O CLÃ - Série Crônicas do Reino Escondido - Vol. 1

Capítulo 7 - Desafio

Pedi um tempo a Bernard, não consigo pensar em nada no momento que não seja a luta. Estou muito nervosa, pois meu tempo de preparação já acabou basicamente e em poucos dias enfrentarei minha inimiga.

Após o almoço, chamo Fran para desabafar e lhe conto tudo que vem acontecendo nos últimos tempos e ela me ouve atentamente. Espero que esse pesadelo termine logo, afinal nada está acontecendo do jeito que eu imaginava.

– Até quando você vai ficar enrolando o coitado? - Ela pergunta rindo.

– Não fale dessa maneira, só preciso que a luta passe e... - Ouço um estalar de galhos atrás da árvore e resolvo dar uma olhada, mas não encontro nada. 

- Deve ter sido um gato ou algo assim, mas como eu dizia... Quero esperar até depois da luta, para que caso eu vença, não venham dizer que foi porque eu estava junto com o príncipe. Mas acho que estou começando a gostar dele.

– Eu sempre soube que você iria se apaixonar. Mas, e aí, você está preparada para a grande batalha? - Fran pergunta curiosa e respondo que estou morrendo de medo de apanhar, porque embora eu não goste de Anastácia tenho que reconhecer que é uma exímia lutadora.

É uma pena não poder cancelar essa ideia absurda de Olliver, que em um momento de desespero acabei concordando. Agora a luta virou um evento, praticamente, os nossos instrutores estão a vendo como uma forma de mostrar se a didática tem dado certo.

Os próximos dias passam voando e quando menos espero, o grande dia chega. Opto por trançar meus cabelos para trás e vestir o uniforme preto, passo um pouco de rímel e batom, para ficar bonita e ostentar um rosto de vencedora, mas receio que isso não aconteça.

Quando chego a arena está lotada. Todos os alunos e Oficiais estão lá, até mesmo o diretor Ruff e a agora capitã Melo. Várias pessoas fazem apostas sobre quem será a vencedora, penso em ver quem eles acham que tem mais chances, quando vejo Anastácia entrar na arena ostentando duas tranças boxeadoras, um batom vermelho brilhante e seu uniforme vinho. Quando me vê, ela abre um sorriso de orelha a orelha, depois vem em minha direção.

– Preparada para perder, Laferrew?

– Para você? Nunca queridinha. – Tento demonstrar confiança.

Ela solta uma gargalhada, um tanto que assustadora e depois acrescenta:

– Você tem bom humor, senhorita, gosto disso. Mas cadê seu príncipe? Ele decidiu não ver você levar uma surra histórica? - Ela sorri mais uma vez e me deixa sozinha.

Só agora me dou conta de que faz um tempo que não vejo Bernard, eu estava tão ansiosa por conta da luta que nem percebi sua ausência. Francesca vê a preocupação em meu rosto e vem me perguntar o que está acontecendo, peço a ela para procurar Moussaieff, pois não o vi e estou preocupada.

– Coisa de apaixonada, isso, né? Vai ter uma luta épica e está preocupada com ele? Se eu fosse você ficaria preocupada contigo. - Ela brinca e vai a procura dele.

Meu irmão se dispôs a ser meu preparador na batalha que vai consistir em três tempos em que o principal objetivo é imobilizar o adversário ou que ele saia da área de luta.
Meu irmão relaxa meus ombros e pede para que eu permaneça focada. Entro na área destinada para a nossa luta e me preparo para enfrentar minha adorável inimiga.
Anastácia e eu nos cumprimentamos e a luta começa.

Antes de pensar em qualquer coisa, recebo um chute na barriga que me faz contorcer de dor. Anastácia vem em minha direção desferido diversos socos, tento me esquivar, porém ela me dá uma rasteira que faz com que eu caia de costas no chão. Tento desesperadamente trazer o ar aos meus pulmões, enquanto ignoro a dor latente que se apodera de mim, ouço o Oficial Yves dar a vitória do primeiro tempo à minha inimiga.

Sou erguida por Matt que confere meus ferimentos. Do outro lado ouço Anastácia falar para que eu desista, pois só sei dançar e meu sangue ferve.

O segundo tempo começa e dessa vez, eu quem parto para cima desferido socos em seu rosto, porém ela é rápida em se esquivar e me imobilizar, tento me desvencilhar, mas é inútil e ela gargalha me soltando. Não consigo admitir que ela me ridicularize na frente de todos os Oficiais. Penso na sua última fala, acerca de eu somente saber dançar e resolvo usar isso ao meu favor.

Aproveito sua distração e dou um salto tesoura a acertando em cheio, fazendo com que caia no chão. Ela tenta se levantar, mas a imobilizo no chão e só solto quando o Oficial diz que o ponto é meu.

O terceiro tempo inicia e sou muito mais rápida que ela e os gritos de torcida começam a se divergir. Anastácia fica possessa, porém sua raiva não a beneficia e com mais um passo de dança, eu a derrubo, infelizmente, ela consegue se levantar. Para minha surpresa, ela escorrega me fazendo então ganhar a batalha.

Sou erguida sob os ombros do meu irmão e ouço a multidão gritar meu nome, fico maravilhada, até o momento que encontro o rosto de Fran na multidão, sua expressão demonstra que não tem boas notícias, desço e vou em sua direção.

– Clari, ele saiu dos oficiais. - Ela fala mexendo as mãos.

– Como assim? - Fico sem entender.

O major Ruff observa a nossa conversa e se aproxima, ele me cumprimenta e me parabeniza. O pergunto sobre o príncipe e ele diz que há dois dias recebeu seu pedido para se desligar dos Oficiais. Fico sem entender, mas ele explica que o príncipe parecia muito triste e de coração partido, contudo isso não importava mais, pois ele iria ficar noivo. Tento assimilar toda a informação que acabo de receber e percebo que o príncipe está se sacrificando por minha causa, talvez eu tenha partido seu coração sem querer.
Peço ao major Ruff para me levar até ele, mas o diretor diz que eu não posso chegar ao Palácio daquela maneira e que pedirá para que o príncipe venha até o centro de treinamento, no dia seguinte.

Assim que a minha conversa acaba Garritwi chega empolgado com a minha vitória, mas Fran não deixa que ele fale comigo. Posso ver de longe a Oficial Melo me olhando com orgulho e depois vem em minha direção me parabenizar.

– Parabéns soldado. Você conseguiu êxito em mais uma etapa, se continuar nesse ritmo em breve estará pronta para fazer o céu brilhar. Acredito que sua missão será concluída antes do que esperamos.

Ela me cumprimenta e vai embora, me deixando sem entender as suas palavras. Como assim, fazer o céu brilhar? E de que missão ela está falando? Não consigo ver sentido no que ela disse, porém tenho outras coisas para me preocupar agora.