintilante no sol, e eram tão altas que mesmo que eu olhasse para o alto não via o fim delas! Também tinham flores de cores vibrantes e chamativas, uma mais linda do que a outra! Nunca tinha visto nada parecido antes!

Um som seco de tiro seguido pelo grito de milhares de pássaros assustados me acordou de meus devaneios.

Corri de volta à praia, de onde o ruído tinha vindo e soltei um grito de espanto ao ver selvagens completamente nus disparando flechas em direção à praia.

Eu já tinha ouvido falar sobre os selvagens, como todos, mas nunca achei que eu veria um deles pessoalmente!

- Brigitte! Saia logo daí! - gritou Oliver atirando novamente.

Corri para trás dele segurando sua arma com força. Todos também estavam com as armas posicionadas e apontando para os selvagens.

- O que vocês estão fazendo? Parem!

Os selvagens aproveitaram a distração que eu havia proporcionado e fugiram mata adentro.

Oliver me empurrou com violência.

- Quem te deu o direito de interferir?

- São só selvagens, Oliver! É a terra deles!

- É a minha terra! Esse sempre foi o plano, Brigitte! Achar uma terra nova, pegar suas riquezas e voltar para o Reino da França! Nós achamos!

- Nós não achamos nada! Nós naufragamos! E por acaso conseguimos sobreviver e o mar nos trouxe até aqui! Nós não achamos nada!

- Se o mar nos trouxe até aqui é porque é a vontade de Deus que eu desbrave essa nova terra e depois volte ao Reino da França com suas riquezas!

Eu estava tão enfurecida que era capaz de esmurrá-lo!

- Boa sorte em levar não sei que riquezas você espera encontrar aqui para o Reino da França em um toco podre de madeira! - gritei apontando para o mastro que foi a única coisa que restara do nosso navio.

- Isso é culpa sua! Mulher a bordo é sinônimo de má sorte! Deveria tê-la jogado ao mar na primeira calmaria que tivemos!

Ele estava vermelho de raiva e eu suspeitava estar do mesmo jeito.

- Você está insinuando que o naufrágio foi minha culpa?

- Você é mulher!

- E você é um idiota!

Ele deu um tapa na minha cara tão forte que me derrubou no chão.

- Eu sou seu capitão! Você deve respeito a mim!

Me levantei o encarando com ódio e fui em direção à floresta.

Aaron tentou me seguir mas Oliver o impediu.

- Deixe-a ir!

- Mas, capitão... E se os selvagens...

- Deixe! - ele gritou.

Não andei muito até escutar algumas vozes.

- Che ñemopore'y a! Che año nemboare pee! (Me deixem aqui! Eu só estou atrasando vocês!)

Quem falava era um rapaz alto e musculoso de cabelos compridos e olhos negros que estava com um ferimento causado por arma em seu ombro, ele estava sentando encostado em um tronco de árvore e rodeado por mais três rapazes.

Pisei em um galho seco sem querer atraindo a atenção para mim e os três rapidamente miraram suas flechas na minha direção.

Levantei meus braços em um gesto de rendição mas eles só puxaram mais a corda do arco.

- Eu não sou como eles! Eu... Eu posso ajudá-lo... - eu disse apontando para o rapaz machucado, provocando ainda mais a ira deles, que já estavam prontos para atirar quando o rapaz disse:
- Guejy guyrapa! Néipy hecha va guta. (Abaixem os arcos! Vamos ver o que ela quer.)

Eles abaixaram os arcos mas pareciam relutantes como se estivessem com medo de mim e prontos para atacar a qualquer movimento brusco.

Me aproximei com cuidado e toquei o peito musculoso daquele rapaz aproximando minha mão devagar de seu ferimento, ele respondeu com uma expressão de dor.

- Ãn... Vocês têm alguma coisa para limpar? Como álcool? Pode ser rum...

Eu tinha lido em um livro medicinal que se não limpasse os ferimentos antes, a pessoa poderia morrer de infecção...

Eles olharam para mim sem entender. Óbvio! O que eu esperava? Não falávamos a mesma língua!

- Ãn... Ál-cool! - eu disse fazendo um gesto com a mão indicando bebida, mas eles continuaram com a mesma expressão confusa - Ah! Deixa!

Espero que não infeccione!

- Isso vai doer, ok? Pede para eles não atirarem em mim? - disse esperando que ele me entendesse pelo olhar e felizmente acho que isso aconteceu.

- Aníkena api! (Não atirem!) - ele disse para os rapazes e fez um sinal com a cabeça para que eu continuasse.

Mordi os lábios não tão confiante de que eu sairia impune daquilo.

Enfiei minha mão em seu ferimento e ele soltou um grito de dor.

- Desculpe! - eu disse sem perceber que uma lágrima escorria do meu rosto.

Achei a cápsula e a arranquei de seu ombro jogando-a no chão mas ele a pegou. Rasguei um pedaço da minha blusa e amarrei em seu machucado.

Ele se levantou se apoiando em seus amigos e disse:
- Grásia! (Obrigado!)

E foi embora...

O olhei partir, meu coração estava acelerado, mas não por medo, estava acelerada de uma forma boa, como nunca estivera antes.

Me senti repentinamente envergonhada por estar tão desarrumada e ajeitei meu cabelo na esperança boba de que ele se virasse.

E, para minha surpresa, ele se virou e me deu um sorriso tão lindo que me fez derreter por dentro!

Coração NaufragadoOnde histórias criam vida. Descubra agora